Há duas décadas, a Rua da Quitanda, em Diamantina, no Vale do Jequitinhonha, é inundada por uma música que vem das alturas. A sinfonia é da Vesperata, manifestação tradicional da cidade histórica em que músicos ficam postados nas varandas e janelas dos casarões. Nesta segunda-feira (9/9), pela primeira vez em BH, as sacadas do Palácio da Liberdade foram palco para o concerto a céu aberto que abrange diversos estilos musicais.
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Em Diamantina, o concerto ocorre aos sábados. A orquestra toca nas sacadas e é regida pelo maestro, que fica na rua. O público assiste em mesas e cadeiras dispostas pelo local, embalados por um repertório que mescla clássicos nacionais e internacionais e peças populares.
Na noite de hoje (9/9), a banda conseguiu trazer para a capital a atmosfera mágica das ruas de pedras. Logo no portão, um corredor encaminhava o público para os assentos espalhados por toda a entrada do Palácio. No meio da plateia, um pequeno altar com tapete vermelho estava preparado para o regente. Os músicos foram distribuídos próximos às pessoas, uma porção à direita, outra à esquerda, tocando em sua maioria instrumentos de sopro, como flauta, trombone, clarinete e saxofone. Já no topo, bombardinos, trompas e pratos surgiam das sacadas do Palácio.
Por causa do grande público, a Avenida Cristóvão Colombo, em frente ao Palácio da Liberdade, na Região Centro-Sul de BH, teve que ser interditada.
O evento, aberto ao público e com entrada gratuita, marcou o primeiro dia de atividade da Semana do Ministério Público 2024, ação promovida para celebrar os 40 anos da Constituição Federal e os 122 anos do diamantinense Juscelino Kubitschek. Entre os dias 9 e 13 de setembro, o projeto vai trazer inaugurações, premiações, atrações culturais como uma exposição interativa e um seminário com importantes nomes do Judiciário nacional.
Em entrevista ao Estado de Minas, o secretário da Cultura e do Patrimônio de Diamantina, Alberis Mafra, disse que a participação da Vesperata na Semana do MP é uma oportunidade para a orquestra expandir seu público e promover a cultura de Diamantina. “Diamantina está em busca do reconhecimento como uma cidade criativa da música, um título internacional que tentaremos conquistar no próximo ano, e fazer com que mais pessoas percebam essa característica nesse momento é de suma importância”, afirmou.
Efeito da Vesperata no público
Ao som de clássicos como "Não deixe o samba morrer", de Alcione; "Sou filho único" de Gilson Silveira; e "Garota de Ipanema, de Antônio Carlos Jobim, o público, majoritariamente com mais de 60 anos, entoava em um coral que se estendia desde o gramado do palácio aos bancos da praça. As cadeiras foram todas ocupadas, bem como as laterais do casarão e as calçadas de todo o quarteirão.
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Maria Inês Costa conta que já presenciou a Vesperata na cidade de origem e não perdeu tempo ao saber que ela viria à capital mineira. "Lá é tudo maravilhoso, quando eu vi que iria acontecer aqui, quis reviver os momentos que passei lá, porque foi muito bonito e emocionante", afirma.
Já Joana Longuinhos relembra quando a apresentação era um culto religioso, e agora conta com as bandas de Diamantina. "É muito prazeroso podermos assistir aqui em Belo Horizonte um evento tão lindo e emocionante. Me sinto muito feliz em participar", ressalta ela, que também já conferiu a Vesperata em Diamantina.
Organização
Por outro lado, algumas pessoas se queixaram da falta de organização no evento. Silvana Sena relata que, por causa do grande número de pessoas, não foi possível que todos entrassem, o que gerou uma confusão generalizada na abertura dos portões, enquanto policiais militares tentavam administrar a entrada.
"Muitas pessoas vieram e não conseguiram entrar. A proposta é linda, mas não adianta fazer um evento gratuito sem organização", diz. Para ela, o ideal seria a retirada de ingressos e lugares reservados para cada pessoa.
Patrícia Diniz também compartilha do ponto de vista de Silvana. Ela conta que chegou pontualmente às 20h, horário previsto para iniciar a apresentação, e até as 21h não havia conseguido entrar. "Essa falta de organização é prejudicial, principalmente para os idosos, que são a maioria. Muitos deles tiveram que ficar em pé", destaca.
Patrimônio Cultural de Minas
A Vesperata nasceu da iniciativa do maestro Pururuca, a partir de uma tradição religiosa, entre os séculos 18 e 19, quando, no período das vésperas – ritual católico de oração celebrado à tarde – músicos tocavam instrumentos nas sacadas e janelas nas casas históricas.
Ao EM, Alberis contou que, nesse período do dia, “a população da cidade estava sempre caminhando pelo Centro, então o maestro decidiu colocar músicos na janela das sacadas para tocar enquanto as pessoas caminhavam", relembra. Hoje, o evento não possui mais cunho religioso e a orquestra é formada pela banda militar de Diamantina e pela banda mirim.
Por sua tradição e relevância, desde 2016, o concerto ao ar livre possui o título de patrimônio cultural de Minas Gerais.
*Estagiária sob a supervisão do subeditor Fábio Corrêa