Achou estranho o título desta matéria? Leia de novo, na ordem direta e também de trás para frente. É um palíndromo, certo? Seu autor é Ricardo Cambraia, mineiro de Campo Belo, servidor federal aposentado do Tribunal de Contas da União (TCU). Nas redes sociais, o que conta mesmo é seu apelido,
O Palindromista, um dos responsáveis por um movimento recente que uniu adeptos de todo o Brasil.
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Neste sábado (14/9), a partir das 9h09 (sim, até o horário é em formato de palíndromo), adeptos de várias regiões do Brasil vão se encontrar na Academia Mineira de Letras (AML). Neste ano, Belo Horizonte foi escolhida para receber o LÁ UNA ANUAL – 2º Encontro Brasileiro de Palindromistas.
A programação, aberta ao público, traz palestras, exposição, lançamentos literários e desafios. É gente de diferentes idades, formações e origens, que têm em comum a paixão pelas palavras que, lidas em qualquer direção, mantêm seu sentido.
Autores de palíndromo criam associação
Acaiaca, por exemplo, que todo belo-horizontino conhece como o célebre edifício na Região Central, é um palíndromo. Tanto que depois do encontro, que termina às 5h05 (da tarde), o grupo vai para o Terraço Acaiaca para um sarau.
A prática é antiga, remonta a muitos séculos. Mas o movimento que uniu os adeptos no país começou no Twitter/X, em 2018, quando Cambraia criou o perfil @OPalindromista. A conta veio em decorrência de uma sugestão de um colega. Já que ele criava palíndromos com tanta facilidade, por que não levá-los para o ambiente digital?
Cerca de 30 anos atrás, Cambraia sequer sabia o que era um palíndromo. Secretário-geral do Sindicato dos Bancários em Belo Horizonte, participava de uma reunião da classe em Brasília quando recebeu, num papel, a seguinte frase de um colega: “Até Reagan sibarita tira bisnaga ereta”.
“Está louco?”, foi o que ele perguntou ao colega. “Isto é um palíndromo”, ele explicou. E de estirpe – seu autor é Chico Buarque de Hollanda. A história seguiu, e Cambraia começou a criar os próprios palíndromos. Chegou ao Twitter e não conseguiu retorno nenhum.
Até que um dia teve uma ideia: começou a comentar notícias de política em forma de palíndromo, “como uma espécie de crônica diária”. Em um dia só chegou a criar 60. Começou a ter fãs – os jornalistas Guga Chacra e Xico Sá entre eles – e virou referência. Em 2021, lançou o livro “O Palindromista”, hoje esgotado.
Desafio
Com um grupo montado, foi criado um desafio semanal (#desafiopalindromo), sempre aos finais de semana, também via Twitter/X. “A gente define um curador, que escolhe o tema e todo o mundo posta com a hashtag”, conta Cambraia. A edição atual é a de número 174.
A versão 121 teve como tema Belo Horizonte: “A metrópole bela, vale Belô por tema!”, de @mateustg, foi a vencedora. Com todo o imbróglio em torno do Twitter/X, os palindromistas migraram para a rede social Bluesky.
Na vida real, também tem muita coisa rolando. A editora Carótide, criada por Silvio Lourenço e especializada em palíndromos, lança no encontro de hoje o segundo número da revista “ArtSinistra”. Também faz dois lançamentos literários, “O acaso paradoxo da raposa cão”, de André Araújo e “O ágape pagão”, de Fábio Cajueiro.
“Arara rara”
Na opinião de Cambraia, Fabio Aristimunho Vargas é o maior especialista em palíndromo no Brasil. Autor do ensaio “Arara rara”, ele participará da mesa-redonda “A experimentação nos palíndromos, anagramas e ambigramas”.
Datas e números não escapam dos palindromistas
Para quem está de fora, fazer palíndromo parece coisa de doido. Cambraia ri, mas ele faz com uma facilidade incrível. Pouco depois de conversar com a reportagem, criou a seguinte frase: “Só dama sorria: BH, bairros amados!”. Diz que foi a publicação diária em rede social que lhe garantiu a habilidade.
“A prática cotidiana é uma das chaves. A outra é conhecer um conjunto de palavras, que o meio chama de para-palíndromas. São palavras como vida e diva, porta e tropa, livre e servil. Invertidas, elas geram outras. Vida é diva invertida, porta e tropa também. Com o domínio das palavras, a prática acaba sendo internalizada”, explica.
Agora, as frases têm que ter alguma coerência, não adianta soltar palavras ao vento que, juntas, não façam qualquer nexo. “A frase não pode ter ‘quebra-mola’, ter como um garrancho no meio. Eu não gosto de ficar buscando palíndromos muito longos. Sou mais frasista, com frases curtas ou médias, que tenham exatamente as mesmas características”, finaliza Cambraia.
PROGRAMAÇÃO
Manhã: 9h09 a 12h21
• Lançamento do n° 2 da “ArtSinistra, Revista Brasileira de Palíndromos”, com o editor Silvio Lourenço
• Lançamento dos livros “O acaso paradoxo da raposa cão”, de André Araújo, e “O ágape pagão”, de Fábio Cajueiro
• Mesa-redonda: Palíndromo & Humor – Ironia, sátira e nonsense na palindromia, com André Araújo, Leo Cunha e Ricardo Cambraia
• Sessão de autógrafos e exposição
Tarde: 2h02 a 5h05
• Mesas-redondas: Palíndromo & Cia – A experimentação nos palíndromos, anagramas e ambigramas, com Fabio Aristimunho Vargas e José Carlos Aragão, e Palíndromo & Som – Ritmo e musicalidade, com Elisa Vasconcelos, Fabio Cajueiro e Pablo Javier Alsina
• Desafio palíndromo ao vivo (Cassie J)
LÁ UNA ANUAL – 2º ENCONTRO BRASILEIRO DE PALINDROMISTAS
Neste sábado (14/9), a partir das 9h09, na Academia Mineira de Letras (Rua da Bahia, 1.466 – Lourdes). Entrada gratuita.