O ano era 1989. A ideia inicial era desenvolver um projeto pedagógico que respondesse à tão delicada pergunta: “De onde vêm os bebês?”. Para isso, a baiana Denise di Santos, de 74 anos, criou uma bonequinha com aproximadamente um palmo de altura, grávida. Era ela quem explicaria de forma performática às crianças “A dança do parto”.

 




“Sempre me incomodou essa ideia machista, preconceituosa e mentirosa de que a criança nasce pelo bico da cegonha”, diz Denise.

 


A bonequinha cumpriu o papel de desconstruir um imaginário alienante com origens que remontam à Europa medieval, ao mesmo tempo em que elucidou os pequenos sobre questões básicas da vida. Contudo, “A dança do parto” transcendeu as salas de aula e virou peça de teatro, com a ajuda da bonequista Ismine Lima.

 


Denise e Ismine manipulavam a boneca dentro de uma caixa que servia como cenário, com direito a todos os elementos cênicos reduzidos para contextualizar a narrativa. A cena não era longa, tinha cerca de dois minutos e era apresentada para uma única pessoa, que assistia a toda a história olhando através de um pequeno buraco feito na caixa.

 

Roosevelt Neto/Divulgação - "Miau passado", do grupo pernambucano Pé de Vento, integra a programação de espetáculos exibidos para público de pequena escala



Essa modalidade cênica e dramatúrgica é conhecida no Brasil com o nome de Teatro Lambe Lambe. Neste 2024, quando se comemoram 35 anos da criação de “A dança do parto”, o Festival de Teatro em Miniatura (Festim) chega à sua 11ª edição prestando homenagem ao Teatro Lambe Lambe.

 


Desta quinta-feira (12/9) até o próximo dia 22, serão apresentados gratuitamente 30 espetáculos em nove espaços de Belo Horizonte. As montagens ocorrem no Parque Municipal Américo Renné Giannetti, Praça Duque de Caxias, Teatro de Bolso do Sesc Palladium, Teatro Francisco Nunes, Centro Cultural São Geraldo, Centro Cultural Venda Nova, Centro de Referência da Cultura Popular e Tradicional Lagoa do Nado, Aldeia Ponto de Cultura, no Bairro Horto; e sede do Instituto Hahaha, no Santa Tereza.

 


Entre as principais atrações está “A dança do parto”, que será apresentada por Denise nos dois últimos dias do festival, respectivamente no Parque Municipal e na Praça Duque de Caxias. “Carrego essa caixa nas minhas costas como se eu fosse um caracol”, brinca ela, em referência ao cenário da peça. Desde a morte de Ismine Lima, em 2022, Denise vem representando a cena sozinha.

 

“Antes eram duas performances. Em uma delas, a Ismine refazia (na cena) o parto dela e eu refazia o meu. Colocamos isso dentro de uma caixa porque tínhamos em mente que o parto é muito íntimo e só poderia ser visto por uma fresta, um buraco de fechadura”, explica.

 


Quem primeiro se atreveu a olhar por tal fresta foi Judite Bahiana Capinan, mãe do poeta e compositor tropicalista José Carlos Capinam. “Foi quando a gente se apresentou pela primeira vez em uma feira de cultura do interior da Bahia”, lembra Denise, destacando que foi outro tropicalista que lhe deu o primeiro boneco que ela teve na vida: o conterrâneo Tom Zé, na época com 14 anos.

 


Outros espetáculos

A programação do 11º Festim conta com outras produções de Teatro Lambe Lambe, como “Miau passado”, da companhia pernambucana Pé de Vento; “Isto não é uma caixa”, dos mineiros do Grupo Girino; e “O divino maravilhoso”, da belo-horizontina Kely Daiana, entre outros.

 


Há ainda peças que não se enquadram no Teatro Lambe Lambe, como “As aventuras de Matias”, um musical do Grupo Girino, e “A vida de mamulengo”, do pernambucano Chico Simões, no qual o público (cada sessão tem limite de 30 pessoas) é convidado a assistir ao espetáculo em cima do palco.
“Quando falamos em teatro em miniatura, não estamos apenas falando de fazer teatro com miniaturas, mas em diminuir – minimizar – a distância entre o público e o artista”, ressalta o curador do Festim, Tiago Almeida.

 


“Queremos nos aproximar das pessoas, trazendo o público para perto da cena. Seja apresentando uma cena breve para uma única pessoa ou para um público de 30 pessoas. Queremos proporcionar o olho no olho entre artista e plateia, o que é bem diferente dos grandes eventos, em que os espetáculos são montados para milhares de pessoas”, afirma.

 


Além das montagens, o Festim contará também com a roda de conversa “Café Debate – 35 anos do Teatro Lambe-Lambe: Memória e perspectivas”, no dia 21, às 18h, na sede do Instituto Hahaha, com a participação de Cássia Macieira, Denise di Santos, Mario Piragibe e Pedro Cobra.

 

 

11º FESTIVAL DE TEATRO EM MINIATURA
Desta quinta-feira (12/9) a 22/9, em oito espaços culturais de BH: Parque Municipal Américo Renné Giannetti, Praça Duque de Caxias, Sesc Palladium, Teatro Francisco Nunes (Parque Municipal), Centro Cultural São Geraldo (Rua Silva Alvarenga, 548, São Geraldo), Centro Cultural Venda Nova (Rua José Ferreira dos Santos, 184, Jardim dos Comerciários), Centro de Referência da Cultura Popular e Tradicional Lagoa do Nado (Rua Min. Hermenegildo de Barros, 904, Itapoã), Aldeia Ponto de Cultura (Rua Silva Freire, 133, Horto); e sede do Instituto Hahaha (Rua Estrela do Sul, 126, Santa Tereza). Programação completa no site. Entrada franca.

 

 

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