Desde o título, “Meu amigo pinguim” propõe-se antes de tudo como filme infantil. Temos ali a história do jovem pescador que mora em Ilha Grande (RJ) e certo dia leva o filho com ele para o trabalho em seu bote. É apanhado pela tempestade, perde o filho afogado no mar. Para piorar, era bem o dia do aniversário do menino.
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Dali passamos para a Patagônia, anos depois. É o tempo da migração, pinguins saltam na água em bando. Um pinguim aparentemente pouco sociável deixa seu grupo e empreende a viagem solo que vai levá-lo, justamente, à Ilha Grande. Eis em linhas gerais o princípio de “Meu amigo pinguim”.
No litoral do Rio, o pinguim é encontrado por João (Jean Reno), velho pescador há décadas deprimido pela morte do filho perdido na tempestade. João apega-se de imediato ao pinguim. Logo o animal se tornará um substituto do filho – até porque parece vê-lo como um presente ou retribuição do mar.
O afeto ao pinguim se torna sua razão de viver. Verdade que esse afeto é compartilhado pela comunidade local. Uma menina dá ao pinguim o nome de Dindin. João aprova. Volta a sorrir. Finda, porém, a bela temporada de acolhimento e cuidados – o pinguim chegou bem afetado à Ilha Grande –, ele desaparece. Sem dizer até logo, volta à Patagônia, Argentina.
Observe-se que o filme é baseado na história de um pinguim que apareceu no escaldante litoral do Rio, aonde não era obviamente esperado: pinguins são animais de regiões geladas.
Acompanhando Dindin, também o filme desloca-se para a Patagônia. Ali estão centenas de pinguins, com aquele jeito de “quase humanos” que os torna tão atraentes aos humanos. Ali se encontra também um casal de cientistas dedicados ao seu estudo. Logo estranham quando topam com o pinguim desviante. O marido, a parte pessimista da família, o chama de “anormal”. A mulher insiste em chamá-lo de “singular”.
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Esse é o ponto em que o filme acrescenta ao caráter infantil um aspecto fabular bem próprio de nossa época. Como designamos os diferentes, afinal? Por anormais ou por singulares – ou únicos, ou especiais?
A mulher insiste na capacidade de adaptação da espécie, o que justificaria a migração surpreendente de Dindin. É por isso que ele pode sobreviver mesmo num lugar como o Rio de Janeiro.
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O importante é que a fabulação está criada e estabelecida: os diferentes não são anormais, são talvez únicos, singulares. E nossos atos e ideias devem ser abalizados por aquilo que a natureza aceita.
Tudo o mais que precisamos é de liberdade. E isso o pescador João sabe dar a Dindin, que passeia pela vila, volta à Patagônia quando bem entende e reaparece pontualmente na época da migração.
Claro que, para conseguir isso anos a fio, Dindin tem de ser determinado, como a lembrar a pais e crianças que é preciso determinação para conseguir algo na vida.
Vila feliz
Temos então um filme para crianças que de um fato acontecido extrai a fábula que se endereça sobretudo aos adultos que acompanham as crianças.
Quanto ao caráter infantil, ressalte-se a convivência sempre feliz na vila de pescadores, que aniquila qualquer contradição possível. É um mundo de sonhos ou pesadelos.
Com tudo isso, mais a presença de Jean Reno, temos um filme que alguém não deixará de chamar de “fofo”, isto é, inofensivo e simpático. E, concorde-se ou não com a fábula e os significados ali embutidos, “Meu amigo pinguim” serve a crianças e adultos sem perder a dignidade.
"MEU AMIGO PINGUIM"
(Brasil, EUA, 2024, 107 min. De David Schürmann, com Jean Reno, Adriana Barraza e Alexia Moyano). Estreia nesta quinta-feira (12/9) em salas dos shoppings BH, Boulevard, Cidade, Contagem, Del Rey, Monte Carmo, Norte e Pátio Savassi.