Na bandeira de Belo Horizonte ou na poesia de Carlos Drummond de Andrade, a Serra do Curral, cadeia de montanhas que limita o Sul da capital mineira, consagra-se não apenas como importante marco geográfico, mas é também herança ambiental celebrada por meio da arte.

 




A serra que abriga inúmeras espécies de fauna e flora e constitui-se como relevante ponto histórico-cultural de BH agora se transmuta em pó sobre tela a partir do trabalho de Sérgio Marzano. O mineiro natural de Conselheiro Lafaiete abre ao público nesta quarta-feira (25/9) a exposição “Se, ser, serra”, no Parque do Palácio, local ao pé das montanhas que o inspiraram a criar um conjunto de 19 quadros.

 

 


Formado em administração, Marzano teve seu despertar para a arte após frequentar um ateliê de serigrafia, onde fazia pinturas com as tintas que sobravam. Mais tarde, enquanto realizava estágio em Ouro Preto, ajudou a construir uma árvore de Natal com materiais de sucata. A série de experiências nas artes plásticas o levou a estudar pintura e escultura na Escola Guignard, em Belo Horizonte, unidade acadêmica da UEMG.


Pilão e peneira

Substituindo o tradicional pincel por uma peneira, Marzano busca pigmentos coloridos na própria natureza para cobrir suas telas. Os minerais brutos encontrados são frequentemente triturados por ele com um pilão, peneirados sobre os quadros e fixados por verniz.

 


“Nas minhas andanças pela Serra do Curral, notei como o solo de Minas Gerais é rico e oferece uma grande paleta de cores. Podemos encontrar amarelo, vermelho, cinza e várias outras tonalidades, principalmente na região do Quadrilátero Ferrífero, local abundante em minério de ferro”, diz o artista. “A partir dessa experiência, passei a trabalhar com os materiais que a própria natureza oferece. Represento por meio da arte a riqueza do nosso estado.”

 

Quadrilátero Ferrífero


Importante província mineral do Sudeste que abriga também a Serra do Curral, o Quadrilátero Ferrífero é uma região de aproximadamente 7 mil quilômetros quadrados, que abrange vários municípios mineiros, como Itabirito, Conselheiro Lafaiete, Mariana e Ouro Preto.

 


A área foi encontrada no século XVII pelos portugueses e explorada com afinco ao longo do período do Brasil colônia, especialmente durante o Ciclo do Ouro. Ainda hoje, as atividades de mineração para fins econômicos são fortemente exploradas em Minas e exercem significativo impacto ambiental.

 


“O Quadrilátero possui muitos minerais. Como a minha família é de Ouro Preto, com frequência percorro trechos em que encontro minérios disponíveis para usar no meu trabalho. No meu caminho, principalmente perto de cachoeiras, há materiais que vão desde o minério de ferro até o arenito e o filito”, descreve Marzano.

 


No excesso de carga de minério que vários caminhões transportam na região do Quadrilátero, Sérgio encontra seu tesouro. Com a extração abundante no estado, muito desse material é desperdiçado e jogado nas beiras das estradas. Assim, os resíduos de várias cores encontrados pelo artista são aproveitados e usados como tinta sobre as telas.

 

Materiais


Conforme ele diz, muitos materiais foram combinados para representar a Serra do Curral na exposição no Parque do Palácio. Entre eles, minério de manganês, minério de ferro, óxido de ferro, minério de cobre – também chamado de malaquita –, ardósia, pó de pedra sabão, areia, caulim, carvão e saibro.

 


O saibro, material usado em quadras de tênis – esporte também apreciado e praticado pelo artista – foi utilizado aqui como pigmento de cor laranja.

 


Além de explorar a materialidade da Serra do Curral, “Se, ser, serra”, tem a intenção de provocar reflexão acerca das queimadas que assolam o Brasil. A partir de quadros escuros pintados com carvão e objetos recolhidos e montados por Sérgio Marzano na galeria, o artista chama a atenção para os desastres climáticos atuais.

 


“No espaço disponível para exposição, há uma lareira em que dispus alguns objetos que remetem ao momento atual de seca e queimadas no país. Na lareira, há um toco de carvão que encontrei em uma área de queimada e pó de terra laranja. O conjunto lembra brasas, como se o tronco estivesse aceso. Dei muita ênfase ao carvão nesse trabalho, justamente pelos incêndios que estão ocorrendo por toda parte”, afirma.

 


“SE, SER, SERRA”
Exposição de Sérgio Marzano. No Parque do Palácio (R. Prof. Djalma Guimarães, 161, portaria 2 - Mangabeiras). Visitação de quarta a sexta, das 10h às 18h; sábados e domingos, das 9h às 18h. Até 1º de dezembro. Ingressos para entrada no parque a R$10 (inteira) e R$ 5 (meia), à venda no Sympla. Entrada franca às quartas-feiras.

 

*Estagiária sob supervisão da editora Silvana Arantes

compartilhe