Cristian Budu comenta que muitos dos talentos brasileiros na composição para piano foram esquecidos ou subestimados do ponto de vista de sua importância histórica -  (crédito: Daniel Ebendinger/Divulgação)

Cristian Budu comenta que muitos dos talentos brasileiros na composição para piano foram esquecidos ou subestimados do ponto de vista de sua importância histórica

crédito: Daniel Ebendinger/Divulgação

 

Primeira publicação modernista após a Semana de 1922, a revista “Klaxon”, em seu número inicial, lançado três meses após o evento no Teatro Municipal de São Paulo, destacava um texto do sempre provocador Mário de Andrade (1893-1945). Em “Pianolatria”, o papa do Modernismo criticava a dependência que o mundo musical paulistano tinha do instrumento.

 


“Mas não é o progresso implacável do piano, aqui uma das causas do nosso atraso musical? É. Dizer música, em São Paulo, quase significa dizer piano.” Um século mais tarde, Cristian Budu, um dos principais pianistas brasileiros da atualidade, reverencia o pensamento de Mário de Andrade.

 


Busca também ampliar seu olhar. “Apesar de ser um trabalho de piano solo no qual o virtuosismo está presente, existe a ambição de ressignificar o termo”, escreve Budu, de 36 anos, no encarte do álbum “Pianolatria”.

 


Lançado em abril passado pelo Selo Sesc, tal trabalho será apresentado pela primeira vez em Belo Horizonte. O recital será nesta terça (1º/10), no Conservatório UFMG, dentro da programação da mostra “Retratos do Brasil”.

 


“Pianolatria” é um álbum duplo de piano solo com duas horas de duração – obviamente, na apresentação de hoje, Budu trará um recorte deste material. O repertório é exclusivamente de compositores brasileiros, “modernistas, ou que influenciaram, ou foram influenciados por eles”, conforme explica o pianista.

 


“A ideia do projeto é tentar traçar um tipo de panorama da música brasileira abrangendo diversas origens da nossa cultura, não somente a europeia. Por isso evoco Mário de Andrade. O piano pode agregar valores diversos, culturas diferentes, ricas em diversidade”, diz.

 


Compositores

O disco traz músicas de nomes incontestes da produção nacional, como Carlos Gomes, Heitor Villa-Lobos, Radamés Gnatalli, Chiquinha Gonzaga, Francisco Mignone, Camargo Guarnieri, Ernesto Nazareth e Lorenzo Fernandez.

 


Mas também traz outros, menos lembrados (quando não esquecidos), como Luciano Gallet, Nininha Velloso Guerra, Fructuoso Vianna, Henrique Alves de Mesquita, Tia Amélia, Clarisse Leite (mão de Arnaldo Baptista e Sérgio Dias, dos Mutantes), Cacilda Borges Barbosa, Brasílio Itiberê II.

 


“O Henrique Alves de Mesquita foi, junto com Carlos Gomes, um dos primeiros compositores negros brasileiros de destaque. A Tia Amélia foi uma pioneira, tocava choro, tinha grupo, era bastante difundida (em sua época). A Clarisse também, principalmente fora do Brasil. Assim que elas faleceram, entraram no esquecimento. E deixaram obras vastíssimas”, comenta Budu, que, para o projeto, não colocou peso diferente (para a obra de um autor conhecido ou não).

 


“O álbum foi construído basicamente através da linguagem, buscando encontrar um caminho brasileiro de representação. A intenção foi colocar as obras lado a lado, não uma embaixo e outra em cima.”

 


Para a seleção do repertório, ele contou com a colaboração de Alexandre Dias, diretor do Instituto Piano Brasileiro (IPB). “Há décadas ele pesquisa e resgata a edição da música brasileira, muito focado na cultura pianística. Foi me indicando muita coisa para ouvir.”

 


Budu, que durante a pandemia mudou-se para Belo Horizonte, onde nasceu sua primeira filha, já voltou para São Paulo – divide-se hoje entre a capital paulista e Paris. “Saí de Minas, mas Minas não saiu de mim. Sempre que estou aqui me sinto ainda em casa”, afirma.

 


CRISTIAN BUDU
Recital na mostra “Retratos do Brasil”. Nesta terça (1º/10), às 19h30, no Conservatório UFMG, Avenida Afonso Pena, 1.534, Centro, (31) 3409-8300. Entrada franca.