"O despertar da besta" é um dos 10 filmes que compõem a programação, exibida no Cine Humberto Mauro, gratuitamente, até o próximo dia 10

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O Cine Humberto Mauro recebe, a partir desta quinta-feira (3/10), a mostra “O estranho mundo de Zé do Caixão”, que reúne 10 títulos da filmografia de José Mojica Marins (1936-2020), conhecido como “o pai do terror brasileiro”. O conjunto envolve as principais obras do cineasta, e nove dos filmes serão exibidos em versão restaurada, pela primeira vez.

 


As obras restauradas são “À meia-noite levarei sua alma” (1964), “Esta noite encarnarei no teu cadáver” (1967), “O estranho mundo de Zé do Caixão” (1968), “O despertar da besta” (1970), “Finis hominis – O fim do homem” (1971), “Quando os deuses adormecem” (1972), “A estranha hospedaria dos prazeres” (1976), “Inferno carnal” (1977) e “Delírios de um anormal” (1978). A programação se completa com “Encarnação do demônio” (2008), o último trabalho de Mojica.

 


A restauração dos filmes teve coordenação técnica e artística de Paulo Sacramento, produtor e montador de “Encarnação do demônio”. As latas com os negativos originais das obras estavam na Cinemateca Brasileira. O custeio do processo ficou por conta da empresa britânica Arrow Films. O restauro propriamente dito foi feito entre 2022 e 2023, nos laboratórios CineColor, em São Paulo.

 


“Maratona cadavérica”

A abertura da mostra será com uma sessão especial de “O despertar da besta”, comentada por Crounel Marins, filho do cineasta e colaborador do pai em muitos de seus filmes, e por Carlos Primati, crítico e pesquisador especializado em cinema fantástico. Na sexta (4/10), será promovida a “Maratona cadavérica”, que seguirá madrugada adentro, também com sessões apresentadas pela dupla de convidados.

 


Ainda na programação haverá uma palestra de Paulo Sacramento sobre as possibilidades técnicas disponíveis para o restauro de filmes antigos. Ele abordará especificamente o trabalho feito com os filmes de Mojica.

 

José Mojica Marins como Zé do Caixão

O criador José Mojica Martins e a criatura Zé do Caixão se confundem em "À meia-noite levarei sua alma", atração da madrugada de sábado em BH

FCS/divulgação


Gerente e programador do Cine Humberto Mauro, Vitor Miranda observa que uma das principais singularidades de Mojica é a simbiose entre criador e criatura. “É difícil separar José Mojica de Zé do Caixão”, diz.

 


Ele cita outros exemplos no cinema brasileiro e mundial – o Carlitos de Charles Chaplin, Mazzaropi, Oscarito e Grande Otelo, entre outros –, mas pondera que há diferenças distintivas fundamentais. “Esses outros diretores e atores criaram personagens marcantes com o intuito de que o público se identificasse. Com Zé do Caixão não era assim, não é uma figura para você simpatizar, pelo contrário, é para sentir uma certa abjeção”, afirma.

 


Miranda diz que esse personagem e os filmes de Mojica, em geral, cumpriam a função de “expurgar os demônios da sociedade brasileira”, sempre com boa dose de crítica ao mundo contemporâneo. Ele sublinha que Zé do Caixão foi construído a partir de vários elementos do folclore brasileiro, o que, de certa forma, explica o interesse que sua obra desperta em plateias internacionais.

 


“Mojica dizia que pegava algumas referências do cinema estrangeiro, mas odiava ser comparado com Batman, por causa da capa, ou com Drácula; ele queria ser comparado com a Mula Sem Cabeça”, diz. Essa bagagem foi construída a partir da infância, já que o pai era dono de um cinema onde ele cresceu assistindo a filmes de faroeste e de terror. “Ele tinha muita consciência formal dos elementos cinematográficos.”

 


Diretor inventivo

O cineasta utilizava a câmera de maneira inventiva, explorava muito a profundidade de campo, então, segundo o gerente do Cine Humberto Mauro, não apenas o personagem o distinguia, como também a forma de construir seus filmes. Miranda diz sentir falta, na seleção de obras que passaram pelo processo de restauro, de “Exorcismo negro” (1974), mas considera que a mostra encerra um recorte expressivo de uma produção vasta, que teve início na década de 1940 e seguiu praticamente ininterrupta.

 


No período de 30 anos entre “Delírios de um anormal” e “Encarnação do demônio”, Mojica dirigiu vários filmes, não necessariamente com Zé do Caixão. “Na década de 1980 ele passou por um momento, comum no cinema brasileiro daquela época, de fazer pornochanchadas e filmes de sexo explícito. Mojica era um trabalhador do cinema, investia esperando retorno, então ele fazia não só o que queria, mas o que achava que poderia dar lucro”, comenta. 

 


“O ESTRANHO MUNDO DE ZÉ DO CAIXÃO”
A partir desta quinta-feira (3/10) até 10/10, no Cine Humberto Mauro do Palácio das Artes (Av. Afonso Pena, 1.537, Centro). Entrada gratuita, com retirada de ingresso a partir de meia hora antes de cada sessão, na bilheteria do cinema, exceto no caso dos três últimos filmes da “Maratona cadavérica”, para a qual a entrada única estará disponível na plataforma Eventim a partir das 12h desta sexta-feira (4/10). Programação completa no site da Fundação Clóvis Salgado

 

SESSÕES ON-LINE

Durante o período de realização da mostra “O estranho mundo de Zé do Caixão”, serão disponibilizados na plataforma CineHumbertoMauroMais três filmes – “À meia noite levarei sua alma”, “Esta noite encarnarei no teu cadáver” e “Mojica na neve: esta noite encarnarei em Sundance” (2001), documentário em curta-metragem, dirigido por André Barcinski, Ivan Finotti e André Finotti, que retrata a intimidade do pai do terror brasileiro e que não terá exibição presencial. Também serão disponibilizados textos inéditos sobre a obra do diretor.