O cantor e compositor gaúcho Vitor Ramil, de 62 anos, até tentou, mas não conheceu pessoalmente o poeta paranaense Paulo Leminski (1947-1989). Em 1987, durante temporada de shows em Curitiba, não houve jeito de entregar a Paulo o recém-lançado disco “Tango”.
“Foi a vez em que estive mais próximo dele, que morreu dois anos depois. A poesia de Leminski me atrai, principalmente pela combinação de alta cultura com cultura pop, grafite, esse tipo de coisa”, diz Ramil.
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O encontro desta dupla se dá agora, no álbum “Mantra concreto” (Satolep Music), com 15 poemas de Paulo musicados por Vitor, que chega nesta quinta-feira (10/10) às plataformas. A ideia surgiu durante a pandemia, quando o gaúcho se viu trancado em casa, em Pelotas, para cumprir o confinamento social.
“Um belo dia, lendo 'Toda poesia', livro do Paulo, peguei o violão e compus a canção ‘Sujeito indireto’. Mandei para a poeta Alice Ruiz, que foi casada com ele, e ela adorou. No dia seguinte, lendo novamente o livro, peguei o violão e compus outra, ‘Teu vulto’. Praticamente compunha uma por dia. Cheguei a fazer três músicas no mesmo dia”, revela.
O “encontro” dos dois virou “um surto”, conta Ramil. “Até brincava com Alice, dizendo que ‘Teu vulto’ era sobre um cara falando de alguém que não está ali, mas ele ouve barulhos e qualquer som pode ser a voz, a presença, o vulto daquela pessoa. Disse para ela: 'Olha, os arbustos aqui de casa estão se mexendo, acho que o Paulo está me rondando'. Foi impressionante, nunca tinha vivido a experiência de compor tantas músicas com um poeta tão consistente em tão pouco tempo.”
Surto criativo
Deste “surto”, que durou três semanas, surgiram 13 canções. Outras duas parcerias de Vitor com Paulo haviam chegado antes: “O velho León e Natália em Coyoacán” entrou no disco “Tambong”, de 2000, e “Uma carta uma brasa através” foi gravada pela cantora Juliana Cortes, de Curitiba.
Paulo Leminski: corpo a corpo com a linguagem
Não se trata propriamente de novidade na carreira de Ramil, que musicou poemas dos gaúchos João da Cunha Vargas (1900-1980) e Angélica Freitas, além do argentino Jorge Luis Borges (1990-1986), a quem dedicou um álbum.
O compositor ressalta que a poesia de Leminski tem características com as quais se identifica muito. “É esse mundo que vai da literatura para a canção popular, a linguagem de rua... Isso é meu chão também. Não sei se voltarei a musicar poesias dele, não vou forçar isso, porque quando se começa uma coisa e fica esquemático, ela perde vida, pelo menos para mim é assim. Mas se eu tiver outro surto desse, nova imersão na obra dele, vou musicar, lógico”, comenta.
Em alguns casos, o próprio Vitor batizou as canções, pois Paulo Leminski costumava não dar título a alguns poemas. Isso ocorreu com “Mantra concreto”, por exemplo.
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O gaúcho está feliz com o resultado de seu encontro com Leminski. “Parece até que a letra veio junto com a música ou, às vezes, até depois. Ficou consistente – isso, para mim, é o grande barato. Na verdade, só me lanço quando sinto que a coisa flui. Ouço muita poesia musicada que acho um desastre, coisa de o cara se esforçar para encaixar aquilo. Tem muita gente que compõe bem, mas não sabe musicar poesia.”
Clipe com Leminski e Alice Ruiz
O vídeo de “Amar você” já foi para a internet. “Teu vulto” será o próximo. “O primeiro clipe, com imagens de Leminski e Alice, ficou muito legal”, garante o cantautor de Pelotas. “Ele fez esta música para ela. Pensamos na história deles, fizemos uma homenagem mesmo”, informa.
Minas Gerais também marcou presença neste encontro do compositor gaúcho com o poeta paranaense. É do mineiro Toninho Horta a guitarra que se ouve na faixa “Minifesto”.
REPERTÓRIO
“DE REPENTE”
“TEU VULTO”
“ADMINISTÉRIO”
“AMAR VOCÊ”
“PROFISSÃO DE FEBRE”
“PALAVRA MINHA”
“UM BOM POEMA”
“ANFÍBIOS”
“SERÁ QUASE”
“O VELHO LEON E NATÁLIA EM COYOACÁN”
“SUJEITO INDIRETO”
“UMA CARTA, UMA BRASA ATRAVÉS”
“MINIFESTO”
“CARICATURA”
“MANTRA CONCRETO”
“MANTRA CONCRETO”
• Álbum de Vitor Ramil
• Satolep Music
• 15 faixas
• Lançamento nesta quinta-feira (10/10), nas plataformas musicais