No palco, só de calção, Clayton Nascimento encarna 25 personagens, todos vítimas da intolerância brasileira -  (crédito: Bob Sousa/Divulgação)

No palco, só de calção, Clayton Nascimento encarna 25 personagens, todos vítimas da intolerância brasileira

crédito: Bob Sousa/Divulgação

 

 

Era quinta-feira à noite. Agosto de 2014. A TV transmitia Grêmio e Santos pelas oitavas de final da Copa do Brasil, mas a cena que mais chamou a atenção não tinha nada a ver com futebol: as câmeras flagraram uma torcedora do Grêmio chamando o goleiro do Santos, Mário Aranha, de “macaco”, enquanto torcedores emitiam sons e faziam gestos que aludiam ao animal.

 

 


“Esse episódio despertou em mim a vontade de escrever sobre o racismo no Brasil”, conta o ator e roteirista paulistano Clayton Nascimento sobre “Macacos”, monólogo que será apresentado em única sessão em Belo Horizonte, nesta quinta-feira (31/10), no Grande Teatro do Sesc Palladium.

 

 


“Depois de ver o que aconteceu com o Aranha, comecei a rascunhar algumas ideias. Mas o impulso final para escrever veio de um episódio de racismo que vivi”, diz, referindo-se ao dia em que foi abordado por duas pessoas na Avenida Paulista, que o acusavam de roubar uma mercearia. O incidente ocorreu quase um ano depois do caso do goleiro Aranha.

 


“Foi ali que entendi que a melhor forma de responder à sociedade era criando uma peça criticando essa realidade”, afirma Nascimento.

 

Elogios de Fernandona e Marieta Severo

 


O espetáculo, que estreou em 2022, rendeu ao ator os prêmios APCA, APTR e Shell, além de elogios públicos de Fernanda Montenegro, Marieta Severo, Renata Sorrah, Camila Pitanga, Deborah Evelyn e Zezé Polessa.

 

 


Em “Macacos”, Clayton interpreta 25 personagens, homens e mulheres negros que compartilham histórias além da narrativa oficial, explicando como e por que o racismo se estruturou no Brasil.

 


Em pouco mais de duas horas, ele transita por tensão, alívio cômico e cenas com dados apresentados didaticamente, como estatísticas sobre mães e famílias de jovens negros presos ou mortos pela polícia.

 

Realidade no palco

 

O monólogo recria casos reais como o de Eduardo, de 10 anos, morto com um tiro de fuzil na cabeça durante operação policial no Complexo do Alemão (RJ), em 2015, enquanto brincava nas escadas de casa.

 


Personagens ganham vida sem maquiagens ou figurinos. Em cena, Clayton veste apenas um calção, que destaca o corpo negro do ator.

 

 


O calção de linho – tecido usado pela realeza africana antes da colonização, segundo Clayton – carrega outros simbolismos. “É uma roupa típica do Brasil, usada por muitos meninos nas periferias”, lembra o ator.

 


Após temporada na Europa em 2024, Clayton espera levar o monólogo para todo o país no próximo ano, inclusive com sessões em escolas públicas.

 


“Estudei muito a história do Brasil para montar o espetáculo, descobri informações que a maioria dos brasileiros desconhece. Meu maior desejo é democratizar esse conhecimento, espalhar essa consciência”, conclui.


“MACACOS”


Monólogo escrito, dirigido e apresentado por Clayton Nascimento. Nesta quinta (31/10), às 21h, no Grande Teatro do Sesc Palladium (Rua Rio de Janeiro, 1.046, Centro). Inteira: R$ 60 (plateia 2) e R$ 50 (plateia 3), à venda na bilheteria e na plataforma Sympla. Meia-entrada na forma da lei. Informações: (31) 3270-8100.