O Museu Mineiro, que este ano assistiu a um expressivo aumento de público – foram, até o momento, cerca de 16 mil visitantes, contra aproximadamente 10 mil no ano passado – está com duas novas exposições. Com origens e propostas bem distintas, elas estrearam na última semana, no bojo da 18ª Primavera dos Museus. “Nós” dialoga diretamente com o que foi a temática desta edição: “Museus, acessibilidade e inclusão”.

 


A mostra reúne trabalhos produzidos por um coletivo de 60 pessoas com deficiência – distúrbios neurológicos, mentais, intelectuais, motores e visuais que, no entanto, não impediram o grupo, formado por adultos entre 19 e 60 anos, de criar joias, esculturas, painéis, objetos e instalações que incorporaram técnicas de tecelagem, costura, bordados, estampas e tingimentos.

 


Coordenado pela artista e professora Dulce Couto, que também assina a curadoria da exposição, o trabalho foi desenvolvido durante oito meses, no espaço de criação artística da Escola Municipal de Ensino Especial Santo Antônio. A subsecretária de cultura da Secretaria de Estado de Cultura e Turismo de Minas Gerais, Nathalia Larsen, chama a atenção para o valor social e artístico de “Nós”, bem como para o caráter plural de uma mostra resultante do trabalho de um grupo neurodivergente.

 




“Existe ali uma proposta de transformação social desse grupo com que Dulce Couto trabalhou. Entendo que a arte tem esse papel. Do ponto de vista estritamente artístico, acho que se destaca nesse conjunto a fluidez entre os suportes, compreendendo que a questão da diversidade tem essa implicação. É um conjunto que permite a nós, ditos normais, uma percepção do universo da loucura com o qual, no fundo, a gente se identifica. Há um poder de transformação também sobre a pessoa que observa”, afirma.

 


Ela destaca que, quando essa produção ocupa um ambiente artístico, acaba se inserindo com muita naturalidade. “A gente espera que seja algo muito diferente do que é produzido no âmbito da arte contemporânea, por exemplo, e, contudo, o que existe ali é um panorama de normalidade”, diz. Com relação à outra mostra em cartaz no Museu Mineiro, Nathalia Larsen observa que é de enorme interesse, por seu caráter de ineditismo.

 

 


Amor e amizade

“De Guignard para Amalita, graças a Adelaide” reúne uma coleção composta por 111 cartões de amor e amizade pintados, desenhados e bordados por Alberto da Veiga Guignard entre os anos de 1932 e 1937, quando morou no Rio de Janeiro, dedicados à pianista Amalita Fontenelle, a quem tinha como musa inspiradora e por quem nutria uma paixão platônica.

 

Cartões escritos por Guignard em exposição no Museu Mineiro

Museu Mineiro/Divulgação


Até o final da década de 1980, não se sabia da existência desses cartões, que estavam sob guarda de Adelaide Guerrini Andrade, viúva do artista plástico Nonê, filho primogênito de Oswald de Andrade (o que explica o título da mostra), a quem Guignard teria confiado a coleção. Isso é o que se especula, mas a verdade é que há muitas lacunas com relação ao percurso que esses cartões cumpriram até serem entregues por Adelaide à Secretaria de Estado de Cultura de Minas Gerais, em 1987.

 

 

Naquele ano, foram incorporados ao então recém-criado Museu Casa Guignard, em Ouro Preto. Graças aos artistas Aurélio Hilgenberg dos Santos e Leandro Vilar, fundadores do Atelier Dois Capelistas, o conjunto pôde ser visto na íntegra, em exposição realizada no semestre passado, no Museu Casa Guignard.

 


Vilar conta que seu contato com esse conjunto de cartões remonta a 1996, quando, ainda sem saber quem era Guignard, conheceu pessoalmente, por um acaso, Adelaide. “Nos conhecemos em uma aula de artes, logo quando me mudei para São Paulo, e ela me contou a história de como aqueles cartões tinham ido para em seu baú”, diz.

 


Ele enveredou pela seara do cinema, mas ficou com a história na cabeça. “Um tempo depois, fui trabalhar no longa 'Vida de menina', da Helena Solberg, filmado em Diamantina, e uma das produtoras me mostrou um livro, um fac-símile dos cartões, produzido pela Eleonora Santa Rosa. Lembrei da história que Adelaide tinha me contado. Quando vim morar em Ouro Preto, tivemos a ideia de voltar a esses cartões”, conta.

 


Nathalia Larsen aponta que os cartões já haviam sido expostos, mas não em conjunto e com a contextualização histórica a partir do que se sabe e com o projeto expográfico criado pelo Atelier Dois Capelistas. “Com esse suporte único, que são os cartões-postais, Guignard trabalhou diversas linguagens, como croquis, arabescos, frases, desenhos, e o resultado é muito interessante. É uma mostra muito delicada, com uma estética que remete mesmo a outro tempo”, afirma.

 


“DE GUIGNARD PARA AMALITA, GRAÇAS A ADELAIDE”
Em cartaz até 9 de novembro, no Museu Mineiro (Av. João Pinheiro, 342, Lourdes). Horário de visitação: de terça-feira a domingo, das 12h às 19h. Entrada franca.


“NÓS”
Em cartaz até 16 de outubro, no Museu Mineiro (Av. João Pinheiro, 342, Lourdes). Horário de visitação: de terça-feira a domingo, das 12h às 19h. Entrada franca.

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