Uma história antiga do povo indígena Krenak diz que, em certa ocasião, o Criador deixou a Terra e retirou-se para outro canto do cosmos. Passados vários anos, ele sentiu saudade das suas criaturas e decidiu visitá-las. Por temer o que os humanos teriam se tornado em sua ausência, o Criador se transformou em tamanduá, mas logo foi capturado por um grupo de caçadores. Preso para mais tarde se tornar comida na aldeia, Deus foi deixado ao cuidado de duas crianças gêmeas, que desconfiaram da identidade do animal.


O encontro improvável entre os meninos e o Criador foi primeiro transformado em texto pelo ativista e escritor Ailton Krenak e mais tarde se tornou também música de Gilberto Gil e Emicida. Agora, o conto ganha nova versão na forma de livro ilustrado para as crianças.

 




“Kuján e os meninos sabidos” (Companhia das Letrinhas), é a primeira obra dedicada ao público infantil de Ailton Krenak. Com ilustrações de Rita Carelli, o livro ganha evento de lançamento com ingressos já esgotados nesta sexta (4/10), na Academia Mineira de Letras (AML).

 

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“Foi mágico escrever uma obra voltada para as crianças. Quando temos uma disposição para o simples, adquirimos a habilidade de converter histórias dramáticas e difíceis de acompanhar em parábolas curtas”, afirma Krenak. “Me considero um contador de parábolas. Meus três livros ‘Ideias para adiar o fim do mundo’, ‘A vida não é útil’ e ‘Futuro ancestral’ são, na verdade, ensaios interligados que reúnem narrativas da oralidade transformadas em texto.”


Lenda indígena

 

A lenda de kuján – palavra para “tamanduá” na língua krenak – e os meninos gêmeos faz parte da tradição oral da nação i e foi transformada em texto pelo escritor em outras ocasiões.

 

 

Além de ter sido mencionada em seu livro “A vida não é útil”, a narrativa ganhou versão mais detalhada no dossiê “Poesia indígena de Minas Gerais”, organizado por ele e pela professora Maria Inês de Almeida para a edição 81 da revista da AML. O conto da vinda de Deus na forma de tamanduá ao mundo também foi explorado na música “É tudo para ontem”, de Emicida e Gilberto Gil.


“‘Kuján e os meninos sabidos’ foi feito ao longo de quase cinco anos, até chegar ao tom de parábola que a criança pode ouvir e não correr o risco de enjoar. Não podemos ir até o limite da paciência da criança como os aparelhos eletrônicos fazem. A maior beleza da infância é a imaginação e isso deve ser incentivado”, afirma Krenak.

 

 


Em continuidade ao seu trabalho de conscientização a respeito do cuidado com a Terra e da relação dos seres humanos com a natureza e os animais, a obra de Krenak chega para transmitir aos mais jovens valores como responsabilidade com o planeta e a importância da ancestralidade.


“Devemos admitir que apenas as crianças têm condição de conceber qualquer coisa além do estado de crise climática em que estamos vivendo. A nova geração já caiu em um mundo que é uma verdadeira fogueira. Por isso, merecem cuidado e respeito. São eles que vão nos instruir a respeito do futuro”, afirma.


Escritor, professor, filósofo e ativista da causa indígena, Ailton Krenak ocupa a cadeira 5 da Academia Brasileira de Letras (ABL) e a cadeira 24 da AML, sendo o primeiro indígena a ter um assento nas duas instituições.


Mostra no CCBB BH

 

Até 30 de novembro, a exposição “Hiromi Nagakura até a Amazônia com Ailton Krenak” ocupa o CCBB BH, na Praça da Liberdade. A mostra reúne fotografias de Nagakura, feitas entre 1993 e 1998, período em que viajou pela região amazônica com Ailton Krenak. Objetos dos povos visitados e atividades como palestras, debates e oficinas também compõem a mostra, que fica aberta ao público de quarta a segunda, das 10h às 22h. Entrada gratuita, com retirada de ingressos na bilheteria local ou https://ingressos.ccbb.com.br/.


“KUJÁN E OS MENINOS SABIDOS”
• Ailton Krenak
• Ilustração: Rita Carelli
• Companhia das Letrinhas
• 40 páginas
• Preço: R$ 54,90
• Lançamento nesta sexta-feira (4/10), às 19h30, no auditório da Academia Mineira de Letras (R. da Bahia, 1.466 – Centro). Ingressos esgotados.

 

* Estagiária sob supervisão da subeditora Tetê Monteiro

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