Se vamos fazer, que seja com a régua alta. Em 2011, de volta ao Brasil depois de um longo período na Europa, o maestro Isaac Karabtchevsky foi convidado para dirigir a Sinfônica Heliópolis, em São Paulo. Para o concerto de estreia da jovem orquestra, a primeira nascida em uma favela, ele não pensou duas vezes: seria com a Sinfonia no.2 de Mahler, “Ressurreição”.

 

 


Ainda que das nove sinfonias a segunda seja uma das mais acessíveis, a obra mahleriana é sempre um degrau acima. “Foi um gesto ousado, mas, ao ouvi-los trabalhando, vi que a peça poderia abrir um universo de possibilidades”, diz Karabtchevsky, desde então regente da orquestra e diretor artístico do Instituto Baccarelli.

 




Crianças e jovens

Depois de estrear na Sala Minas Gerais em maio passado, a Sinfônica Heliópolis retorna para novo concerto no mesmo espaço, agora sob a batuta de Karabtchevsky. A apresentação, gratuita, será neste domingo (13/10). Haverá transmissão pelo canal do YouTube do Instituto Baccarelli.

 


A organização social foi fundada em 1996 pelo maestro Silvio Baccarelli (1931-2019) e, desde então, promove um trabalho sociocultural com crianças e jovens em situação de vulnerabilidade em Heliópolis.

 


“Eu tinha algumas dúvidas sobre o processo. Hoje, vejo que não. A música é um fator de consolidação do caráter, ela traz à tona coisas que estavam escondidas. É um trabalho gratificante”, diz o maestro. O trabalho desenvolvido na orquestra é de formação. De uma maneira geral, os musicistas ficam até dois anos na Sinfônica Heliópolis.

 


“Não há uma orquestra no Brasil que não tenha elementos que vieram de Heliópolis”, afirma Karabtchevsky. Só na Filarmônica de Minas Gerais são nove, a maior parte com muitos anos de casa: Neto Belloto, Marcos Lemes e Walace Mariano (contrabaixos), Marcus Julius Lander (clarinete), Renata Xavier (flauta), Fabio Ogata (trompa), Victor Morais (fagote), Wagner Oliveira (violino) e Daniel Mendes (viola).

 

"Mudança formidável"


Trabalhar com musicistas jovens depois de passar anos à frente (1988 a 2010) de orquestras e instituições europeias – a Tonkünstler, em Viena; o Teatro La Fenice de Veneza; e, por último, a Orchestre National des Pays de La Loire, na França – foi, e ainda é, nas palavras de Karabtchevsky, “uma mudança formidável, uma coda a todo o trabalho que vinha desenvolvendo no exterior”.

 


Paralelamente à Heliópolis, o maestro também está à frente da Petrobras Sinfônica. Com ela, voltou recentemente de uma turnê sul-americana. “O concerto mais importante foi há um mês e meio, no Teatro Colón (em Buenos Aires), onde o público aplaudiu a orquestra de pé”, conta.

 


É sempre um motivo de alegria ter Karabtchevsky em Belo Horizonte, quanto mais nesta altura da vida. Ele completa 90 anos em 27 de dezembro. “Maestro é como vinho. Me sinto não só em plena posse dos meus recursos mentais quanto físicos”, diz ele, cuja relação com a capital mineira teve início ainda na década de 1950.

 


Era um jovem paulistano de 23 anos quando chegou a BH. Depois de estudar na Escola Livre de Música de São Paulo com o alemão Hans-Joachim Koellreutter, ele, Carlos Alberto Pinto Fonseca e Carlos Eduardo Prates aproveitaram as férias e vieram à cidade.

 


Madrigal Renascentista

Queriam trabalhar com música renascentista. Do encontro desses músicos acabou nascendo o Madrigal Renascentista, que estreou na Sociedade Mineira dos Engenheiros, em 1956. A noite marcaria ainda a estreia de Karabtchevsky como regente.

 


“Foi um dos momentos mais belos da minha vida, pois consegui moldar um grupo de jovens. O Madrigal chegou a cantar Debussy, Ravel, não afunilou em direção a um determinado estilo, na verdade, multiplicou suas formas de expressão.”

 


O maestro voltaria inúmeras vezes à cidade. Foi o regente do concerto que, em março de 1971, inaugurou o Palácio das Artes. Regeu o oratório “O Messias”, de Haendel, com a Orquestra Sinfônica Nacional da Rádio Ministério da Educação e Cultura e o Coro da Associação de Canto Coral, ambos do Rio de Janeiro.

 


“Foi graças ao meu amigo Pery Rocha França, um dos construtores de Brasília. Nessa época, eu estava em um movimento de vai e vem, então surgiram várias oportunidades. Constantemente, eu tinha que dar saltos mortais em direção a várias regiões”, comenta.

 


ORQUESTRA SINFÔNICA HELIÓPOLIS
Concerto no próximo domingo (13/10), às 11h, na Sala Minas Gerais, Rua Tenente Brito Melo, 1.090, Barro Preto. Entrada franca. Ingressos devem ser retirados na bilheteria ou no site da Filarmônica. Limitados a seis por pessoa. O concerto será transmitido pelo canal do YouTube do Instituto Baccarelli.

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