Francisco de Assis Pereira cumpre pena de 285 anos pelo assassinato de sete mulheres – ao todo, ele matou 10. Os crimes ocorreram no Parque do Estado, em São Paulo, onde os corpos foram encontrados em julho de 1998.
Na época da condenação, a legislação previa que o tempo de cumprimento de pena não poderia superar 30 anos. No caso de Assis, condenado por homicídio, estupro e ocultação de cadáver, esse período termina em 2028.
Um crime hediondo será sempre um crime hediondo, independentemente da época em que foi cometido. O que pode mudar é a forma de olhar para o ocorrido. E é a isso que se propõe o longa ficcional “Maníaco do Parque”, de Maurício Eça, disponível no Prime Video – em vez de se concentrar no serial killer, dar voz às vítimas.
É uma opção válida e totalmente coerente com os tempos que correm. Mas as boas intenções terminam ali. O longa de Eça (que dirigiu as três histórias que ficcionalizam o caso Richthofen, também do Prime) é uma coleção de clichês e costuras mal feitas em ritmo de videoclipe (ao som de Ramones, Sepultura, Charlie Brown Jr.).
O que se salva é o próprio Maníaco – no caso, o ator Silvero Pessoa, que consegue, principalmente por meio do olhar, dar o tom certo da psicopatia do personagem.
Com roteiro de L.G. Bayão, a trama acompanha, em paralelo, dois personagens. Francisco é um motoboy querido pelo chefe (o rapper Xamã, que não faz feio para as câmeras e é o intérprete da música-tema, “Where did you sleep last night”) e pelos colegas do Ibirapuera, onde é conhecido como Chico Estrela, o melhor e mais veloz dos patinadores.
Vítimas enganadas
Essa figura carismática se transforma completamente quando encontra uma nova vítima, jovens enganadas por ele com a conversa furada de fotos para um comercial.
A outra protagonista é Giovanna Grigio, que, depois de “Chiquititas”, “Malhação” e “Rebelde”, embarca em uma personagem mais densa – e sua interpretação tem a densidade de um pires. Ela é a novata no jornal “Notícias Populares” Elena Pellegrino (personagem inventada), que tenta uma chance no ambiente misógino da redação.
E dá-lhe estereótipos: todos em seu caminho são homens brancos, fumantes, preconceituosos: o chefe (Marco Pigossi), o repórter veterano (Bruno Garcia), que insinua que ela pode ser sua assistente, o delegado (Augusto Madeira). O único bacana do local é o fotógrafo vivido por Christian Malheiros, que está ali única e exclusivamente para fazer as vontades de Elena.
Mapa de investigação
Fosse isso (tudo), ainda daria para passar. Mas a trama vai piorando, colocando Elena em crise com a profissão; “aprendendo” com a irmã, a psicanalista chique Marta (Mel Lisboa), como identificar um serial killer em cinco minutos (ele é inteligente, frio, sem empatia, gosta de esportes); fazendo biquinho porque não quer falar dos problemas que teve com o pai recém-falecido; criando o obrigatório mapa de investigação na parede, que depois ela destruirá de forma risível.
Até o confronto entre a repórter e o assassino é cheio de falas e tons errados, o que mina a intenção do filme em dar voz às vítimas. Fosse bem realizado, “Maníaco do Parque” poderia se destacar em meio às produções de true crime que inundam as plataformas. O que ele realizou foi um desacerto total, além de um desserviço ao jornalismo.
“MANÍACO DO PARQUE”
(Brasil, 2024, 98 min.) Direção: Maurício Eça. Com Silvero Pereira e Giovanna Grigio. O filme está disponível no Prime Video.
LIVRO, SÉRIE E PODCAST
O Maníaco do Parque voltou à ordem do dia. Em setembro, foi lançado o livro “Francisco de Assis, o Maníaco do Parque” (Matrix), do jornalista Ulisses Campbell. Na semana passada, o Prime Video lançou o longa “Maníaco do Parque”. Em 1º de novembro, estreia na mesma plataforma a minissérie documental “Maníaco do Parque: A história não contada”, de Thaís Nunes, e o podcast “Maníaco do Parque – Um serial killer entre nós”.