A sequência do filme Gladiador, Gladiador 2, lançada na sexta-feira (22/11) e estrelada por Paul Mescal e Denzel Washington, tem sido criticada por suas imprecisões históricas. A BBC consultou especialistas em história romana para separar fatos de ficção.
Um deles é Alexander Mariotti, que foi o consultor histórico da produção. Ou seja, seu trabalho era aconselhar o diretor Ridley Scott quando o roteiro se desviava dos registros históricos.
Atenção: este texto contém spoilers de Gladiador 2 a seguir.
Scott já deixou claro que não se importa se seus filmes são historicamente imprecisos, mesmo quando baseados em pessoas e eventos reais. Em 2023, após o historiador Dan Snow apontar várias imprecisões no filme Napoleão, Scott disse que Snow deveria "arranjar o que fazer".
Mas Mariotti, que também é historiador e uma das principais autoridades em gladiadores, combates e armamentos, sabia aonde estava entrando.
"Desde o início, eu disse a eles: 'Olha, eu sei que não estamos aqui para fazer um documentário.' Sei que estamos aqui para fazer filmes e entreter", disse Mariotti à BBC.
Isso não impediu os especialistas de apontar imprecisões. Quando o primeiro trailer de Gladiador 2 foi lançado em julho deste ano, historiadores notaram diversas falhas: que a arquitetura estava errada, que os romanos não tinham jornais para ler e que eles não se encontravam em cafés.
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O enredo de Gladiador 2 gira em torno de Lúcio (Paul Mescal) — filho de Lucilla (Connie Nielsen) e Máximus (Russell Crowe) — que, quando criança, foi forçado a deixar Roma. Vinte anos após a morte de seu pai, soldados romanos invadem sua cidade natal na Numídia, matam sua esposa e o escravizam.
Após ser comprado por Macrinus (Denzel Washington), Lúcio é transformado em gladiador. Enquanto luta para sobreviver, enfrentando animais, navios e outros gladiadores no Coliseu, Macrinus planeja derrubar os jovens imperadores Caracalla (Fred Hechinger) e Geta (Joseph Quinn) para se tornar o governante de Roma.
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Mariotti aponta que, se o filme fosse estritamente preciso, a palavra Coliseu nem seria mencionada. Seu nome original era Anfiteatro Flaviano, em homenagem à dinastia que governava quando o edifício foi construído. As pessoas só começaram a chamá-lo de Coliseu séculos depois, por volta do ano 1000 d.C.
A principal razão pela qual Mariotti não se preocupa com esses erros é o impacto que um filme como Gladiador 2 tem sobre os espectadores e o turismo.
"O mundo acadêmico é muito esnobe em relação ao cinema", diz Mariotti. "Fico perplexo com isso, porque, nos últimos 20 anos, Gladiador teve um impacto enorme. Antes do filme, você podia entrar no Coliseu de graça. No ano seguinte, as pessoas vieram em massa."
Embora Gladiador 2 tenha muitas imprecisões históricas, algumas partes são baseadas em fatos.
Pouco depois de ser capturado, Lúcio precisa sobreviver a um ataque de babuínos. Mais tarde, ao chegar ao Coliseu, ele e outros gladiadores enfrentam um rinoceronte. Embora se acredite que babuínos e rinocerontes foram levados ao Coliseu para serem exibidos aos romanos, eles não lutavam contra gladiadores.
Em vez disso, os gladiadores enfrentavam leões, panteras e elefantes. Um rinoceronte teria estado presente na inauguração do Coliseu em 80 d.C., onde lutou contra um touro, um urso, um búfalo, um leão e um bisão.
"Eles traziam animais exóticos de todo o império para lutar", explica Paul Belonick, professor da UC Law SF e autor de um livro sobre a república romana. No entanto, não há registros de soldados romanos montando um rinoceronte.
Quando o imperador Tito organizou 100 dias de jogos no Coliseu para marcar sua abertura, Belonick estima que cerca de 10 mil animais foram mortos em poucos dias.
"Eles eram mortos das formas mais criativas possíveis. As pessoas arremessavam lanças, usavam redes, e os arqueiros eram muito populares. Era como assistir a um atirador de elite. Eles faziam pequenos cervos correrem, e o arqueiro abatia os animais de um ponto específico, enquanto o público aplaudia."
Às vezes, os espectadores se entristeciam com a morte de animais. O historiador romano Dio escreveu sobre o público lamentar enquanto elefantes eram mortos. Ele relatou que os animais "foram piedosamente olhados pelas pessoas, quando, feridos e incapazes de lutar, andavam com suas trombas erguidas para o céu".
Entretenimento acima da precisão
A maior sequência de ação de Gladiador 2, quando Lúcio e outros gladiadores participam de uma encenação de uma batalha naval, também é a maior deturpação histórica do filme.
Na realidade, essas batalhas, chamadas naumaquias, usavam pouca água e navios com fundos planos para facilitar o movimento. Além disso, a última naumaquia no Coliseu teria ocorrido em 89 d.C., mais de 100 anos antes dos eventos do filme.
"O que Ridley faz não é diferente de Shakespeare ou Michelangelo. É usar a História para contar uma história e nos ensinar uma lição", diz Alexander Mariotti.
Embora as lutas de gladiadores no filme sejam emocionantes, elas são, em grande parte, imprecisas. Cerca de 40% dos gladiadores eram pessoas livres que se tornavam gladiadores para ganhar dinheiro, e as lutas raramente terminavam em morte, sendo mais comparáveis a lutas de UFC.
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Médicos prestigiados, como Galeno, cuidavam dos feridos, e havia árbitros para garantir o controle.
Personagens como Caracalla e Geta também existiram, mas suas histórias foram dramatizadas. Caracalla assassinou Geta e foi assassinado por um soldado recrutado por Macrinus.
Com o roteiro de Gladiador 3 já em andamento, Ridley Scott parece continuar usando histórias reais como inspiração para entreter.
Para Mariotti, isso não é um problema por refletir o que artistas sempre fizeram: usar a história para nos conectar aos nossos antepassados e explorar nossas próprias narrativas.
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