Durante os 15 anos em que lecionou em colégios particulares, o escritor e atual professor do curso de Letras da Universidade Federal de Alfenas (Unifal-MG) Eloésio Paulo nunca entendeu como ninguém havia criado um panorama conciso das principais obras da literatura brasileira, contextualizando as histórias dos romances e os estilos de cada autor.
“Incomodava-me ter que falar de livros que eu não tinha lido, especialmente romances, porque, no caso da poesia, conseguimos ler um ou outro poema significativo. Mas, quando se trata de romances, acredito que nenhum professor consegue ler todos, por diversos motivos”, afirma Eloésio.
Esse desconforto serviu como base para o livro “201 romances brasileiros em 5 minutos cada”, que Eloésio lança agora pela Sic Edições. No próximo dia 17, o autor estará em Belo Horizonte, para o lançamento presencial, na Livraria do Belas.
Com apresentação de Luiz Ruffato, “201 Romances Brasileiros…” traz pequenas crônicas sobre obras seminais da literatura nacional, que vão desde 1843, com “O filho do pescador”, de Teixeira e Sousa, até 1999, com “Sexo”, de André Sant’Anna.
Comentários críticos
Em textos breves, o autor resume as obras e faz comentários críticos. Grande parte deles foram publicados na revista Pessoa, na qual Eloésio foi colunista. “Eu tinha um limite de 2.599 caracteres por texto. Então comecei a escrever sobre livros brasileiros. Quando percebi, já tinha escrito 150 resenhas”, diz.
“Escrevi mais até chegar a 200, com o compromisso de abordar obras que abrangem os séculos 19 e 20. Achei que esse número e este recorte temporal seriam razoáveis”, comenta o escritor.
Conforme escreve Ruffato na apresentação, Eloésio não hesita em confrontar clássicos da literatura. Sobre “Bom-Crioulo”, de Adolfo Caminha, ele afirma que “as tintas naturalistas do romance são muito fracas e acabam ainda mais desbotadas por uma adjetivação abundante”. Além disso, considera que o romance de Caminha “está longe de ser comparável a ‘O mulato’, a primeira incursão de Aluísio Azevedo no Naturalismo”.
“A tese determinista comparece ao romance de Caminha de modo fortuito, em passagens como a que descreve Carolina como ‘vaca do campo extraordinariamente excitada, que se atira ao macho antes que ele prepare o bote…’ Ora, ninguém jamais viu um touro dando bote!”, escreve.
“Livro fraco”
Sobre “O guarani”, de José de Alencar, Eloésio afirma que, “não fosse a exasperante prolixidade do escritor, (o romance) teria tudo para agradar, por exemplo, aos leitores compulsivos das aventuras de Harry Potter”. E, ao comentar “Capitães da areia”, de Jorge Amado, avalia que, mesmo com pontos altos, “é um livro fraco”, em que “a linguagem muitas vezes peca por prolixidade, e falta um mínimo de rigor na estruturação dos personagens e do próprio enredo”.
Em relação a “Quarto de despejo – Diário de uma favelada”, de Carolina Maria de Jesus, Eloésio reconhece a importância da obra como depoimento e denúncia, mas não atribui grande valor artístico a ela. “Não há nada que justifique equipará-la aos melhores títulos da ficção brasileira”, avalia. Para ele, “ler ‘Quarto de despejo’ com viés ideológico, como se tem tornado habitual, prejudica a valorização objetiva de suas qualidades”.
Nem tudo é desaprovado por Eloésio, contudo. Ao escrever sobre “A lua vem da Ásia”, de Campos de Carvalho – um romance narrado por um paciente com transtorno mental que acredita estar sendo sequestrado pela polícia dos EUA –, Eloésio destaca a inovação trazida à literatura brasileira: “Primor de sarcasmo, a novela não pretende fazer nenhuma sociologia do hospício, mas usar o discurso da loucura como instrumento para denunciar a farsa da razão”.
Eloésio também elogia “São Bernardo”, de Graciliano Ramos, que considera primoroso tanto no estilo quanto na estrutura narrativa. Segundo ele, o ritmo vertiginoso nos primeiros capítulos corresponde ao andamento agressivo da acumulação capitalista personificada por Paulo Honório.
“A paixão segundo G.H.”, de Clarice Lispector, é outro romance que agrada ao escritor. “O livro contém dezenas de expressões situadas no limite entre o poético e a filosofia. Qualquer delas seria matéria suficiente para uma densa tese de doutoramento. A profundidade de Clarice é, de propósito, desconcertante. Clarice não é para qualquer um, ao contrário do que faz supor sua enganosa popularidade na internet”, escreve.
Como não poderia deixar de ser, em um panorama da literatura brasileira, Eloésio também aborda obras de Machado de Assis, como “Ressurreição”, “A mão e a luva”, “Quincas Borba”, “Esaú e Jacó”, “Memorial de Aires” e, claro, “Dom Casmurro” e “Memórias póstumas de Brás Cubas”, fazendo do Bruxo do Cosme Velho o autor mais comentado no livro.
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“201 romances brasileiros em 5 minutos cada” é boa opção para quem quiser se familiarizar com a literatura nacional. Contudo, a leitura do livro não substitui o contato direto com as obras ali resenhadas – algo que nunca foi a proposta do autor. Trata-se apenas de uma bela vitrine para obras importantes.
“201 ROMANCES BRASILEIROS EM 5 MINUTOS CADA”
Autor: Eloésio Paulo
Sic Edições (258 págs.)
R$ 70