Se no longa “O Rei Leão” temos um roteiro profundo, frequentemente comparado a “Hamlet”, “Mufasa: O Rei Leão”, live-action que estreia nesta quinta-feira (19/12), apresenta algo menos nobre. A direção é de Barry Jenkins, o cineasta de “Moonlight: Sob a luz do luar”, vencedor do Oscar de Melhor Filme em 2017. Ao narrar a história do personagem-título, Jenkins acaba por explorar com mais profundidade Scar, o antagonista de Mufasa.
Os dois leões são irmãos adotivos. Quem conduz a narrativa é o sábio macaco Rafiki, presença recorrente na franquia. Rafiki volta ao passado, contando a história da dupla à jovem Kiara, filha de Nala e do famoso Simba, o herdeiro de Mufasa fustigado pelo “tio” Scar.
Mufasa teve a infância tranquila interrompida por inesperada tempestade. Levado pela forte correnteza, o exausto e assustado leãozinho, futuro pai de Simba, segue o fluxo do rio, quase é devorado por crocodilos e acaba salvo pelo jovem Taka, que depois será conhecido como Scar.
Na esperança de que os pais o adotem, Taka (Scar) leva Mufasa para sua alcateia. Porém, há uma condição imposta pelo rei: Mufasa deve vencer Taka em uma corrida. Caso contrário, será devorado por leões.
Embora Taka lidere durante grande parte do percurso, ele cede a vitória ao amigo na reta final, salvando-o pela segunda vez no mesmo dia. A partir daí, os dois se tornam companheiros unidos, apesar das tentativas do rei para separá-los.
Nessa nova família, Mufasa reencontra a paz. Aprende a caçar com a mãe adotiva e não enfrenta grandes adversidades, até que leões brancos forasteiros atacam a alcateia, exterminando todos, exceto os dois irmãos, que conseguem fugir.
Durante a fuga, a dupla encontra Sarabi, que também perdeu a família em ataque de leões brancos, e Rafiki, recém-expulso de seu bando por causa de crenças místicas.
O quarteto inicia dupla jornada: foge dos leões brancos, enquanto busca a “terra prometida”, uma espécie de paraíso. Nessa trajetória, a relação entre Mufasa e Taka (Scar) se aprofunda. Enquanto Mufasa se mostra corajoso, humilde e leal, Taka se revela inseguro e orgulhoso, moldado para assumir o lugar do pai como rei.
A prepotência de Taka se desfaz ao lado do amigo, a quem confia seus segredos. Durante a caminhada, ele se apaixona por Sarabi e desabafa com o irmão, que tenta aconselhá-lo. Contudo, é Mufasa quem conquista a leoa.
Tomado pelo ressentimento, Taka (Scar) abandona o bando e se alia aos leões brancos, planejando se vingar de Mufasa e Sarabi. No entanto, acaba se arrependendo. Volta para ajudar o irmão adotivo e ganha a célebre cicatriz no olho.
Taka é o personagem mais completo e complexo do filme. Ao longo de quase duas horas, suas nuances são exploradas em detalhes. Não se trata de um vilão motivado apenas pela maldade. O futuro Scar é fruto da combinação de fatores que o tornaram amargurado e infeliz – sentimentos compreensíveis, de certa forma.
“Você roubou o meu destino”, diz Taka – não sem razão – a Mufasa, em determinado momento.
Por outro lado, Mufasa é o típico herói idealizado: corajoso, sábio, forte e humilde. Arquétipo um tanto previsível da perfeição, ele não tem ambição, nunca erra (todas suas teorias, suposições e estratégias dão certo), além de relutar em ser rei quando todos querem coroá-lo, modéstia que soa forçada.
Resumindo: Mufasa tem medo de sonhar, diz Rafiki. Apesar dessa trivialidade, o personagem não compromete a trama. O novo filme consegue entreter adultos e crianças com as excelentes canções de Lin-Manuel Miranda (responsável pelas trilhas sonoras de “Moana” e “Encanto”), além do humor na medida certa.
Ironia e bom humor
Timão e Pumba, companheiros de Rafiki, funcionam como alívio cômico, brincando com as curtas aparições na tela destinadas à dupla. Também fazem comentários irônicos sobre o bem-sucedido “O Rei Leão”, que teve a maior bilheteria entre as produções do gênero.
O processo de exploração e domínio imposto pelos leões brancos funciona como metáfora da colonização ocorrida no continente negro africano, cenário da trama. Já a “terra prometida” que Mufasa, Sarabi e Rafiki procuram remete ao pós-vida, simbolizando o reencontro com os ancestrais.
No Brasil, a cantora Iza e o ator Ícaro Silva voltam a dublar Nala e Simba, como ocorreu em “O Rei Leão” (2019). Pedro Caetano e Lorenzo Tarantelli dividem as vozes de Mufasa na fase adulta e quando criança, respectivamente. Coube a Hipólyto e João Victor Granja dublar Taka, o futuro vilão Scar.
“MUFASA: O REI LEÃO”
EUA, 2024, 118 min. De Barry Jenkins. Com as vozes de Pedro Caetano, Lorenzo Tarantelli, Hipólyto, João Victor Granja e Iza. Em cartaz nos shoppings BH, Big, Boulevard, Cidade, Contagem, Del Rey, Diamond, Estação, Itaú, Minas, Monte Carmo, Norte, Partage, Pátio, Ponteio e Via, além do Centro Cultural Unimed-BH Minas.