O vocalista Yomar Asogbá, a soprano convidada Irma Ferreira, o percussionista Iuri Passos e a cantora Luciana Baraúna serão acompanhados por outros nove músicos no show de hoje em BH -  (crédito: Israel de Fagundes/Divulgação)

O vocalista Yomar Asogbá, a soprano convidada Irma Ferreira, o percussionista Iuri Passos e a cantora Luciana Baraúna serão acompanhados por outros nove músicos no show de hoje em BH

crédito: Israel de Fagundes/Divulgação

 


A música sacra afro-brasileira ocupa neste sábado (4/1) o Teatro I do CCBB-BH, onde o público poderá conferir os cantos entoados para os orixás pelo grupo Ofá, de Salvador, no show “Obatalá: Uma conexão Salvador-África-Brasil”.

 


Tendo à frente Iuri Passos (diretor musical e percussão), Yomar Asogbá (voz e percussão) e Luciana Baraúna (voz), o Ofá conta, ainda, com outros nove instrumentistas e cantores, em sua maioria integrantes do Terreiro do Gantois, um dos mais tradicionais da capital baiana, fundado em 1849 por Maria Júlia da Conceição Nazareth (1800-1910).

 


A formação, que funde instrumentos percussivos com baixo, guitarra e piano, vai contar com a participação especial da soprano Irma Ferreira. O roteiro da apresentação repassa o repertório dos três álbuns do grupo: “Odum Orim: Festa da música de candomblé” (2001), “Obatalá – Homenagem a Mãe Carmem” (2019) e “Ìyá àgbà sirê – O poder do sagrado feminino” (2024).

 


Os dois últimos contaram com a participação de grandes nomes da MPB, como Alcione, Gal Costa, Gilberto Gil, Milton Nascimento, Jorge Ben Jor, Margareth Menezes, Marisa Monte, Mateus Aleluia e Zeca Pagodinho, entre outros.

 


Iuri Passos destaca que o álbum de estreia é mais calcado na tradição, com adaptações de músicas do candomblé, e que o segundo e o terceiro já incorporam composições dos integrantes do grupo e novos elementos harmônicos e melódicos, que se somam ao toque dos atabaques. No show que chega a BH, o Ofá executa pela primeira vez algumas canções da MPB, como “Emoriô” (Gilberto Gil / João Donato) e “Milagres do povo” (Caetano Veloso).

 


“Fazemos uma releitura dos nossos três álbuns e também cantamos algumas músicas em português, para aproximar novos ouvintes, porque 80% do nosso repertório é em iorubá, pautado pela música tradicional do candomblé. Incluímos obras de outros compositores, mas pensando em músicas que têm a ver, que trazem essa temática do povo negro e da ancestralidade. Nós experimentamos também, indo além das harmonias do terreiro, na busca pelo espaço da nossa música negra e popular”, diz.

 


Passos observa que tanto “Obatalá – Homenagem a Mãe Carmem” quanto “Ìyá àgbà sirê – O poder do sagrado feminino” mantêm a força da percussão ancestral, da forma como os músicos tocam no Terreiro do Gantois, mas se abrem a outras influências, da música popular e da erudita. Ele diz que a inclusão da lavra alheia, de estrelas da MPB, no roteiro do show se alinha com o desejo de ampliar a audiência e diminuir a distância e a intolerância religiosa que ainda persistem.

 


“A justificativa para tocar músicas de outros compositores é que muitos deles são frequentadores do Gantois, tanto Gil, que é praticamente da casa, quanto Caetano. É sempre uma tentativa de chegar àquelas pessoas que não compreendem ou não querem compreender o que estamos cantando. Tivemos a preocupação, nos três álbuns, de fazer a tradução do iorubá para o português, para que as pessoas tenham a possibilidade de aprender, para que cantem e saibam o que estão cantando”, diz.

 


Hiato

O Ofá foi criado entre o fim de 1999 e início de 2000, com uma primeira formação que, além de Yomar Asogbá, trazia Gamo da Paz e Egbomi Delza. A mudança de Gamo para os EUA e a morte de Delza, em 2002, interrompeu os trabalhos do grupo. A retomada ocorreu somente em 2008. Esse período de inatividade explica, em parte, o hiato de 18 anos entre o lançamento do primeiro álbum e o do segundo.

 


“Também viajei para os Estados Unidos, fiquei um pouco distante e voltei para retomar o grupo, junto com Yomar e Luciana Baraúna, fazendo a direção musical, mas gastamos um tempo reorganizando a casa”, conta Passos, que, nascido e criado no Gantois, também é professor de percussão popular na Escola de Música da Universidade Federal da Bahia. “Hoje o grupo é uma das principais referências no cenário nacional da música de terreiro”, diz.

 


Responsável pela produção do álbum de estreia, Flora Gil também somou forças para a realização de “Obatalá – Homenagem a Mãe Carmem”, que presta tributo à atual ialorixá do Gantois, descendente direta de Maria Júlia da Conceição Nazareth e de Maria Escolástica da Conceição Nazareth (1894-1986), a Mãe Menininha, de quem é a filha mais nova. A linha sucessória do Gantois obedece a critérios de hereditariedade, e as dirigentes são sempre do sexo feminino.

 


Em 2020, “Obatalá” recebeu uma indicação ao Grammy Latino na categoria melhor álbum de música de raízes em língua portuguesa. “Somos da música de terreiro, continuamos com nossa raiz, então a mera indicação a um prêmio que é latino, mas tem alcance mundial, é uma grande vitória para um grupo de candomblé, que faz uma música que não é comercial; é de resistência, de luta. Isso nos dá a certeza de que estamos no caminho certo”, afirma Passos.

 


“OBATALÁ: UMA CONEXÃO SALVADOR-ÁFRICA-BRASIL”
Show do grupo Ofá, neste sábado (4/1), às 20h30, no Teatro I do CCBB-BH (Praça da Liberdade, 450, Funcionários). Ingressos gratuitos, disponíveis exclusivamente na bilheteria do CCBB-BH.