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Entenda por que a série "Adolescência" é devastadora e fascinante

Ousada na forma e desafiadora no conteúdo, produção da Netflix desenha um panorama assustador da vida dos jovens e do abismo entre eles e seus pais

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A Netflix erra muito mais do que acerta. Mas quando acerta, dado o domínio do gigante do streaming, o impacto de uma produção é enorme, indo muito além da TV. Hoje, não há assunto mais quente do que “Adolescência”. E mesmo que só estejamos em março, dá para cravar que é a série de 2025.


Estreou há uma semana e, atualmente, ocupa o topo do ranking mundial da plataforma para séries em língua inglesa. Minissérie britânica em quatro episódios, é devastadora e fascinante em igual medida – e por razões diferentes. Parte de um acontecimento que parece tirado de uma página de jornal: um adolescente de 13 anos é acusado de matar uma colega.


Bullying, misoginia, masculinidade tóxica, ausência de diálogo entre pais e filhos e uma existência on-line que determina a vida dos adolescentes (e que é desconhecida de seus progenitores) são os principais temas da narrativa.


A série foi criada pelo ator e produtor Stephen Graham (que interpreta o pai do acusado) e pelo roteirista Jack Thorne e dirigida por Philip Barantini. É uma história ficcional, mas partiu de fatos, no que Graham chamou de “epidemia de crimes de facas entre jovens no país”, com a morte de garotas por garotos que mal haviam saído da infância. Ou seja: tanto criminosos quanto vítimas não estavam física e mentalmente formados.


“Adolescência” é devastadora por mais de um motivo. A história é contada com um realismo impressionante. Seu texto, muito forte e cheio de sutilezas, é interpretado por um elenco espetacular, em que se destacam o já consagrado Graham (uma estrela na Inglaterra, sendo mais conhecido no Brasil pelos filmes “Snatch – Porcos e diamantes” e “O irlandês” e pela série “Boardwalk Empire”) e Owen Cooper, o novato que vive o garoto suspeito do crime.


Família amorosa

Numa cidade qualquer do Norte da Inglaterra, mora uma família de trabalhadores. O pai, Eddie Miller (Graham), sustenta a família como bombeiro hidráulico. Aprendeu com o próprio pai que homens não devem mostrar suas emoções.

Mas não repetiu os erros com os quais foi educado; nunca levantou a mão para os dois filhos, Lisa (Amelie Pease) e o caçula Jamie (Owen Cooper). É casado com sua namorada de colégio, Manda (Christine Tremarco). Resumindo: os Miller são uma família amorosa, ao menos parecem ser.


Mas a história não começa com eles. Numa manhã bem cedo, assistimos a dois detetives, um homem e uma mulher, à espera dentro de um carro. A conversa é comezinha, problemas estomacais. Até que vem o aviso: devem entrar. Com um mandado em mãos, o investigador Luke Bascombe (Ashley Walters) comanda uma batida policial.


Sem pedir licença, eles arrombam a porta, assustando a família Miller, que havia acabado de acordar. Não há tempo para muito. Gritos, quebradeira, até chegar ao quarto do caçula. Jamie é tirado da cama, ouve seus direitos.

Bascombe lhe dá tempo para trocar de roupa: o menino franzino, com cara e corpo de criança, havia urinado nas calças. Ele é levado para a delegacia, como é menor, tem direito a um adulto o acompanhando. Escolhe o pai.


A produção é tão fora da curva que, já ao final do primeiro episódio, o telespectador fica sabendo se Jamie é culpado ou não. Na verdade, a discussão é muito mais profunda – por todas as questões citadas acima – do que saber “quem matou”.


Planos-sequência

“Adolescência” é fascinante pela maneira como a história é contada. Os quatro episódios foram filmados em planos-sequência. Não há nenhum corte. Em tempo real, os episódios foram, em sua maioria, rodados em locações (a delegacia é estúdio, por exemplo). E são ambientados em tempos diferentes.


A partir do primeiro, com a prisão de Jamie, a história pula para alguns dias mais tarde, com os investigadores indo atrás de respostas na escola dele e da vítima, Katie (Emilia Holliday). O terceiro, o mais tenso, foi rodado dentro de um centro de detenção, e mostra o garoto numa sessão com uma terapeuta. E o quarto acompanha a família Miller no dia do aniversário de 50 anos de Eddie.


Para que a tomada única funcionasse, antes de rodar, a equipe – técnicos e atores – passou uma semana ensaiando cada um dos episódios. “Sem querer parecer pretensioso, é o casamento entre teatro e TV”, disse Graham ao “Hollywood Reporter”. “Tecnicamente, é uma peça, mas estamos atuando para a câmera. (Nos ensaios) Passamos por cada momento, pedaço por pedaço. Dissecamos o roteiro.”


O segundo episódio foi rodado em uma escola pública real, com os próprios alunos como figurantes. Diretor de fotografia da série, Matthew Lewis falou do processo para a “Variety”. “Foi um pesadelo absoluto. Cada professor era um assistente de direção. Quando a câmera não estava apontada para eles, eles estavam conduzindo pessoas. Da perspectiva da multidão, foi muito ambicioso, mas as crianças estavam dispostas a fazer funcionar.”


Mesmo com tantas expertises, “Adolescência” não seria o que é, não fosse a presença de Owen Cooper, o intérprete de Jamie. Tinha 14 anos (hoje tem 15) quando filmou a série. Nunca havia atuado em frente a uma câmera. Garoto de Warrington, cidade industrial na região de Liverpool que sonhava em ser jogador de futebol, mudou de ideia, começou um curso de atores por hobby e entrou para uma pequena agência. Foi selecionado entre muitos.

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"Atores treinam por anos e anos e não conseguem realmente dominar o que Owen fez", afirmou o diretor Barantini à “Variety”. Na mesma entrevista, Owen completou: “Eu não estava realmente preocupado com tudo. Estava apenas tentando impressionar todo mundo. Eu simplesmente fiz.”


“ADOLESCÊNCIA”
• A minissérie, em quatro episódios, está disponível na Netflix

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