Peço licença aos solteiros, mas não há escapatória: o amor entre casais está na ordem do dia e, em homenagem ao Dia dos Namorados, que será celebrado nesta quarta-feira, chefs dão a receita de seus encontros amorosos vividos dentro e fora da cozinha. A analogia é inevitável, portanto, eles destacam os ingredientes que apimentam e garantem sabor para a relação e a atenção que precisam ter com as medidas exatas de sal, açúcar e especiarias para que ela não desande.
Acredite ou não em amor à primeira vista, entre os chefs Pedro Paulo e Carolina Elias, do Casa Riuga, ele nasceu quase de imediato, levou meros cinco dias trabalhando juntos em um restaurante em São Paulo. Não se conheciam. Ele paulista e ela mineira. Ele era o ser superior na cozinha e simplesmente aconteceu. A tal da mágica. O cupido. O destino...
Pedro e Carol trabalharam por um tempo juntos, depois ela mudou de cozinha. Em seguida, voltaram a se encontrar no restaurante em que ela estava e, sem se desgrudarem, passaram pela prova de fogo ao unir o profissional com o pessoal.
Assim nasceu o Casa Riuga, em BH, uma história que está sendo construída a partir do amor entre eles e pela gastronomia, duas paixões. O relacionamento tem dois anos e o negócio quase um. “Foi tudo rápido. A Carol foi estudar na Le Cordon Bleu São Paulo e foi estagiar no restaurante em que eu era chef. E aconteceu, a partir do quinto dia. Nunca mais deixamos de estar juntos e trabalhar na companhia um do outro”, conta Pedro.
O estar junto o tempo todo requer atenção e amor, não quer dizer sem atritos. E os dois confessam buscar o equilíbrio. Para Carol, a parte boa “é a intimidade, o nosso pensamento parecido independentemente de concordar e discordar, funcionamos bem.” Mas, claro, o relacionamento exige muito dos dois: “O mais desafiador é não trabalhar quando voltamos para casa. Estamos o tempo todo juntos, vivendo o dia a dia do Riuga, então, estamos em processo de descobrir como separar os dois mundos.”
Pedro tem uma frase que quer muito transformar: “Repito que trabalho com minha namorada e moro com a sócia.” Eles querem inverter isso. Carol destaca que, unidos pela gastronomia, ela e Pedro, apesar de pensarem parecido, têm gostos diferentes e preservam suas individualidades. O que para ele é uma ótima receita para tudo funcionar. “Cada um busca o seu momento, é o que estamos construindo”, destaca Carol.
Jiu-jitsu e ioga
Para Pedro e Carol, o que tem funcionado é tempo para o lazer dentro da rotina pesada do almoço até o jantar. Assim, o domingo foi eleito como o dia do casal. E também para a prática de seus hobbies, um momento a sós, espaço para cada um. Ele vai para o jiu-jitsu e, ela, para a ioga.
Mas Pedro destaca que estar sempre por perto no trabalho reforça a relação amorosa: “Pensamos igual e o fato de sermos um casal nos obriga e nos põe contra a parede para acertar o que houver de atrito no trabalho, e rápido. Se algo está errado, paramos, fazemos um café, tomamos a decisão do que deve de ser feito na hora. Alinhamos para não levarmos problemas para casa, para não afetar o planejamento do negócio e preservar nosso relacionamento.”
Carol conta que, ao lidarem com empregadores diferentes e em cargos distintos, constataram que trabalhavam bem juntos, preservando o amor, e decidiram abrir o próprio negócio. Deixaram São Paulo e abriram em BH o Casa Riuga, expressão dinamarquesa (a original é ‘hygge’) utilizada para momentos que exalam sentimentos de aconchego, conforto, calma e bem-estar, ao lado de pessoas que se ama. Nada mais representativo do sentimento que surge ao prepararem juntos o alimento. É o que fazem.
Delivery com carinho
O Casa Riuga é um restaurante que, por enquanto, funciona apenas em formato de delivery. O foco são pratos queridos dos brasileiros, com o toque especial dos chefs. Entre eles, o estrogonofe de filé, o mais pedido em BH, com destaque para o frango com salada de batatas, outro sucesso preparado com a sobrecoxa de frango marinada por 24 horas, glaceada com mel e páprica e assada até ficar dourada e crocante. A proposta, até chegar ao sonho da casa física, é proporcionar “um almoço extraordinário para dias ordinários”, para que os clientes não caiam na armadilha da refeição rápida e funcional no cotidiano. É possível ter uma experiência de cuidado, qualidade e sabor no dia a dia.
“Fizemos o teste drive, deu certo e bateu a vontade de voltar para BH. No início, a rotina foi bagunçada, mas agora temos ajustado”, lembra Carol. “Restaurante é algo desafiador, então, iniciamos com o delivery, menos arriscado, faremos uma base de clientes. Em São Paulo, conhecíamos gente, fornecedores, rede de amigos e em BH estamos começando”, conta Pedro.
Os planos já estão no papel para se concretizarem na hora certa: “O ponto físico virá, é o nosso sonho e está em andamento. Temos clientes fiéis, com alta frequência de retorno, somos reconhecidos pelo atendimento carinhoso e queremos prestar este serviço na presença do cliente”, diz Carol. Para Pedro, o belo-horizontino é receptivo, o feedback é positivo e ele gosta de atenção. “Então, o atendimento do Casa Riuga é mais próximo, tornando menos impessoal a plataforma do delivery, da venda por aplicativo, o que tem conquistado a todos”, destaca o chef.
No olho do furacão
Imagina o preparo de um casamento para 450 pessoas, em Tiradentes, todo feito na cozinha de um restaurante em BH, com dois chefs responsáveis pelo evento, um deles chegando ao novo emprego no olho do furacão. Uma semana imersos dentro da cozinha para fazer acontecer. Assim foi o encontro de Felipe Galastro e Ana Gabriela Costa, no Trindade, do chef Felipe Rameh.
O casal está junto há quase uma década. “É difícil apontar uma data porque naquela época trabalhávamos até 20 horas por dia”, ela diz. Ele completa: “Trabalhava no Trindade e, quando a Ana chegou, estávamos preparando esse casamento conciliando com o restaurante. Foi uma semana de turno e contraturno, produção intensa, pesada, difícil, montando vários pratos legais. Por ironia do destino, foi nos preparativos para uma celebração do amor, da união de duas pessoas que tivemos nosso primeiro encontro.”
Ao longo desses anos, Ana e Felipe estiveram juntos em várias cozinhas. Fizeram projetos separados, mas sempre se reencontrando profissionalmente: “Percebemos que nossas experiências e habilidades individuais se somam quando levantamos um projeto em parceria. Foi aí que começamos a contar um com o outro e, automaticamente, nos tornamos também uma dupla profissional”, ela observa.
Para a chef, a maturidade profissional ensina o casal a lidar com as dificuldades de relacionamento no mundo da gastronomia, em meio a tanta tensão nas cozinhas: “É um desafio para qualquer cozinheiro separar a vida profissional da pessoal. Isso faz parte do nosso desenvolvimento e o equilíbrio emocional é peça-chave.”
Ana conta que ela e Felipe pensam parecido quando se trata de valores, princípios e filosofia de trabalho. Fundamental para que busquem os mesmos objetivos e resultados. Já na gastronomia, ela revela que, com frequência, têm preferências diferentes, por personalidade, gosto e vivências: “Na gestão de cozinha, toda vez em que opinamos de forma diferente, é uma oportunidade de sair do conforto e avaliar outro ponto de vista, podendo sempre melhorar. Mas, no ato de cozinhar, acabam sendo os meus pratos e os pratos do Felipe, com estilos diferentes.”
Projeto em comum
Nesta nova fase, o casal fundou uma consultoria na qual desenvolveu uma metodologia exclusiva, seja para abertura de novos negócios ou para repaginação dos já existentes, com a expertise e know-how dos dois ao longo dos anos. Ana enfatiza que, enfim, encontraram o melhor momento para harmonizar trabalho, relação e vida familiar, com três filhos.
“Não quer dizer que trabalhamos menos, mas administramos melhor o tempo, sem precisar deixar de dar a atenção que as crianças precisam e sem deixar de ter tempo para nós dois. Nem sempre os assuntos são separados, as coisas se misturam às vezes. Mas a organização familiar e a profissional nos permitem identificar quando é necessário um limite.”
Felipe lembra que, desde o encontro no Trindade, nunca deixaram de trabalhar juntos e construir a relação: “Desenvolvemos esta afinidade um pelo outro e dentro da cozinha fomos nos conhecendo melhor, passando muitas horas juntos e acabamos nos unindo. O encontro foi em um período de trabalho intenso, entre dificuldades, vitórias e dissabores, lidando com os desafios de uma profissão intensa, com alto nível de estresse, pressão e cobrança.”
Para Felipe, não é fácil ter os encaixes perfeitos, já que, ao mesmo tempo em que é um pelo outro, eles precisam também se distanciar: “Temos que aprender a lidar com isso dentro de casa e separar o tom da conversa.” Outro desafio é conciliar os horários, que são alternativos e loucos – tem trabalho de madrugada: “Então, nos revezamos ou levamos os filhos para casa dos avós, já que é complicado achar babá à noite. Mas estamos aí, há desentendimentos, mas passageiros e pequenos comparados à profundidade do nosso relacionamento.”
Intimidade faz bem
Segundo o chef, a intimidade traz conexão, sinergia, sintonia, o que faz o casal se desenvolver bem dentro da cozinha e nos momentos particulares: “Conseguimos conversar e discutir no privado ideias profissionais de forma bem legal. A intimidade nos traz companheirismo, o querer o melhor, o um para o outro sempre. Unir o lado profissional e pessoal é mais benéfico do que dificultador.”
Felipe só acha que é necessário encontrar escapes para lidar com o preço cobrado por uma profissão artesanal, de execução mental e física que, muitas vezes, leva ao esgotamento: “Temos nosso dia de folga, quando tentamos não falar nada de trabalho, mas às vezes surge um ‘pensei nisso...’ Mas com a consultoria, conseguimos ter flexibilidade de horário e criar uma rotina para o casal dentro do relacionamento, que envolva um com o outro, refeições juntas, todos à mesa. Valorizamos isso e nos empenhamos em criar esses momentos.”
Na visão dele, os dois se encontram no olhar para a comida, para os ingredientes e, principalmente, onde mais se identificam, na maneira de enxergar as pessoas, na preocupação com a qualidade de vida de todos que participam da cadeia gastronômica: “No fim, trata-se de pessoas, de relações interpessoais. Há opiniões diferentes de vez em quando, mas debatemos até uma decisão comum ou um vai abrir mão do ego, do orgulho, de si mesmo e aplicar e entender que o outro tem razão. Um grande aprendizado de vida.”
Serviço
Casa Riuga (@casa.riuga)
(11) 99814-1869
Ana Gabriela Costa
(31) 98807-0183
Felipe Galastro
(31) 98837-0102