Encontramos em terras mineiras produtos defumados de outros países, feitos exatamente como os originais. Um deles é o provolino affumicato, o autêntico provolone italiano, de leite de búfala. Quem produz é Vincenzo Santaniello, nascido na região da Campânia, no Sul da Itália, o berço da legítima muçarela de búfala. Em 2018, ele chegou a Minas com o sonho de reproduzir o que sua família faz desde 1903. Foi parar em Ibertioga, no Campo das Vertentes, onde montou a queijaria Caseificio di Vincenzo.
Não estava nos planos fazer os queijos defumados, até que ele encontrou o que precisava. “No Sul da Itália, diferentemente do que acontece no Brasil, não usamos madeiras nobres. Quando começou a produção da muçarela de búfala, o único recurso para defumação era a palha de trigo sarraceno, cultivado na região. Aqui em Ibertioga, depois da colheita do feijão e da soja, eles plantam trigo. Quando vi, fiquei louco, saí catando feno. Me lembro que não tinha pedido permissão para o dono do terreno, foi uma briga. Mas depois expliquei e ele me deixou usar.”
O italiano diz que não inventou nada, só replica o que se faz no seu país. No caso do provolino, o clássico provolone da Campânia, ele fica duas semanas na câmara frigorífica para ganhar a casca. Só depois vai para o armário de defumação. Segundo Vincenzo, o processo é muito simples. Ele acende o fósforo, joga o fogo na palha e deixa formar uma fumaça leve, muito branca, que “lembra a do papa quando é aprovado”, que fica em contato com o queijo por cerca de duas horas de defumação. Depois são mais dois meses na câmara de cura.
A queijaria também produz a próvola, diferente do provolino por ser um queijo fresco. Como fica a madrugada inteira na salmoura, para absorver sal, a peça chega toda úmida ao armário de defumação, então a fumaça gruda facilmente na sua superfície. O processo é bem rápido, dura de 20 a 30 minutos. “A nossa defumação é muito mais delicada e menos marcante. Consigo dar um toque que muda o queijo, acrescenta personalidade, intensidade e uma aparência mais interessante, mas, depois que você engole, o defumado desaparece. Diria que, mais que sabor, meus queijos têm cheiro defumado.”
Um lançamento atrás do outro
Em março, a destilaria Lamas, que fica em Matozinhos, na Grande BH, produziu o seu primeiro uísque 100% turfado (defumado com turfa, material orgânico em decomposição), muito tradicional na Escócia. Era um teste para sentir a reação do público. Em menos de duas horas, as mil garrafas do First Ember foram vendidas pelo site.
A prova definitiva de que o sabor defumada agrada, e muito, os apreciadores da bebida, levou ao lançamento, um mês depois, do Brasilides, também 100% turfado, que entrou definitivamente na linha de produção.
“O nome Brasilides é de uma formação rochosa. Meu pai tem um amigo geólogo e ele contou a história de que, há milhões de anos, quando ainda era Pangeia, o Brasil e a região da Escócia (Caledônia) compartilhavam a mesma formação geológica. Quando os continentes se separaram, isso se manteve em uma área que abrange Matozinhos, onde a destilaria está localizada. Quando descobrimos isso, entendemos que era perfeito para juntar Brasil e Escócia em um uísque turfado”, conta Luciana Lamas, sócia da destilaria e filha Márcio Lamas.
Sabor escocês
A Lamas segue os padrões da Escócia para produzir o Brasilides, usando uma cevada importada que já passou pelo processo de defumação com a turfa. Com graduação alcoólica de 54%, a bebida descansa em barris de carvalho americano e fica com sabor levemente adocicado.
Na verdade, a destilaria tem uma história antiga com uísques defumados. No início, na tentativa de abrasileirar o turfado, Márcio teve a ideia de defumar a bebida com madeira de reflorestamento, o eucalipto. Os grãos de malte de cevada são defumados na própria destilaria. “Não queremos torrar, então o fogo não chega ao malte. É como se fosse um fogão a lenha, só leva fumaça para onde estão os grãos. Nesse processo é que eles ficam com o sabor defumado.”
Assim eles criaram o Nimbus, com graduação alcoólica de 43%. “Passados alguns anos, entusiastas visitaram a destilaria, provaram o Nimbus direto do barril, com teor alcoólico de 60% a 62%, e falaram: ‘está incrível, vocês têm que engarrafar assim’. Só que a legislação brasileira permite a graduação alcoólica de até 54% para uísque.” Foi o que fizeram para lançar o Nimbus Robustus. Ao contrário do que se espera, seu defumado é mais delicado, porque o álcool mascara um pouco o sabor.
Serviço
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