Bares, restaurantes, botecos e botequins se proliferam por Belo Horizonte como em nenhuma outra cidade brasileira. Segundo levantamento realizado pela Associação de Bares e Restaurantes (Abrasel), em 2023, a capital mineira está na liderança com 178 bares a cada 100 mil habitantes, totalizando mais de quatro mil estabelecimentos à época. Há, ainda, uma enorme variedade de sabores, que vão de tira-gostos, churrasco e feijoada, passando por comida italiana, japonesa, cubana e nordestina, chegando até a tradicional mineira.
Diante desse cenário, não há dúvida de que a gastronomia é um setor importante para BH, tanto do ponto de vista econômico quanto social e cultural. A menos de uma semana das eleições municipais, marcadas para o próximo domingo, 6 de outubro, o Estado de Minas questionou os 10 candidatos à Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) sobre esse assunto.
Dois deles pediram para serem entrevistados pessoalmente. Apenas o prefeito Fuad Noman (PSD) não respondeu às perguntas a tempo da publicação. Segundo seus assessores, a agenda dele estava muito atribulada.
Nas conversas, os candidatos falaram sobre seus pratos preferidos, lembranças relacionadas à comida, quais lugares gostam de frequentar, deram indicações para turistas e detalharam projetos para fomentar a gastronomia da cidade.
Cozinha de fazenda
“Gosto muito da cozinha de fazenda”, disse o senador licenciado Carlos Viana (Podemos), citando batata com carne moída, costelinha com arroz e frango com quiabo. Esse último prato marcou sua infância. “A família toda apreciava o frango com quiabo do Maria das Tranças e, quando éramos crianças, íamos para a Pampulha comer. Virou um hábito. Hoje, quando quero um, peço lá.”
Na hora de sair para comer, o candidato prefere os restaurantes italianos e japoneses. “Gosto muito do Dona Derna, que é uma cantina italiana muito tradicional na Savassi, e do Provincia di Salerno. E sou muito fã de comida japonesa. Gosto daquele em frente ao Estadual Central, o Udon. É o meu preferido”, afirmou.
Viana mencionou o Mercado Central como indicação para os turistas, destacando um prato que gosta de pedir. “Recomendo que vá ao Mané Doido e peça um tropeiro e bife acebolado.” Outra opção, segundo ele, é comer a feijoada do Imperium Restaurante Bar, no Mercado do Cruzeiro.
Entre as políticas propostas para o setor, estão ampliar os festivais gastronômicos, atrair mais turistas e ocupar partes históricas da cidade, como a Rua Guaicurus e região, no Centro, criando “programas de incentivos para restaurantes e bares abrirem 24h. É a única região da cidade que efetivamente pode receber esse público”, avaliou.
De tudo um pouco
Bruno Engler (PL) admitiu que come de tudo. “Churrasco, comida italiana, massa, pizza, tropeiro… o que você pensar mando para dentro”. Mas, se tivesse que escolher um único prato, “diria a lasanha da minha avó”.
Apesar de destacar que não é muito de “comer fora de casa”, o candidato citou o Bar do Salomão, onde gosta de se sentar para ver jogos do Atlético e comer filé com fritas e torresmo. Outros lugares citados foram Barbazul e Pizzarella.
Para um turista que nunca veio à cidade, o deputado estadual aconselha visitar o Mercado Central para comer “um pouco de tudo”, mas indicou um lugar e um prato que não podem ficar de fora do passeio: “O mais icônico é o fígado com jiló do Bar da Lora.”
Já sobre políticas para fomentar a gastronomia em BH, o candidato destacou a desburocratização e assumiu o compromisso de revisar o Código de Posturas, “até para eles poderem ter uma condição melhor de divulgação”, e de aumentar a segurança noturna na cidade. Engler ainda citou a intenção de fomentar a eventos no estilo do Comida di Buteco e retomar o transporte público durante a madrugada.
“Antes da pandemia, a gente tinha ônibus que passava no período da madrugada e conseguia atender os funcionários que voltavam para casa. Sem isso, o horário de funcionamento dos bares e restaurantes fica prejudicado”, afirmou.
Local e internacional
Gabriel Azevedo (MDB) foi categórico ao afirmar que “come de tudo”, mas tem preferência por comida mineira. “Adoro arrozinho com tutuzinho, farofinha e lombo”, disse, enquanto devorava um bao – pão chinês cozido no vapor – com barriga de porco, fusão de comida local e internacional, no Mina Jazz Bar, do qual é sócio, no Centro de BH. Depois falou do pão de queijo da avó.
Questionado sobre seus lugares preferidos, o candidato fez uma lista, encabeçada pela tradicional Cantina do Lucas, onde gosta de comer o filé ao molho de jabuticaba; passando pelos restaurantes de seu sócio e amigo Léo Paixão (Glouton, Ninita e Macaréu), os japoneses Sushi Naka, Sakanã e Okinaki e as padarias Casa Bonomi e Bagueteria Francesa.
O empresário e atual presidente da Câmara Municipal de BH também citoua abóbora recheada do Xapuri, o caldo de mocotó do Nonô, o bolinho de carne do Café Bahia e o creme de maisena com ameixa do Café Nice. “Meu pai me levava lá desde pequeno, é minha (sobremesa) favorita”, disse.
Ao apontar caminhos para a valorização do setor, Azevedo afirmou que busca inspiração em Lima, no Peru. “Lima não tem uma comida melhor que a nossa nem uma gente mais legal que a nossa, mas tem diferenciais brutais, que são o treinamento e a forma de divulgar os estabelecimentos”, concluiu.
Entre as suas propostas, estão promover mudanças no Código de Posturas, oferecer incentivos tributários a estabelecimentos que estão abertos há décadas e criar prêmios com benefícios fiscais.
Pastel com cerveja
O Mercado Central foi citado por Duda Salabert (PDT), que indica a “melhor limonada do mundo, talvez do universo”, mencionando a Tradicional Limonada, que existe desde 1938. Já fora dos limites do mercado, sua recomendação é ir ao Rei do Pastel para “comer um pastel de palmito e tomar uma cerveja gelada”. Era exatamente o que ela consumia enquanto dava entrevista.
As idas à Pastelaria Ouvidor com a mãe são lembranças que ela carrega da infância e que quer internacionalizar. “Quero que a prefeita de Paris (Anne Hidalgo) vá à Galeria do Ouvidor comer esse pastel”, apontou.
Outro tradicional ponto belo-horizontino está na sua lista. “Amo o Edifício Maletta. Tenho uma relação política, afetiva e gastronômica com o lugar. Aquela varandinha, um tira-gosto, uma cerveja gelada e uma conversa sobre a revolução são o que me fazem feliz”, disse a candidata, que é vegana.
Salabert propõe o programa “Bares com História”, que poderá mapear e apoiar locais que estão abertos há décadas. “Quando um bar desse fecha, é um traço da nossa identidade cultural que fecha. A ideia é que eles continuem vivos e com todo apoio”, afirmou. A proposta é similar ao projeto “Bares com Alma”, da Belotur com o Sebrae Minas, que será lançado em novembro.
Outras medidas sugeridas são um programa que incentive o pagamento de dívidas e a criação de uma faculdade municipal de gastronomia.
Sabores do mar
A postulante ao cargo de prefeita vinda de mais longe é a alagoana Indira Xavier (UP), que reconhece a dificuldade de conseguir ingredientes do mar, mas foi “encontrando caminhos e lugares, então na minha casa nunca faltam sururu nem camarão.” Quando quer matar a saudade de sua terra natal, costuma ir ao Canto de Mainha, cujo dono é pernambucano. “Gosto do acarajé e do risoto de camarão, que é sensacional”, atestou.
Xavier foi criada pela avó e guarda boas lembranças dessa época. “Sempre aos domingos era dia de cozinhar em família. Tinha galinha ao molho pardo com arroz, purê de batata ou maionese de batata e cenoura”, relatou.
Quando sai para comer, ela também gosta “de fazer turismo gastronômico de resistência. O Paladar do Cubano tem um prato que eu adoro, é um arroz misturado com feijão, costelinha de porco e abacate.” Xavier também citou as arepas feitas por mulheres nas feiras da Casa Tina Martins.
A candidata falou, ainda, sobre o torresmo de barriga do Amarelim do Prado e a língua e moela do Serrotinho. Para os turistas, sugeriu o clássico. “Tem que ir ao Mercado Central e comer o fígado com jiló”, afirmou, sem citar nenhum bar específico, mas disse preferir onde dá para sentar.
Se for eleita, Xavier pretende “ouvir os trabalhadores e pequenos empresários da gastronomia”, avisou, criticando o Código de Posturas e a falta de um mapeamento de bares e restaurantes por parte da prefeitura. Ela disse que conheceu vários lugares pelas redes sociais e no boca a boca.
Não só para sushi
O almoço ideal de Rogério Correia (PT) tem arroz, tutu de feijão, ovo cozido e bife, mas, se for tira-gosto, ele prefere um torresminho. Fora isso, um prato italiano o marcou. “Tem um prato que gosto muito e como sempre que vou à Cantina do Lucas, desde a minha juventude: o talharim à parisiense”, comentou, acrescentando que, na adolescência, “o Rochedão do Bolão” também não faltava e servia para “curar as ressacas de fim de noite”. Só o que não come é comida japonesa.
A comida afetiva do petista passa pela avó e pela cozinha de fazenda. “Ela comprava galinha, escaldava, cortava o pescoço, tirava o sangue e preparava. Já vi minha avó matar porco na roça. Ela fazia chouriço e guardava as carnes na banha. Também fazia doce”, relembrou.
Sobre lugares preferidos para sair, Correia, que destacou não ter mais idade e pique para a vida boêmia, citou Bar do Antônio e Café Paddock.
Para os turistas, o candidato recomendou ir ao Mercado Central comprar queijo, sem especificar o lugar nem o produto. O famoso PF do Bolão e a mandioca com carne do Bar do Chico também entraram na sua lista.
“Minha ideia é ter um incentivo real às micro e pequenas empresas e também à economia informal. Fazer com que as pessoas tenham subsídios, que a prefeitura as ajude com bancos do estado e nacionais.” Outro plano é rever o Código de Posturas. “Tem muita reclamação de que bar tem que fechar meia-noite, uma hora da manhã. Vamos ter que rever isso.”
Fã de frango
Mauro Tramonte (Republicanos) é um fã inveterado de frango. “Não posso ver um frango assado numa vitrine ou numa assadeira que eu fico louco. Assado, ensopado, frito, de qualquer jeito”, confessou, depois de contar que a mãe fritava frango para vender em bares.
Já a comida afetiva do candidato é o arroz de forno que a mãe só fazia aos domingos. “A gente era bem humilde. Ela pegava o arroz e fazia em bandeja. Misturava com ovo, milho, queijo e colocava no forno”, rememorou.
O candidato não é fã de “lugares charmosos” para comer e prefere “comida mais humilde”, como ele próprio definiu. “Esses dias estava no Betânia, onde fomos comer angu à baiana, caldo de mocotó. (...) O Amarelim (da Prudente) é um que eu gosto, mas não tenho preferência de lugar”, comentou. Um dos seis candidatos a mencionar o Mercado Central, o apresentador de TV aconselhou “comer jiló com cebola, tutu à mineira, barriga de porco e torresmo bom”, sem determinar um lugar exato.
Tramonte afirmou que a capital não valoriza a gastronomia mineira como fazem as cidades do interior. “Hoje Belo Horizonte está parada no tempo. Nossa gastronomia mineira é realmente a melhor do Brasil, não só em diversidade, mas em mistura. Temos que resgatar isso”, prometeu.
Da colheita à panela
Vinda de Grão Mogol, no Norte de Minas, Lourdes Francisco (PCO) gosta de comer “farofa de andu, farinha, rapadura, feijão catador e as frutas do cerrado mangaba, araçá, fruta de leite, rufão, gabiroba e jatobá”, enumerou.
O prato mais marcante para ela é o arroz com pequi, muito comum na sua região, que representa a essência dos geraizeiros, comunidades que vivem no Norte de Minas. “A gente colhia e meus pais, que eram da agricultura familiar, faziam. Ainda faço muito. Na minha terra, tem muito pé de pequi. Eu mesma colho e faço com arroz”, afirma. A candidata também fala da palma, espécie de cacto usado para alimentar gado. “A gente faz com carne de sol e come com arroz e feijão ou angu.”
Em BH, Lourdes Francisco disse gostar de dois lugares bem conhecidos por quem transita pelo Centro. “Gosto do Mineirinho e do Nonô, que tem um torresmo muito bom.” O Mineirinho, inclusive, é o restaurante indicado para os turistas, não só pela comida, mas também pelo serviço. “A feijoada é ótima, assim como o bife de carne de porco com feijão-tropeiro. Tem também a maneira de tratar a gente, o cuidado, carinho”, afirmou.
Entre as propostas da candidata para o setor, estão destinar verba da cultura para incentivar donos de bares e rever o Código de Posturas, que limita os horários de funcionamento dos estabelecimentos.
Sexta é dia de feijoada
Wanderson Rocha (PSTU) tem entre as suas comidas preferidas os pratos que a sua mãe fazia. “A minha mãe era doméstica e cozinhava. Os pratos que os ricos, na época, gostavam, como lasanha, ela fazia questão de ter em casa, mesmo com a dificuldade financeira”, recordou, citando também o frango com quiabo como um dos mais marcantes.
Na hora de sair para comer, Rocha menciona o Xico do Churrasco, com a carne de boi e o pão de alho, e o Restaurante do Kju. “Lá, o melhor é a feijoada da sexta-feira”, avisou. Ele também cita o acarajé da Feira Hippie.
A profissionalização para trabalhadores de bares e restaurantes é uma das propostas do candidato. “A prefeitura pode investir na ampliação de cursos de gastronomia para termos mais profissionais habilitados”, observou, acrescentando que pequenos negócios precisam de muito suporte do poder público.
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Rocha também defendeu que feiras, como a Feira Hippie, sejam replicadas nas regionais para divulgar pratos, gerar empregos e mais investimentos em agroecologia e hortas comunitárias, fazendo com que a população tenha acesso a uma alimentação mais saudável.