Para o leitor que não conhece, quais as atribuições e importância da Defensoria Pública?
A Defensoria Pública tem uma gama de atribuições muito grande. A Constituição Federal determina que a instituição promova a justiça e garanta o direito de pessoas ou grupos vulnerabilizados de maneira gratuita, de forma judicial ou extrajudicial. Temos como missão acolher a pessoa em situação de vulnerabilidade, garantindo o acesso aos direitos de forma célere e eficaz, promovendo a cidadania e a dignidade. Atuamos na proteção dos direitos das mulheres em situação de violência de gênero, das crianças e adolescentes, da pessoa idosa, da pessoa com deficiência, do consumidor, direitos humanos, garantimos atendimento previsto em lei na saúde, na área criminal, entre tantas outras áreas que resultam sempre na nossa missão de proteção de direitos e toda e todo cidadã e cidadão vulnerabilizados. Somos uma Instituição plural, que existe para minimizar as históricas desigualdades sociais. Em uma democracia jovem como a nossa, a Constituição Federal deu o mesmo valor à acusação e à defesa, exatamente para que a balança do sistema de justiça se mantenha equilibrada, garantindo que o acesso à justiça aconteça de forma ampla. Isso reafirma a Defensoria Pública como ferramenta e caminho transformador de vidas e de construção de uma sociedade melhor. Todos sabemos que o Brasil é um país extremamente litigante e que o número de processos em tramitação na justiça brasileira é um dos maiores do mundo. Por isso a Defensoria tem também a missão constitucional de garantir o acesso ao direito por meios extrajudiciais. É nosso papel, primeiro, buscar a solução consensual dos conflitos, com o apoio do Poder Judiciário, que homologa muitos dos nossos acordos, seja na área da família, cível, consumidor, entre outras.
Nesse ano a Sra. foi reeleita defensora pública-geral de Minas Gerais para o biênio 2024/2026, com 84,87% dos votos. Uma liderança inconteste. Quantos defensores públicos existem em Minas Gerais? A Defensoria atua em todos os 853 municípios mineiros? Quais os principais projetos para seu novo mandato?
Cada voto recebido multiplica a nossa responsabilidade, mas é o reconhecimento do esforço de toda a Instituição para avançar cada vez mais e oferecer um serviço de excelência à população. Hoje somos 684 defensoras e defensores públicos, atuando em 121 das 298 comarcas de Minas Gerais. Estamos presentes em todas as regiões do estado. A Defensoria Pública é uma Instituição ainda muito jovem, tendo completado 48 anos em agosto, e temos muito ainda que caminhar. Temos providos pouco mais de 50% dos cargos previstos em lei. O plano de expansão é uma das prioridades da gestão. Com nosso planejamento estratégico 2023-2025 em andamento sabemos onde queremos chegar. Esse é um dos instrumentos que nos permitem atuar com racionalidade, fazendo mais com menos, observando os dados e planejando ações. Estamos recebendo investimentos para nosso fortalecimento e em processo de expansão. Nos últimos dois anos e meio, a gente conseguiu fazer a expansão para 150 novas unidades jurisdicionais, principalmente com o modelo de cooperação. Totalizamos 29 unidades novas ou expansão das instalações em endereços novos no interior. Mais de 50 unidades tiveram suas atribuições ampliadas. Em Belo Horizonte implantamos a unidade IV para dar mais comodidade e privacidade no atendimento à população. Além disso, neste momento chegamos à fase final do IX concurso para ingresso na carreira, com a primeira nomeação prevista para o final de 2024. Vamos direcionar os novos colegas para localidades onde a presença da Defensoria se faz necessária, em cidades com baixo Índice de Desenvolvimento Humano ou grande adensamento populacional. Lugares em que as pessoas passam, em alguns casos, a vida inteira sem acesso à justiça. Avançamos também na área administrativa. Fizemos o primeiro concurso para servidoras e servidores da história da Defensoria de Minas e empossamos em agosto 51 servidores aprovados, um momento histórico para a instituição. Tudo isso tem o objetivo comum de aprimorar o atendimento à população.
Uma de suas realizações em seu primeiro mandato foi o “Eixo Tecnológico – Plano de Ação Tecnológico e de Soluções Informatizadas”. No que consiste e quais os avanços esse plano de ação trouxe para a Defensoria Pública? Inteligência artificial, a Defensoria Pública já a utiliza?
O investimento em tecnologia continua sendo uma das prioridades da gestão. Vimos como isso é fundamental quando veio a pandemia da Covid-19 e já estávamos nos preparando para oferecer o atendimento virtual ainda mais eficiente às nossas assistidas e assistidos. Conseguimos manter o atendimento mesmo com o cenário bastante adverso na ocasião. Esse é um caminho sem volta, principalmente pelo aparecimento contínuo de novas ferramentas, como a Inteligência Artificial. O Eixo Tecnológico – Plano de Ação Tecnológico e de Soluções Informatizadas consiste no planejamento e execução de desenvolvimento e melhorias em sistemas, tanto para o atendimento ao público, quanto para usos internos para gerenciamento da Instituição. Foram desenvolvidos e aprimorados sistemas ou funcionalidades para melhoria da gestão de informações do atendimento às pessoas assistidas, gestão de arquivos, informações de despesas para integração com o Executivo estadual, gestão de produtividade, dentre outros. Além da abordagem em sistemas, foram também realizadas aquisições e criado um planejamento para melhorias e crescimento da infraestrutura para hospedagem de aplicações, melhoria de rede e renovação do parque informatizado. Essas melhorias passam por troca de equipamentos, instalação de novos e troca de tecnologias obsoletas. As ações direcionadas para o Eixo Tecnológico estão sempre alinhadas com os itens do Planejamento Estratégico.
As melhorias nos sistemas atuais e a migração do sistema de atendimento ao público, que começará a ser implantada em outubro, viabilizarão a abordagem de utilização de Inteligência Artificial, com mais dados coletados e organizados, permitindo a utilização em ferramentas baseadas em IA. Desta forma, os planos para utilização de IA, com os novos sistemas em desenvolvimento e implantação, passam desde o retorno às pessoas assistidas sobre o andamento de um processo existente até ao auxílio às defensoras e defensores públicos na análise de peças processuais. Mas mesmo com todas essas tecnologias que chegam ao mundo corporativo, na Defensoria Pública sabemos que jamais poderemos abrir mão do contato pessoal das defensoras e dos defensores públicos com as pessoas assistidas. O acolhimento é humano, não tem outra forma, e essa é uma particularidade da nossa instituição. Por isso, precisamos estar atentos no uso da IA para que não haja perda da pessoalidade do atendimento. Diante da complexidade dos casos e das características de boa parte de nossas assistidas e assistidos, muitas vezes somente o contato pessoal consegue extrair as informações necessárias para a melhor composição de um processo ou acordo.
Recentemente a Defensoria Pública, por seu intermédio, celebrou com o TRT-3ª Região, um acordo de cooperação para destinação de vagas para mulheres em condição de vulnerabilidade. Do que se trata esse acordo e qual sua relevância?
Entre as atribuições da Defensoria Pública está a de atuar como agente de transformação social. É nossa missão. Então, nossos serviços prestados vão bem além do atendimento jurídico gratuito oferecido à população em situação de vulnerabilidade. E o Acordo de Cooperação Técnica firmado recentemente com o Tribunal Regional do Trabalho é uma dessas iniciativas, entre tantas outras que temos. O objetivo é promover a inclusão de mulheres vulnerabilizadas no mercado de trabalho formal, não apenas sua inserção profissional, mas também a criação de condições para independência econômica e a garantia da dignidade. Temos um outro projeto semelhante em andamento já há dois anos, que é o Oportunidade, numa parceria com o Senac. São oferecidos cursos profissionalizantes gratuitos para as mulheres assistidas pela Defensoria, que se capacitam e conquistam uma fonte de renda. E estamos construindo também uma parceria com a Associação Mineira dos Supermercados e Câmara de Dirigentes Lojistas, também para suprir a grande demanda existente de profissionais neste setor, por meio da indicação de nossos assistidos devidamente qualificados. Tudo isso está no escopo de nossa atuação extrajudicial, uma de nossas premissas, como dito na primeira resposta. Temos sempre que pensar fora da caixa, criar mecanismos para promover a justiça também fora dos tribunais. Temos várias ações de educação em direitos nas escolas, nas comunidades, a formação de defensoras populares como multiplicadoras do conhecimento, também vamos até onde as pessoas estão com nosso atendimento itinerante, e assim a gente vai contribuindo para mudar a sociedade. Com projetos extrajudiciais, como por exemplo os mutirões que garantem o reconhecimento de paternidade, de registro civil das pessoas, os casamentos comunitários ou os acordos de indenização extrajudicial por meio do Termo de Compromisso de Brumadinho, que virou referência nacional, a Defensoria contribui decisivamente para a pacificação social e para o desafogo do Judiciário brasileiro.