A revolução digital tem causado transformações profundas em diversas áreas, e o sistema judiciário é um dos setores que mais se beneficiou dessas inovações. O uso de novas tecnologias nos processos judiciais tem sido crucial para agilizar procedimentos, aumentar a eficiência e garantir um acesso mais amplo à justiça. Ferramentas como inteligência artificial (IA), blockchain e plataformas de gestão eletrônica de processos são exemplos dessas inovações, que vêm modernizando o cenário jurídico, acelerando a tramitação de casos e reduzindo a burocracia. No entanto, é imprescindível que essa modernização seja implementada com cautela, respeitando sempre as prerrogativas dos advogados, que constituem a espinha dorsal da defesa dos direitos e garantias fundamentais.
A morosidade da justiça é uma crítica recorrente, e o judiciário brasileiro há tempos enfrenta a reputação de ser lento e ineficaz, levando anos, ou até décadas, para resolver alguns casos. A digitalização dos processos judiciais, com destaque para o Processo Judicial Eletrônico (PJe) no Brasil, trouxe uma das mais significativas inovações dos últimos anos, com o objetivo de mitigar esses atrasos. A transição do papel para os sistemas eletrônicos reduziu drasticamente o tempo de tramitação dos processos, eliminando os riscos de extravio de documentos e facilitando o acesso às informações por todas as partes. Contudo, é vital que essa transformação não subverta o papel essencial dos advogados. O acesso pleno aos autos e a capacidade de intervir em qualquer momento do processo são prerrogativas que não podem ser relativizadas em nome da celeridade. A digitalização deve ser vista como uma ferramenta que fortalece o trabalho dos advogados, garantindo que eles possam exercer suas funções com ainda mais eficiência, sem comprometer o direito à ampla defesa.
Embora as tecnologias digitais tenham acelerado determinados aspectos do processo judicial, a persistente morosidade revela que o problema vai além da simples digitalização. Existem entraves estruturais e culturais que precisam ser resolvidos, e a tecnologia, por si só, não é a solução completa. Além de sistemas eletrônicos, é necessário repensar procedimentos, eliminar formalidades desnecessárias e capacitar operadores do direito para lidar com a nova realidade digital, sob pena de as inovações serem insuficientes para sanar o problema da lentidão.
O uso de inteligência artificial na análise de dados jurídicos, embora seja uma inovação promissora, também exige um cuidado redobrado com relação ao papel do advogado. Sistemas de IA podem ser extremamente eficazes na análise de grandes volumes de informações, na identificação de precedentes e até na sugestão de decisões. No entanto, a decisão final deve sempre estar nas mãos de um juiz, apoiado pela atuação dos advogados. A automatização de certas funções não pode, em hipótese alguma, comprometer o contraditório e o pleno exercício da defesa, elementos fundamentais da justiça. A atuação da inteligência artificial deve ser estritamente auxiliar, nunca substituindo o julgamento humano ou minimizando a importância da intervenção advocatícia.
Além disso, o blockchain tem ganhado notoriedade como uma tecnologia capaz de garantir a integridade e a autenticidade de documentos e contratos digitais. Seu uso pode ser uma solução robusta para assegurar a transparência e a segurança dos processos judiciais, especialmente em relação à prova documental. Contudo, é imprescindível que os advogados mantenham o direito de contestar e verificar a autenticidade de quaisquer documentos apresentados, preservando o controle sobre os elementos essenciais à defesa. A segurança proporcionada pelo blockchain não pode se sobrepor à prerrogativa dos advogados de questionar e analisar as provas.
As plataformas de mediação e conciliação online, outro avanço importante, têm oferecido alternativas rápidas e menos onerosas para a resolução de conflitos, diminuindo a sobrecarga do judiciário. No entanto, é essencial que o papel do advogado não seja reduzido nesse contexto. A presença de um representante legal é fundamental para assegurar que os direitos das partes sejam adequadamente defendidos e que os acordos firmados estejam em conformidade com os princípios legais. A mediação pode ser uma solução ágil, mas o advogado é o guardião da justiça, e sua função é inegociável, mesmo em ambientes menos formais como os de mediação online.
Por mais promissoras que sejam essas inovações tecnológicas, é crucial que o judiciário mantenha um equilíbrio no uso dessas ferramentas, sem jamais negligenciar as garantias fundamentais dos advogados e das partes envolvidas. As prerrogativas dos advogados – como o direito à consulta aos autos, à ampla defesa, ao sigilo profissional e à contestação de provas – são pilares do estado democrático de direito e precisam ser asseguradas independentemente das ferramentas tecnológicas empregadas.
Portanto, as novas tecnologias desempenham um papel central na aceleração dos processos judiciais, mas sua implementação deve ser feita com responsabilidade e extremo cuidado, sempre respeitando as prerrogativas dos advogados. A inovação no judiciário só será benéfica se for usada para fortalecer a justiça, sem jamais comprometer a qualidade do processo ou os direitos de defesa. A modernização deve servir ao sistema de justiça, tornando-o mais acessível, ágil e eficiente, mas sempre preservando a função essencial do advogado na defesa plena dos direitos de seus clientes. O respeito às prerrogativas é inegociável e deve estar no centro de qualquer transformação tecnológica no judiciário. Ao mesmo tempo, é crucial que essas mudanças tecnológicas sejam acompanhadas de reformas estruturais mais amplas, capazes de atacar a raiz da morosidade e transformar de forma efetiva o cenário da justiça no Brasil.