No domingo (3/12), celebra-se o Dia Internacional das Pessoas com Deficiência (PcD). Criada pela Organização das Nações Unidas (ONU) para conscientizar os países membros sobre os direitos das pessoas com deficiência, a data ainda revela que o caminho até o fim do capacitismo é longo – e carece de acessibilidade.

A população com deficiência no Brasil é estimada em 18,6 milhões de pessoas de dois anos ou mais, o que corresponde a 8,9% da população dessa faixa etária, de acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD): Pessoas com Deficiência 2022. Das 18,6 milhões de PcD, mais da metade são mulheres: 10,7 milhões, o que constata que 10% da população feminina no país possui alguma deficiência.



Os dados da PNAD mostram também que as pessoas com deficiência estão menos inseridas no mercado de trabalho, nas escolas – e, por consequência, têm acesso à renda mais dificultada. Segundo o levantamento, a taxa de analfabetismo para pessoas com deficiência foi de 19,5%, enquanto para as pessoas sem deficiência foi de 4,1%.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 26,6% das pessoas com deficiência encontram espaço no mercado de trabalho. O nível de ocupação para o resto da população é de 60,7%. Cerca de 55% das pessoas com deficiência que trabalham estão em situação de informalidade. O rendimento médio real também é diferente entre pessoas com deficiência e sem: para o primeiro grupo, a renda foi de R$1.860, enquanto o segundo chegou a R$2.690, uma diferença de 30%.

Ativismo PcD

No Brasil, o ativismo pela causa PcD tem ganhado cada vez mais espaço. Uma das conquistas mais recentes em âmbito federal foi o Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, chamado de “Novo Viver Sem Limite”, que tem o objetivo de garantir dignidade, promover direitos e ampliar acessos das pessoas com deficiência no país.

O Plano, que teve uma primeira versão publicada em 2011, foi lançado na última semana de novembro e há uma expectativa de investimento de cerca de R$6,5 bilhões em 95 ações. Sua elaboração contou com a participação da sociedade civil, por meio do Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência (Conade), além de 27 ministérios e órgãos públicos.

As ações serão desenvolvidas a partir de quatro eixos: gestão e participação social; enfrentamento ao capacitismo e à violência; acessibilidade e tecnologia assistiva; e promoção do direito à educação, à assistência social; à saúde e aos demais direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais. O plano terá a duração de quatro anos e será revisto a cada ano.


“É importante que o governo federal crie políticas mais amplas, como de acesso à educação, à saúde e ao mercado, ou de esclarecimento de deficiências e de como respeitá-las, afinal o Poder Público é quem tem a maior capacidade de promover alterações nas condições de vida da população”, explica Mário Sérgio Rodrigues Ananias, gestor público, escritor e palestrante com deficiência ativista há mais de 40 anos.

Para ele, a existência de uma data – seja ela nacional ou internacional – é fundamental para que as pessoas reflitam: por que existe um marco para este dia?

“Isso chama a atenção para a questão da deficiência, que muitas pessoas consideram uma ameaça ou uma praga, e não é assim. Uma série de questões podem fazer com que qualquer pessoa se torne PcD. Pode ser um acidente de carro, um acidente em casa, ou até mesmo um AVC. No meu caso foi a poliomielite. Então, a gente precisa pensar num mundo que seja acessível para qualquer pessoa. As datas têm essa força de informar as pessoas e dar visibilidade para um problema que a gente geralmente não percebe”, afirma ele.

Dia a dia

Ananias, que é autor do livro “Sobre Viver com Pólio”, explica que um dos caminhos para tornar o Brasil um país mais inclusivo é pressionar os governos federal, estadual e municipal para que ações efetivas sejam tomadas – principalmente em relação à infraestrutura das cidades e das construções – mas que, individualmente, também é possível contribuir.

“O que facilitaria e daria muita melhoria na vida das pessoas com deficiência seria que o governo federal, estadual e o municipal se empenhassem em, por exemplo, criar mecanismo que impeçam ou que dificultem que as calçadas sejam muito complicadas. Hoje em dia, as calçadas se adaptam para facilitar a entrada e saída de carros, mas isso acaba virando um longo circuito para pessoas com deficiência”, afirma ele.

“Pessoas com deficiência encontram as maiores barreiras em vias, equipamentos e em transportes públicos. Isso, quem pode resolver, são o governo estadual e/ou municipal, mas os arquitetos também têm papel importante”, complementa o escritor.

“Uma pessoa sem deficiência, quando faz uma construção, é importante que ela entenda e pense na condição de acessibilidade não só para as pessoas com deficiência, mas para aquelas que eventualmente têm algum problema de mobilidade. É importante pensar na sensibilidade, não só para com as pessoas com deficiência, mas também com o restante da sociedade”, conclui.

Para além da acessibilidade, Mário Sérgio também explica que o capacitismo ainda é uma questão que precisa ser superada todos os dias pelas pessoas com deficiência – o que pode causar problemas de autoestima nessa parcela da população.

“Muitas vezes, a própria pessoa com deficiência se coloca na condição de super-herói e de tentar ser capaz de resolver coisas que, normalmente, ele não seria capaz. Essa necessidade de fazer essas atividades além da sua condição física ou sensorial aparece muito para mostrar não que isso está totalmente superado, mas que sua condição melhorou”, diz.

“A gente tenta ser uma espécie de herói para nós mesmo e para as pessoas que estão à nossa volta numa tentativa de nos firmarmos socialmente. Claro que não é o ideal. Nunca foi. Por isso, com o tempo, as ações que vêm sendo desenvolvidas em diversas entidades é procurar diminuir essa necessidade de as pessoas com deficiência se mostrarem heróis”, complementa.

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