Casamentos homoafetivos em Minas caem mais de 70% em 2023
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Casamentos homoafetivos em Minas caem mais de 70% em 2023

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Minas Gerais registrou uma diminuição de 72,8% no número de casamentos homoafetivos em 2023. Ao todo, foram realizados 304 casamentos no último ano. Em 2022, foram 1.118. O número, no entanto, é maior do que os 209 casamentos registrados em 2013, primeiro ano da norma nacional editada pelo Conselho Nacional de Justiça. Os dados são do Portal da Transparência do Registro Civil, base de informações administrada pela Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil).

 

De acordo com o coordenador de comunicação da Aliança Nacional LGBTI+ e membro consultivo da comissão de diversidade sexual e gênero da Ordem dos Advogados do Brasil em Minas Gerais (OAB-MG), Gregory Rodrigues, acredita que uma gama de fatores pode contribuir para a redução dos matrimônios no estado, mas destaca a insegurança jurídica.

 

“Nós não temos legislações específicas que garantem a proteção da população LGBTI+. Inclusive, os casamentos são apenas direitos garantidos por jurisprudência do próprio Supremo Tribunal Federal (STF) e uma possível mudança de qualquer formação dentro dentro do Supremo, ou no Parlamento os nossos direitos podem ser caçados” avalia Rodrigues.

 

 

Pensando nos direitos jurídicos, a jornalista Rafaela Cristina de Souza, de 26 anos, e a arquiteta Talita Dantas Castelari, de 27 anos, decidiram se casar. Além do sentimento mútuo, havia a preocupação em ter a afirmação de que o casal é uma família perante o Estado.

 

 

“Era um processo que a gente queria muito passar, apesar de ser uma coisa muito jurídica, era muito para nos resguardar. Por mais que a gente já tenha conquistado muitos direitos enquanto comunidade, a gente sempre pensou em ter um filho, a gente sempre pensou que se acontecer alguma coisa com uma com a outra, a gente não tem muita coisa para se resguardar”, conta Rafaela.

 

Casamento de Rafaela Cristina de Souza e Talita Dantas Castelari

Casamento de Rafaela Cristina de Souza e Talita Dantas Castelari

Arquivo pessoal

 

O matrimônio ocorreu em fevereiro deste ano, depois de dois anos morando juntas. Como elas já moravam juntas, o casamento foi mais uma maneira de “existir como família”. Segundo Rafaela, embora ela e a esposa tenham se casado recentemente, elas não conhecem outros casais homoafetivos que são casados.

 

Para o gerente de marketing, Pedro Henrique de Lima, de 33 anos, casado no civil desde novembro de 2023, a insegurança jurídica também foi importante na tomada de decisão. Ele e o esposo, o gerente de comércio Frederico Melo Paixão, de 37 anos, pensam que além do sentimento, o casamento é importante para a segurança deles.

 

 

“A gente entende a união como um marco na nossa história, pois é um novo passo de desenvolvimento do relacionamento do casal, então tem esse lado mais do rito, mas também tem esse lado civil. A gente está construindo uma história junto e como casal, acho que o cuidado faz parte, seja cuidado fraternal, seja o cuidado de bens. Então a gente está construindo uma vida junto, a gente tá construindo um patrimônio e nada mais justo que a gente consiga ter esse esse respaldo legal e que a nossa relação seja reconhecida perante o universo civil para que não tentem anular os direitos que a gente tem sobre os bens e as coisas que a gente construir junto a partir de agora”, conta Pedro.

 

Casamento de Pedro Henrique de Lima e Frederico Melo Paixão

Casamento de Pedro Henrique de Lima e Frederico Melo Paixão

Bruno Lemos

 

A questão da insegurança jurídica, no entanto, não é um problema para o secretário-geral da comissão de penitenciários da OAB-MG, André Luiz Lima. Segundo ele, o número de casamentos não expressa preocupação, pois representa que as pessoas LGBTQIAPN+ estão dando prioridade ao seu reconhecimento antes de priorizar um relacionamento. Soares reforça o argumento comparando o casamento com a união estável, que, em termos de direitos civis, estão praticamente igualados.

 

“Isso demonstra um amadurecimento das orientações, do posicionamento acerca da sua orientação sexual do seu firmamento antes mesmo de estabelecer relacionamento. Isso revela de uma forma muito clara que as pessoas estão buscando antes de estabelecer um relacionamento, se firmar enquanto pessoa”, diz Lima.

 

 

Divisão por gênero

 

Os matrimônios homoafetivos entre casais femininos representam 56,4% do total em Minas Gerais, tendo sido realizadas 3.478 celebrações deste tipo em cartório desde 2013. Em 2023 foram realizados 163 matrimônios entre casais do sexo feminino, número 74,5% menor que os 639 realizados em 2022.

 

Já os matrimônios entre casais masculinos representam 43,6% do total no estado, tendo sido realizadas 2.688 celebrações desde 2013. No ano passado foram 141 cerimônias entre casais do sexo masculino, número 70,6% menor que os 479 realizados em 2022.

 

Em 2024, apenas 117 casamentos entre pessoas do mesmo gênero foram registrados em cartórios do estado.

 

Sobre o registro de casais homoafetivos em cartórios, o presidente do Sindicato dos Oficiais de Registro Civil das Pessoas Naturais do Estado de Minas Gerais (Recivil), Genilson Gomes, destaca que "o Cartório de Registro Civil garante atos essenciais para o exercício da cidadania para todos os brasileiros e não há exceção quando falamos da população LGBTQIA+. Em qualquer cartório é possível casar-se, realizar união estável ou, até mesmo, optar pela mudança de nome e gênero”.

 

Mudança de nome e gênero

 

Ao contrário do número de casamento realizados em Minas Gerais, a mudança de nome e gênero em documentos registrados em Minas no ano passado bateu recorde. Foram 465 alterações, segundo a Arpen-Brasil.

 

Comparado às 357 alterações realizadas em 2022, o número de 2023 representa um aumento de 30,3% e um crescimento de 360,4% em comparação com as 101 mudanças ocorridas em 2019, primeiro ano completo da norma nacional editada pelo Conselho Nacional de Justiça.

 

 

Nos cinco primeiros meses de 2024, já foram realizadas 191 mudanças de gênero em cartórios, outro novo recorde em comparação com o mesmo período dos anos anteriores.

 

Com 1.440 mudanças de gênero realizadas desde a regulamentação do ato em 2018, foram registradas 781 alterações do sexo masculino para o feminino, o que equivale a 54,2% do total de atos. Já as mudanças do sexo feminino para o masculino totalizaram 614 registros, o equivalente a 42,6% dos atos em cartório. Em 45 ocasiões, correspondente a 3,1% dos casos, houve mudança apenas de nome e não de gênero.

 

 

De acordo com o coordenador de comunicação da Aliança Nacional LGBTI+, as leis que asseguram o direito e facilitam as alterações podem ter favorecido significativamente o aumento do número. Isso porque, antes da Lei 24.632/2023 as pessoas da comunidade conseguiam retificar o nome social apenas através de ações.

 

“Temos uma lei no estado que garante que a retificação seja feita de maneira gratuita dentro dos cartórios, o que influencia o avanço de uma legislação que abarca a necessidade da população transsexual e travesti. Essa questão acaba justificando o aumento, porque até então as pessoas precisavam passar por mutirões feito por ações, então eu acredito que o aumento seja por causa dos benefícios garantidos por uma legislação específica”, concluiu Gregory.

 

*Estagiária sob a supervisão do subeditor Humberto Santos