O presidente da Câmara dos Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL/BH) e do Sebrae Minas, Marcelo Souza e Silva, foi o convidado da edição de ontem do “EM Minas”, programa de entrevistas da TV Alterosa em parceria com o jornal Estado de Minas e o Portal UAI.
Em conversa com o jornalista Benny Cohen, o empresário fez uma avaliação da economia brasileira em 2023, com um olhar detalhado para o setor de comércio e serviços, que têm as maiores taxas de empregabilidade. Souza e Silva destacou que o ano começou com incertezas que foram melhorando ao longo dos meses devido ao controle da inflação e o corte na taxa de juros, fechando de maneira positiva. “Essa movimentação econômica ajuda muito os setores de comércio e serviço e a gente termina o ano muito bem, recuperando ainda parte das questões da pandemia”, avaliou.
Em BH, o empresário espera um crescimento do setor na casa de 2,5%, ao mesmo tempo em que a cidade passa por transformações no hipercentro e na dinâmica lojista. “Em Belo Horizonte a gente tem o hipercentro, os shoppings, e a gente tem cerca de 30 centros comerciais que são bem potentes. É bem diversificada essa concentração do comércio e a gente consegue ter esse número mais otimista”, frisou Marcelo Souza e Silva.
O presidente da CDL também avaliou o impacto de propostas como a tarifa zero no transporte público, reajuste salarial dos servidores públicos, além do projeto de revitalização do centro de Belo Horizonte. Esses e outros pontos da entrevista com o empresário Marcelo Souza e Silva você lê na íntegra do EM Minas, um programa da TV Alterosa, Estado de Minas e do Portal UAI. Confira a seguir.
O ano começou com um Governo Federal novo, algumas incertezas. Como o ano está terminando na área do comércio?
A expectativa era de muito pé atrás, mas essa expectativa ao longo dos meses foi melhorando. O comércio e serviço são atividades que sempre empregaram muita gente. Temos uma característica de ser um setor que tem muitas micro e pequenas empresas, mas a empregabilidade quando se junta toda essa força é muito importante. Mas temos aquela preocupação, primeiro é um governo de características que já ocorreram no passado e inchar a máquina, ter muita gente, isso é um grande problema. Quanto mais despesa se tem, mais ele tem que arrecadar. Mas a gente viu a inflação segurando dentro de um número que é suportável e interessante para a economia. Também tem a questão dos juros, essa discussão que vem ao longo dos últimos anos com o Banco Central fazendo um planejamento que está se concretizando agora.
Essa movimentação econômica ajuda muito os setores de comércio e serviço e a gente termina o ano muito bem, recuperando ainda parte das questões da pandemia. Naquela época muitas pessoas tiveram que buscar créditos para fazer investimentos ou para segurar aquele período e agora estão terminando esses pagamentos então isso ainda impacta. Mas isso também teve um ponto positivo e esse ano está refletindo isso, que é a gestão cada vez melhor das empresas. Os empreendedores estão prestando mais atenção na gestão, na questão de lidar melhor com seu cliente, estão fidelizando mais o cliente.
Essa questão de uma gestão melhor é uma consequência da pandemia? As pessoas se sentiram pressionadas a entender melhor a área onde estão atuando?
Sim. Teve dois aspectos muito importantes, primeiro a necessidade. O lojista teve que se voltar pro negócio, entender mais o seu negócio para que isso ocorresse, e nesse ponto duas entidades foram muito importantes aqui em Belo Horizonte: A CDL/BH fez um programa chamado "É pra já", dando as mãos aos seus associados e não associados - a CDL tem cerca de 13 mil associados aqui em BH; e, também, o SEBRAE, que é uma entidade que ajudou bastante a buscar essa gestão mais eficiente. Teve esse aspecto da necessidade, mas teve, esse aspecto de que na pandemia, como não teve aquele volume de negócios, esse empreendedor teve mais tempo. Porque o empreendedor não tem tempo, ele que abre a loja, ele que faz compra, ele que paga as contas, ele busca menino na escola.
Sobre a Selic (taxa básica de juros), começamos o ano com 13,75% e estamos fechando em 11,25%. Como foi a reação do comércio em relação ao corte?
Foi bem positivo, o comércio precisa muito do crédito. O comerciante precisa buscar o crédito e ele precisa dar o crédito pro seu cliente, então quanto mais acessível e quanto melhor as condições para isso, é muito positivo. Essa questão da taxa de juros, o Banco Central veio tratando isso ao longo de anos em uma política que ele estabeleceu, com essa perspectiva pra esse ano, que talvez foi melhor do que se estava esperando, conseguiu baixar o juros.
Apesar da gente carregar ao longo dos últimos anos um grande endividamento das famílias, veio o programa Desenrola e muita gente conseguiu sair dessa situação. A população, de modo geral, está observando que têm de ter essa educação financeira, tem que cuidar das suas finanças. É óbvio que tem outras questões que a gente tem que discutir. Essa inadimplência ainda segura essas taxas de juros mais altas, principalmente em cartão de crédito e cheque especial, mas a gente tá discutindo isso para que possa chegar em patamares aceitáveis.
O comércio funciona automaticamente em relação ao que acontece no país? Por exemplo, vem um corte na taxa de juros e imediatamente tem uma reação do comércio?
É bem assim. O comércio precisa desse ambiente favorável para o negócio acontecer de maneira qualificada. São as ações macro e as ações micro. Às vezes um problema pontual em Belo Horizonte, por exemplo, estamos falando esses dias agora do aumento da passagem de ônibus, impacta nos custos das empresas que pagam essas passagens antecipadamente. As empresas de ônibus recebem dos empreendedores que no final do mês preenchem o cartão do seu funcionário para o mês seguinte, isso impacta no custo. A gente precisa desse ambiente seguro e da previsibilidade.
Há uma previsão de que ao final de 24 a taxa esteja em 9%. Quanto mais baixo melhor, não tem limite?
Se a gente for pensar friamente, quanto mais baixo melhor, mas a gente tem uma cultura no Brasil de que as pessoas consomem de maneira errada. Não pesquisam um preço, compram de qualquer lugar, então esse gasto cada vez mais leva ao endividamento. Por isso que a gente fala: 'pesquise, negocie, pague à vista para você não fazer endividamento, faça todo esse planejamento financeiro'. Quanto menor melhor, mas a gente sabe que culturalmente no Brasil é importante esse controle para que a gente vá evoluindo nesses entendimentos.
Qual foi a taxa de crescimento esse ano do Comércio?
A gente está falando em torno de 2%. A minha expectativa aqui para Belo Horizonte é em torno de 2,5%, um pouco mais. Eu sou muito otimista por causa da movimentação do ano que a CDL acompanha. Em Belo Horizonte a gente tem o hipercentro, os shoppings e a gente tem cerca de 30 centros comerciais que são bem potentes. É bem diversificada essa concentração do comércio e a gente consegue ter esse número mais otimista.
Depois de uns 40 anos de luta, finalmente saiu a reforma tributária. Como o comércio recebe essa notícia?
É uma notícia excelente. Nós brigamos sempre por isso buscando sempre dois aspectos: que a gente que houvesse a simplificação dos processos e que houvesse também redução da carga tributária. Nós temos o entendimento que se o governo reduzir a carga tributária ele vai, com certeza, aumentar a arrecadação. Ninguém quer sonegar, as pessoas sonegam por necessidade e então buscam outros caminhos. Tem aqueles que sonegam, mas aí é outra história, é questão de polícia, porque estão fazendo coisas erradas. No geral não existe essa questão, porque as pessoas que trabalham querem pagar o imposto, querem deitar a cabeça no travesseiro tranquilamente, ninguém quer fazer coisa errada.
Nós defendemos muito a questão de continuar os benefícios para as micro e pequenas empresas, que são as maiores empregadoras. No Brasil, dos 100% de CNPJs registrados, 71% são MEIs, microempreendedores individuais, então é um país de empreendedorismo. A gente precisa dar continuidade a esse benefício e conseguimos isso. Uma coisa que ainda estamos trabalhando, e que vai vir agora nas leis complementares, é a não elevação da carga tributária. O que a gente está observando é que parece que o comércio e os serviços vão sofrer um aumento de carga em detrimento da indústria e do agro, que é um setor importantíssimo. A gente tem que tomar muito cuidado com isso porque não adianta falar: 'Eu vou aumentar aqui do comércio e serviços', porque isso vai impactar nos dois outros setores. Nem a indústria, nem o agro vivem sem o comércio e sem o serviço. A engrenagem tem que funcionar bem.
Movimentos como o 'tarifa zero' tem proposto a criação de um fundo especial para a melhoria da qualidade do transporte coletivo e subsídio ao sistema. Nessa proposta, parte das empresas da capital contribuiria com um valor em substituição ao vale transporte e isso permitiria o passe livre. A CDL vê com bons olhos essa proposta?
A CDL vê com bons olhos todas as propostas. O que precisamos fazer é discutir, a sociedade civil e a prefeitura têm de ser as protagonistas, porque elas são responsáveis pelo transporte público na cidade. A gente tem que discutir e achar esse bom termo que não pese para ninguém, não pese para o contribuinte. A legislação municipal prevê muita isenção de tarifa para muita gente, muitas categorias, e tem alguém pagando essa conta, e pesa para quem paga. 70% da arrecadação das empresas de ônibus são das empresas que pagam esse cartão vale-transporte antecipado, isso tá pesando como custo.
Agora, se tiver tarifa zero, e tem exemplos de municípios perto de Belo Horizonte que fizeram, a gente tem que observar e discutir. Eu acho que o pessoal do 'tarifa zero' são pessoas responsáveis, interessadas em resolver esse problema, como todos nós que cobramos esse transporte público mais eficiente. Belo Horizonte é uma cidade de bares e restaurantes que precisam fechar cedo porque os funcionários desses estabelecimentos ficam sem transporte. São discussões que a gente tem que fazer, mas tem que ser protagonizado pela prefeitura.
O setor do comércio é um dos mais impactados pela circulação do dinheiro. Qual é o posicionamento da CDL em questões como as medidas de austeridade financeira e de reajuste dos servidores, propostas feitas no projeto do Regime de Recuperação Fiscal (RRF) em discussão na Assembleia?
Esse é outro tema bem polêmico, que é a dívida de Minas Gerais. Uma coisa que a gente sempre pediu, e faz muito na CDL, é mostrar para os empreendedores que é preciso ter a melhor gestão possível, a gente precisa disso no poder público. A gente tá vendo aí os governos municipais, estaduais e o Federal, colocando uma conta do ano que vem em déficit. Como assim? Se eu sou dono de uma empresa, vou ter um prejuízo de R$ 5 milhões no ano que vem, como é que eu vou viver?
Essas questões têm que ser discutidas, porque sempre vai cair no colo de alguém. Ou nós vamos pagar mais, ou quem tá lá vai receber menos, que é a questão dos funcionários públicos. Não adianta fazer ajustes para aprovação de contas usando o dinheiro de alguém, que poderia ser usado em outras coisas para beneficiar todo mundo. Essa questão do RRF em Minas Gerais é uma questão delicada. A gente tem vários atores e o Governo de Minas está preocupado em resolver, mas sei também que entrou o senador Rodrigo Pacheco, outro grande amigo, para ajudar a buscar essa solução e precisa, porque Minas é um estado super importante.
O governo contesta, mas dizem que os servidores poderiam ficar nove anos sem reajuste. Isso é ruim para o comércio?
Isso é ruim, porque cai a renda das famílias. O servidor público é um alvo muito grande aqui em Belo Horizonte e no estado de Minas Gerais. Isso é muito ruim para o comércio, pois não adequa essa renda e eles deixam de consumir. Há essa controvérsia de falar que vai acontecer, que não vai acontecer, mas a gente tá sempre observando e sinalizando para o governo. Tanto é que, quando não estavam recebendo em dia, afetava diretamente o comércio, quando passou a receber em dia melhorou.
Durante o ano diversos arrombamentos aconteceram na região da Savassi. Como está a questão da segurança pública e quais são as perspectivas para o ano de 2024?
A CDL/BH sempre teve uma interlocução muito positiva com as nossas forças de segurança, polícia militar, polícia civil, guarda municipal e corpo de bombeiros, porque isso tudo envolve vários aspectos. A gente tem em Belo Horizonte uma questão muito forte que são os moradores em situação de rua, que há anos tentamos tratar e não conseguimos, a gente não consegue chegar em uma solução. Dentre essa população em situação de rua, vão ter ali pessoas que não são moradores e querem fazer, justamente, ações de criminalidade. Eles criam essa situação e ficam vigiando todo o funcionamento do comércio, aí nós tivemos muito arrombamento e mostramos isso para a polícia militar.
Além dos arrombamentos, se tem os crimes recorrentes, que são os pequenos furtos em que a pessoa vai presa e é solta. Quando chega no juiz de custódia, eles falam que roubaram pouca coisa, mas isso afeta não só o comerciante que sofreu um dano, mas também quem está no entorno e começa a sentir essa questão da insegurança. Com a polícia militar fizemos uma tratativa e passamos várias orientações para os lojistas se prepararem, criamos uma rede de comerciantes dentro de um grupo de WhatsApp para que a gente pudesse conversar. A polícia começou a atuar e nós acompanhamos, mas é preocupante porque o grande problema é uma coisa que se fala pouco, e é essa questão de prender a pessoa e a justiça soltar. Tem pessoas que praticaram esse crime de arrombamento e foram presas mais de 50 vezes e ainda estão na rua.
Eu já fui com o comandante da Polícia Militar no Tribunal de Justiça conversar com o desembargador de custódia e falar que ele está inibindo uma atividade comercial. Quando o desembargador José Arthur Filho, presidente do TJMG, esteve como governador interino, eu apresentei isso para ele e a tratativa está sendo muito bem feita com as forças de segurança, a justiça, para que a gente solucione esse problema.
Como a CDL vê o projeto da prefeitura de revitalizar o Centro de BH?
Desde o primeiro momento que foi anunciado a CDL é parceira da prefeitura junto com outras tantas entidades. A CDL já ofereceu várias tratativas, já tivemos reuniões exclusivas para tratar sobre como que a gente pode comunicar as intervenções que vão correr para os lojistas. Às vezes você vai fazer uma intervenção na porta da loja do comerciante e vai prejudicar o movimento dele durante uma semana, então a gente tem que ter essa previsibilidade.
Durante as obras a gente quer ajudar a prefeitura colocando pessoas para orientar até os consumidores dizendo: 'olha está tendo a obra, mas você pode ter acesso às lojas por esse caminho aqui'. Outra questão é que temos que fazer um movimento grande, movimentos pontuais são importantes, mas se pudessem ocorrer em conjunto. Quando você revitaliza já tem que se preparar. Como é que eu ocupo esses espaços que estão desocupados? Como é que eu faço uma atração de moradores? O centro da cidade precisa de moradores, porque os comerciantes quando dá 19h vão embora e ali fica uma terra de ninguém. Os moradores ajudam a tomar conta.
Então tem muitas coisas para acontecerem, mas a CDL vê com bons olhos esse movimento da prefeitura de Belo Horizonte. E a CDL é parceira para que a gente possa requalificar o hipercentro, que já tem uma estrutura toda pronta. Ali a gente tem uma estrutura de energia, saneamento, calçada, tudo pronto, você não precisa fazer nada, é só aproveitar.
Você tem essa visão de que a requalificação do centro, se bem executada, é até um projeto de inclusão social?
Sim, tenho essa visão. Inclusive, pouco tempo atrás houve duas reformas de prédios e transformaram prédios comerciais em moradias. Comerciantes do hipercentro compraram esses apartamentos para deixarem seus funcionários morarem ali, lógico tem todos os detalhes, mas muitos deles compraram apartamentos para os seus funcionários. E eles adoravam, a gente conversou com alguns que, com 10 minutos, desciam e estavam no trabalho. Se cria uma frequência daquilo que a gente falou: quem vai tomar conta? Essas pessoas, moradores, independente de quem seja, vão tomar conta do hipercentro.
Com esse projeto você vê que vai haver uma mudança de característica no comércio?
Eu acho que pode atrair comércios que não estão lá hoje. Se você atrair um público diferenciado, com um poder aquisitivo melhor, e não precisa nem ser muito melhor, você consegue trazer comércios que hoje tem pouca quantidade, mas que pode atender a exigência desse público. Não só comércio de produtos, mas você pode ter um restaurante melhor, estabelecimentos diferenciados ali que esse público pode usar e que com certeza terá essa atração. Qualificando o ambiente, você atrai pessoas que vão ter ali um poder diferente para atrair o investimento de outras empresas.
Temos muitas lojas sendo fechadas em shopping centers. O que está acontecendo?
Eu comentei aqui que a gente já está com cerca de 30 centros comerciais de bairros. Hoje a mobilidade faz muito isso, a pessoa quer trabalhar perto de casa, fazer sua atividade física perto de casa, buscar compras perto de casa. Essa migração, esse deslocamento é um fator importante. Mas os shoppings também passam por isso, porque tá passando em todo o mundo.
As lojas físicas não estão acabando, a internet está avançando e as lojas estão se adaptando a esse canal novo de venda. Os shoppings estão se adaptando e a gente está vendo, não só aqui no Brasil, mas no mundo, a migração de serviços nos shoppings. O custo de uma loja em um shopping center é alto e você tem que viabilizar o seu negócio ali. Muita gente se dá bem, é importante destacar, mas muita gente acha que é uma aventura e não é. Agora, também a gente tá vendo os shoppings investindo muito nas lojas de classe AAA. O shopping é um lugar seguro, que tem conforto diferenciado, oferece muitas coisas, mas você tem que saber se o seu tipo de negócio cabe ali dentro.