O imbróglio judicial entre a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e a companhia ítalo-argentina Ternium, que se arrasta há mais de uma década, pode ganhar um novo capítulo nesta semana. Está pautado para esta terça-feira (18/6) no Superior Tribunal de Justiça (STJ) o julgamento dos embargos de declaração apresentados pela CSN, envolvendo a disputa societária entre as siderúrgicas. O tema, considerado sensível no mercado, pode colocar em risco a segurança jurídica de negociações de participações em blocos de controle de companhias.
Na briga judicial, a CSN afirma que houve uma mudança na troca de controle da siderúrgica mineira Usiminas em 2011, quando a Ternium comprou as participações dos grupos Votorantim e Camargo Corrêa – uma fatia de 27,7%. Segundo a CSN, essa mudança no bloco de controle obrigaria a Ternium a fazer uma oferta pública de ações (OPA) aos acionistas minoritários. Por outro lado, a Ternium garante que não houve troca de controle, argumento este que foi confirmado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em decisões anteriores.
O desdobramento do caso está nas mãos do ministro Antonio Carlos Ferreira, da 4ª turma do STJ. Até agora, o julgamento está empatado em 2 x 2, cabendo ao magistrado proferir o voto de desempate. A decisão do ministro determinará se a CSN receberá uma indenização de cerca de R$ 5 bilhões a ser paga pela Ternium, conforme defendido pelos ministros Moura Ribeiro e Humberto Martins, ou se o caso voltará para a 1ª instância para a produção de provas materiais, argumento sustentado pela ministra Nancy Andrighi e pelo ministro Villas Bôas Cueva, que acompanhou o voto da ministra.
Não havendo grandes casos na Justiça em torno do "tag along", o julgamento das siderúrgicas é tratado como um "leading case", ou seja, pode influenciar processos similares. Para o mercado, dependendo do resultado do julgamento, isso pode desencadear uma série de ações judiciais no mesmo sentido.
Entenda o imbróglio
A disputa entre as siderúrgicas começou quando a CSN, que também era acionista da Usiminas, afirmou que a transação em que a Ternium comprou as ações da Votorantim e da Camargo Corrêa deveria ter resultado no direito de “tag along”. Pela lei societária, quando ocorre a troca de controle de uma empresa, quem está adquirindo o controle é obrigado a fazer uma oferta pública a todos os outros acionistas minoritários. Esse direito, garantido pelo “tag along”, proporciona proteção aos minoritários.
A CSN alega que houve uma mudança no acordo de acionistas logo após a transação. Eles também sustentam que a suposta troca de controle ocorreu “de forma disfarçada”. Antes da transação, a CVM havia sido consultada e entendeu que a oferta pública de ações não era necessária, pois a Ternium não passou a controlar a Usiminas sozinha, dividindo o poder com a Nippon Steel, que até então era a maior acionista.
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Mesmo assim, a CSN foi à Justiça. A empresa perdeu na 1ª e na 2ª instâncias, onde se entendeu que não houve alienação de controle. Ao chegar no STJ, três ministros votaram a favor da Ternium e dois votaram contra, reafirmando que não houve mudança no controle da Usiminas. Após o julgamento na terceira turma do STJ, a CSN entrou com embargos de declaração, recurso usado quando uma parte acredita que houve alguma omissão, obscuridade ou erro material na decisão. Em geral, o recurso não muda o mérito do julgamento.
A CSN argumenta que houve vício na decisão do STJ e aponta um "fato novo". No ano passado, a Ternium comprou algumas ações da Nippon, assumindo de fato o controle da Usiminas. Este seria o "fato novo" apresentado pela CSN. De acordo com fontes ligadas à Ternium, o argumento da CSN expõe uma contradição, pois o "fato novo" prova que não houve troca de controle anos atrás, apenas em 2023.
Reviravolta
Além disso, logo após o pedido dos embargos de declaração, um dos ministros do STJ que havia votado a favor da Ternium faleceu. O ministro Antonio Carlos Ferreira (que irá desempatar o julgamento) está substituindo o ministro Marco Aurélio Belizze, que votou a favor da Ternium e que agora se declarou impedido de julgar o caso, sem apresentar justificativas.
A nova composição da turma mudou a dinâmica do julgamento. Dois ministros argumentam que houve alienação de controle, enquanto outros dois pedem que o processo volte à 1ª instância para a produção de provas materiais. Isso porque, na 1ª instância, o juiz decidiu a sentença sem exigir materialidade.
Fontes ligadas à Ternium disseram que o resultado do julgamento pode ter impacto imediato no mercado. Isso poderia ocorrer porque, de modo geral, os grupos nacionais têm grupo de controle, estrutura já consagrada no mercado brasileiro.
Caso haja uma decisão favorável à CSN, o resultado reverteria uma decisão que já passou pelas duas instâncias e pelo STJ, e que é baseada em um entendimento da CVM. O mercado teme que esse cenário crie insegurança jurídica no mercado de capitais.
Fontes afirmam que o assunto chegou a ser pauta no encontro entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni, no último sábado, durante encontro do G7. O caso também já foi tópico de conversa entre os chanceleres do Brasil e da Itália.
A reportagem do Estado de Minas procurou a CSN para comentar o caso. A empresa respondeu que "em respeito ao Poder Judiciário, não comenta julgamentos."