Manhattan também abriga Wall Street, onde está o mundialmente conhecido centro financeiro.  -  (crédito: Assembleia de Wall Street/Wikimedia Commons)

Manhattan também abriga Wall Street, onde está o mundialmente conhecido centro financeiro.

crédito: Assembleia de Wall Street/Wikimedia Commons

FOLHAPRESS - O economista Jorge Arbache diz que Wall Street já acordou para o "powershoring", ou seja, para as vantagens da produção próxima de fontes de energia limpa, em países como o Brasil.

 

 

A expressão foi usada por ele para batizar o insight que teve há cerca de dois anos, diante das pressões geopolíticas por "nearshoring" --a produção próxima dos mercados compradores, como os Estados Unidos buscam no México, para reduzir sua exposição à China.

 

 

 

 

O Brasil oferece, na visão de Arbache, uma alternativa melhor na forma de energia limpa e abundante. "Quem tem falado muito [em powershoring] são banqueiros de Wall Street", diz ele. "O BNP Paribas, por exemplo, falou que a grande agenda de crescimento para a América Latina, para eles, é powershoring. O HSBC falou a mesma coisa. O Citi, também."

 

 

Faltam os chineses. Arbache veio a Pequim para tentar convencer aqueles que ele vê como grandes beneficiários potenciais de seu insight. "O Brasil pode ser uma opção válida e importante de destino de fábricas chinesas que querem seguir entrando em mercados ocidentais e estar em compliance [conformidade] ambiental", diz ele. "Esse tema deverá ganhar relevância para os chineses nos próximos meses. Temos que saber explorar a oportunidade."

 

 

 

 

Ele foi por cinco anos, até o mês passado, vice-presidente do Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF). "A China passa por uma espécie de guerra econômica com os EUA e agora a Europa, que se traduz em discriminação e protecionismo", diz, citando veículos elétricos e outros setores. "Ela precisa buscar novos modelos e novas alianças para romper esse tipo de política. Uma solução é produzir em terceiros países."

 

 

Outra é buscar respostas ao protecionismo que argumenta com a pegada de carbono dos produtos chineses. Dá como exemplo o Mecanismo de Ajuste de Carbono na Fronteira (CBAM, na sigla em inglês). "É uma política europeia que olha o impacto de emissão e compara com o que eles usam como benchmark [referência]. Uma forma de a China pegar um atalho é produzir num país onde a matriz elétrica já é verde."

 

 

 

 

O Brasil, diz, tem uma matriz 90% verde e tem muita água. "Água para a gente não é restrição, neste momento pelo menos. E quase todos os processos produtivos que são intensivos em energia também são intensivos em água." Lista aço, celulose, alumínio, cerâmica, vidro, fertilizante.

 

 

No país, conta a favor ainda o custo da energia. "Preço, disponibilidade, se a energia é segura e verde são fatores determinantes de onde uma planta [fábrica] vai estar localizada. Antigamente era mão de obra barata. Acabou, hoje é energia."

 

 

 

 

Professor da UnB, ele sublinha que, para o próprio Brasil, trata-se de produtos importantes por gerarem emprego urbano. "O setor dinâmico da economia brasileira hoje está na áreas rurais: o agro e as minas, minério, petróleo. Eles geram poucos empregos urbanos e, voltados à exportação, pagam relativamente poucos impostos." A principal justificativa interna para o powershoring, diz, vem daí.

 

 

Relaciona entre as vantagens comparativas do Brasil não só energia verde e água, mas estar ancorado em minerais críticos, "que representam a transição", e em biocombustíveis e bioeconomia. "Não se vai inventar a roda. Você já tem vantagem comparativa. Precisa agora converter em competitividade."

 

 

 

 

Falando à reportagem pouco depois de uma palestra para executivos chineses e brasileiros no centro de Pequim, em que apresentou powershoring como "uma estratégia corporativa para a era da descarbonização", o economista afirmou que "isso aqui é tudo microeconomia, não precisa nada de político, em princípio nem tem investimento estatal".

 

 

Mas o governo brasileiro acompanha de perto. No ano passado, organizou uma conferência com ministros e outras autoridades, intitulada O Powershoring e a Neoindustrialização Verde do Brasil. Segundo Arbache, "nos seis eixos da nova política, Nova Indústria Brasil, o quinto conceito, o da energia limpa e industrialização, é powershoring".

 

 

 

 

A expressão é corrente entre dirigentes da Apex Brasil (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos) e do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), além do próprio Mdic (Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços).

 

 

O presidente da Apex, Jorge Vianna, que também viajou a Pequim, diz que "powershoring significa que existe hoje uma grande oportunidade para o Brasil, pois mundialmente e cada vez mais as empresas querem produtos com energia limpa".

 

 

 

 

Diz que "é importante também incluir a área de minerais críticos encontrados no Brasil, fundamentais para a produção de energia limpa".

 

 

Falta combinar com os chineses. Arbache sugere uma experiência para as próprias gigantes chinesas de aço, que também enfrentam protecionismo, agora oriundo das concorrentes brasileiras, que pressionam o governo. "Você tem conexões altamente atrativas para produzir aço no Brasil, para dali ele ser exportado", diz. "De imediato, não tem as restrições geopolíticas, e o aço sai verde."