*Conteúdo produzido por Flávio Castro

A experiência de intercâmbio cultural é uma jornada de imersão em novas realidades, repleta de desafios, aprendizagens e transformações pessoais. Três jovens – as alemãs Zoe Shu-Yi Kroll e Clara Julia Spörl, que vieram ao Brasil, e o brasileiro Davi Gontijo Leitão, que passou um ano na Austrália – revelam como essas vivências afetaram suas percepções e moldaram suas perspectivas sobre o mundo. Suas histórias destacam desde o acolhimento caloroso nas escolas brasileiras até as dificuldades de adaptação em uma casa multicultural na Austrália.

Acolhimento e Integração nas Escolas Brasileiras

Zoe Shu-Yi Kroll, de 16 anos, e Clara Julia Spörl, de 15, deixaram a Alemanha para embarcar em uma experiência de intercâmbio em Belo Horizonte, Brasil. Ao chegarem, depararam-se com um ambiente educacional que, embora diferente, as recebeu de braços abertos. Acostumadas ao formalismo das escolas alemãs, onde a interação entre alunos e professores é mais polida, as duas ficaram impressionadas com a proximidade e a informalidade das relações nas escolas brasileiras.

Zoe comentou: “Foi surpreendente perceber como os alunos se sentem à vontade para compartilhar aspectos pessoais com seus professores, algo que na Alemanha não é comum.” Essa abertura e informalidade, segundo Clara, contribuíram para criar um ambiente escolar mais acolhedor, facilitando sua adaptação ao novo contexto. “No Brasil, os professores não são apenas figuras de autoridade, mas também se mostram disponíveis para conversar e entender o que se passa com os alunos”, complementa Clara.

A receptividade não se limitou ao ambiente escolar. As duas jovens foram rapidamente incluídas nas atividades diárias pelos colegas de classe, que fizeram questão de integrá-las ao grupo desde o primeiro dia. “Meus colegas foram essenciais para que eu me sentisse parte da turma. Desde o início, eles me incluíram em todas as atividades, tornando o processo de adaptação muito mais fácil e agradável”, relata Zoe.

Apesar do acolhimento caloroso, Zoe e Clara enfrentaram um contraste cultural significativo no que diz respeito à sustentabilidade. Vindo de um país onde a reciclagem e o consumo consciente são práticas amplamente adotadas, ambas notaram a ausência de uma preocupação semelhante no Brasil. “Foi um choque perceber que o uso de plástico é tão comum aqui e que não há uma separação rigorosa do lixo como na Alemanha”, observa Zoe. Clara também destacou a diferença na consciência ambiental, mencionando que essa experiência a fez valorizar ainda mais as práticas sustentáveis de seu país natal. “Na Alemanha, a questão ambiental está enraizada no cotidiano das pessoas, enquanto aqui no Brasil, percebi que ainda há muito a ser feito nessa área”, completa Clara.

Convivência multicultural e crescimento pessoal na Austrália

Davi Gontijo é aluno de Ciências Sociais da UFMG e foi estudar na Austrália

Arquivo pessoal

Enquanto Zoe e Clara exploravam as complexidades culturais do Brasil, Davi Gontijo Leitão, de 19 anos, vivia uma experiência de intercâmbio em Melbourne, Austrália. O estudante de Ciências Sociais da UFMG foi estudar inglês por seis meses, período que acabou estendendo por mais seis meses, durante os quais trabalhou como entregador e em uma rede de lanchonetes.

Davi enfrentou um cenário de desafios completamente diferente daquele vivido pelas jovens alemãs no Brasil. Em Melbourne, ele compartilhou moradia com estudantes de diversas nacionalidades, o que exigiu uma dose extra de paciência e flexibilidade. “Morar em uma casa compartilhada com pessoas de várias partes do mundo foi uma experiência enriquecedora, mas também bastante desafiadora”, comenta Davi. Ele conta que, apesar da riqueza cultural que essa convivência proporcionava, havia dificuldades práticas que muitas vezes geravam atritos, especialmente em relação aos hábitos de limpeza na cozinha e no banheiro. “Em algumas ocasiões, a falta de higiene era um problema, e a barreira linguística tornava a comunicação sobre essas questões mais complicada”, lembra.

A convivência multicultural, no entanto, não foi o único desafio que Davi enfrentou. O jovem ressalta que, apesar de ser fluente em inglês, chegou à Austrália sem conhecer ninguém, o que o obrigou a desenvolver uma maior independência e a buscar ativamente novas conexões sociais. “Estar em um ambiente totalmente novo e sem nenhuma rede de apoio inicial me fez sair da minha zona de conforto. Eu precisei aprender a lidar com a solidão e a construir novas amizades em um curto período de tempo”, reflete Davi. Ele acrescenta que essa experiência o ajudou a crescer como pessoa, aumentando sua resiliência e autonomia. “Foi uma situação desafiadora, mas que me trouxe muito aprendizado e me fez valorizar ainda mais as relações que construí ao longo do intercâmbio.”

Davi também teve que se adaptar a peculiaridades do cotidiano australiano, como o uso da “mão inglesa” no trânsito, algo que quase lhe causou alguns acidentes. “Demorei um pouco para me acostumar com a direção ao contrário. Tive alguns sustos, mas, no final, me adaptei”, comenta com humor.

Desafios e descobertas que transformam

As experiências de Zoe, Clara e Davi revelam o quanto um intercâmbio pode impactar a vida de um jovem. Enquanto as alemãs aprenderam sobre o calor humano e a informalidade brasileira, Davi descobriu os desafios e as recompensas de conviver com uma diversidade cultural inédita para ele. Todos enfrentaram dificuldades, seja na adaptação ao novo sistema educacional, na gestão da convivência multicultural ou na busca por sustentabilidade, mas também colheram frutos valiosos dessas vivências.

Zoe e Clara voltaram à Alemanha com uma nova compreensão sobre a importância das relações humanas e uma visão mais crítica sobre questões ambientais. Davi, por sua vez, retornou ao Brasil com uma bagagem rica em experiências multiculturais e um senso renovado de independência. Suas histórias mostram que o intercâmbio é mais do que uma oportunidade acadêmica; é uma jornada de autodescoberta e de construção de um olhar mais amplo e empático sobre o mundo.

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Sobre o autor: Flávio de Castro é pós-graduado em Letras pela Unicamp e escritor. Escreveu Desaparecida (2018) e Minério de Ferro (2021), além de colaborar em diversas revistas, jornais e suplementos. Atualmente é pesquisador no Posling do CEFET-MG e professor de Literatura e Interpretação de Textos no Curso DetOnline.

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