O trabalho intermitente, uma modalidade de contratação introduzida pela reforma trabalhista no Brasil em 2017, tem suscitado debates acerca de sua eficácia e impacto no mercado de trabalho. Esse modelo estabelece que a prestação de serviços será de forma não contínua, ou seja, há alternância entre períodos de atividade e inatividade. A remuneração é feita com base nas horas trabalhadas, o que pode resultar em variações significativas nos rendimentos mensais dos trabalhadores.
Apesar das expectativas iniciais de criação de milhões de postos de trabalho, dados de 2023 do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) apontam que a realidade é bastante diferente. Com apenas 417 mil vínculos intermitentes, essa modalidade representa menos de 1% do total de vínculos formais no setor privado. Ademais, há preocupações quanto à remuneração abaixo do salário mínimo e a falta de geração de renda em muitos casos.
Por que a remuneração do trabalho intermitente é baixa?
A principal crítica ao trabalho intermitente diz respeito à baixa remuneração. Em 2023, a média salarial mensal dos trabalhadores intermitentes foi de R$ 762, correspondendo a 58% do salário mínimo daquele ano, que era de R$ 1.320. Um fator que contribui para essa situação é o pagamento por hora trabalhada, que não proporciona uma renda diária ou semanal fixa. Além disso, 76% dos contratos geraram remuneração inferior ao salário mínimo ou não registraram renda alguma.
O setor de serviços é onde a maioria dos contratos está concentrada, representando 60% dos vínculos intermitentes. No entanto, mesmo com um maior volume de contratação, a remuneração muitas vezes fica abaixo do esperado, expondo a vulnerabilidade desse modelo de contratação.
Qual é o impacto do trabalho intermitente na estabilidade de emprego?
O trabalho intermitente não só afeta a remuneração, como também a segurança e estabilidade dos trabalhadores. Em 2023, aproximadamente 41,5% dos vínculos intermitentes não geraram renda ao longo do ano. No setor da construção, esse percentual foi de 51,7%, enquanto no setor de serviços chegou a 40%. Isso significa que muitos trabalhadores, apesar de estarem contratualmente vinculados, passaram longos períodos sem qualquer atividade ou remuneração.
Além disso, ao incluir aqueles que permaneceram sem atividade ao longo do ano, a média mensal recebida cai ainda mais, para R$ 542. Isso reflete um cenário em que somente 37% dos meses trabalhados resultaram em ganhos de pelo menos um salário mínimo, agravando a insegurança financeira entre os trabalhadores.
Como mulheres e jovens são impactados pelo trabalho intermitente?
Mulheres e jovens enfrentam desafios adicionais no mercado de trabalho intermitente. A média salarial mensal para esses grupos foi de R$ 661, valor que é apenas metade do salário mínimo. Quando considerados os contratos ativos que não geraram atividade, essa média para mulheres cai para impressionantes R$ 483. Isso revela um quadro de precariedade, onde a instabilidade se reflete ainda mais na renda dessas classes.
Em média, as mulheres conseguiram apenas uma remuneração mensal equivalente ao salário mínimo para cada quatro meses de trabalho efetuado sob esse regime. Tal situação destaca as desvantagens enfrentadas por mulheres e jovens em acordos de trabalho intermitente, exigindo uma revisão sobre se essa modalidade realmente atende às necessidades do público alvo.
Trabalho intermitente: solução ou problema?
A modalidade de trabalho intermitente é vista por alguns como uma solução inovadora para a redução do desemprego, oferecendo flexibilidade tanto para os empregadores quanto para os empregados. No entanto, os dados mostram que essa flexibilidade vem acompanhada de insegurança financeira, baixa remuneração e falta de estabilidade.
O desafio de equilibrar a criação de empregos com a garantia de condições mínimas de trabalho, como um salário adequado e previsibilidade de renda, persiste. A realidade tem mostrado que o trabalho intermitente, em sua forma atual, falha em atender efetivamente às necessidades dos trabalhadores, especialmente dos mais vulneráveis, como mulheres e jovens. Portanto, um debate contínuo e ajustes são necessários para que essa modalidade de contratação possa de fato contribuir positivamente para o mercado de trabalho brasileiro