O estudo do impacto do estresse e dos traumas em gerações subsequentes tem revelado insights significativos sobre a transmissão de características adquiridas. Em 1982, o cerco à cidade de Hama, na Síria, resultou em um massacre que deixou marcas profundas não apenas nos sobreviventes, mas também em seus descendentes. Pesquisas recentes têm mostrado que os netos de mulheres grávidas durante esse período apresentam alterações em seu genoma, mesmo sem terem vivenciado diretamente o evento traumático.
Essas descobertas oferecem uma visão sobre como experiências traumáticas podem influenciar gerações futuras através de mecanismos epigenéticos. Diferente de mutações genéticas, essas alterações não modificam a sequência do DNA, mas afetam a expressão dos genes, potencialmente influenciando a saúde e o comportamento dos descendentes.
O que são fenômenos epigenéticos?
Os fenômenos epigenéticos referem-se a modificações no DNA que não alteram a sequência genética, mas afetam a forma como os genes são expressos. Isso pode ocorrer através de processos como a metilação do DNA e a modificação de histonas. Esses processos adicionam pequenas marcas químicas aos genes, alterando seu comportamento sem modificar a estrutura genética subjacente.
Essas modificações podem ser desencadeadas por fatores ambientais, como o estresse e eventos traumáticos. As “small chemical flags” ou sinais químicos são adicionados aos genes em resposta a esses estímulos, influenciando a atividade genética e, por conseguinte, a saúde e o desenvolvimento dos indivíduos.

Como o estresse afeta gerações futuras?
Pesquisas conduzidas por Connie Mulligan e sua equipe investigaram o impacto do estresse em três gerações de imigrantes sírios. Algumas dessas famílias haviam sobrevivido ao ataque a Hama, enquanto outras enfrentaram a guerra civil na Síria. Os estudos focaram em identificar “tell-tale chemical flags” nos genomas dessas famílias, buscando evidências de transmissão intergeracional de estresse.
Os resultados mostraram que netos de sobreviventes de Hama apresentavam 14 áreas do genoma modificadas devido à violência sofrida por seus antepassados. Essas alterações epigenéticas não apenas refletem a experiência traumática, mas também podem predispor os descendentes a condições de saúde específicas, como doenças relacionadas ao envelhecimento.
Quais são as implicações para a saúde e a sociedade?
As implicações dessas descobertas são vastas, tanto para a saúde pública quanto para a compreensão social do trauma. Indivíduos expostos a traumas no útero, por exemplo, podem apresentar sinais de envelhecimento epigenético acelerado, aumentando a suscetibilidade a doenças como diabetes e outras condições associadas à idade avançada.
Além disso, o reconhecimento de que traumas podem ter repercussões em gerações futuras pode promover maior empatia e compreensão entre as pessoas. Isso também pode influenciar políticas públicas, incentivando a criação de programas de apoio e intervenção para populações afetadas por conflitos e desastres.
O estudo do impacto do estresse intergeracional no genoma humano continua a evoluir, oferecendo novas perspectivas sobre a herança de traumas e suas consequências. Compreender esses mecanismos pode ser crucial para desenvolver estratégias de intervenção eficazes e para apoiar comunidades afetadas por eventos traumáticos. A pesquisa contínua nessa área promete revelar ainda mais sobre a complexa interação entre genética, ambiente e saúde.