Exposição

Exposição "Nó – o enlace da renda e da chita", que fica em cartaz até 1º de dezembro, na Casa Fiat de Cultura

crédito: Leo Lara/Studio Cerr

 

Para contar a história da chita e sua ligação com a alma dos brasileiros, seria preciso um livro como o “Que chita bacana”, concebido e idealizado por Renata Melão e Renato Imbroisi, que se debruça com propriedade sobre a trajetória desse tecido tão faceiro e extraordinário.


No entanto, aqueles que quiserem obter um resumão do assunto, têm a oportunidade de visitar a exposição “Nó – o enlace da renda e da chita”, que fica em cartaz até 1º de dezembro, na Casa Fiat de Cultura.


São 25 modelos criados por grandes nomes da moda de diversas gerações, incluindo os mineiros Graça Ottoni, Renato Loureiro, Victor Dzenk, Ronaldo Fraga, Luiz Cláudio e Aislan Batista. A mostra conta também com um manto criado por Criola e com uma obra de Ana Vaz, famosa pela intimidade em tecer fios artesanalmente por meio do tricô. E tem ainda looks de estilistas de fora do estado: Lino Villaventura, Amapô, Gloria Coelho, André Lima, Dudu Bertolini, entre outros.


Mas, afinal, que chita é essa? A pergunta, que inaugura o primeiro capítulo do livro de Renata Mellão, uma das curadoras da exposição em Belo Horizonte, esclarece a sua origem. O tecido possui ancestrais ilustres: surgiu na Índia medieval e conquistou europeus, em um domínio invertido à colonização.
O nome vem do sânscrito e atravessa idiomas, assim como a chita transpôs mares, povos e culturas para virar vestidinho de menina nas quadrilhas juninas, cortina e toalha de mesa em casas espalhadas pelos quatro cantos do país. Esse símbolo de brasilidade, com presença marcante em festas populares e religiosas, com cores e temperos de ancestralidade, de quando em quando ganha espaço nas passarelas, produções de moda e galerias de arte.


Nos anos 2000, por exemplo, o tecido foi catapultado a novo status de relevância em decorrência do livro, que, por sua vez, originou a exposição “A chita na moda”, realizada no Museu da Casa Brasileira. Dali, ela foi diretamente para Paris e aportou nas Galeries Lafayette na programação do Ano do Brasil na França.


Parte desse acervo original integra a mostra em vigência na Casa Fiat junto ao trabalho dos designers mineiros, conforme explica a professora Carolina Bicalho, uma das suas curadoras e especialista no assunto. De 2011 a 2014, ela ocupou a função de coordenadora geral de desenvolvimento de produtos da Horizonte Têxtil, o que significava desenvolver as coleções e a direção de arte e estamparia da fábrica.


“Fizemos um catálogo completo sobre a chita, que era praticamente o carro-chefe da empresa. Ela possuía um acervo de cilindros gravados em chita que só se comparava ao da Cedro (antiga Cedro Cachoeira). Nós inovamos aplicando os seus desenhos característicos nas bases de tricoline, popeline, sarja e até sarja com lycra”, relata. É bom lembrar que o tecido alcançou o território nacional após sua produção em escala pelas centenárias fábricas têxteis de Minas Gerais.


Partiu de Carolina o convite para que Luiz Cláudio, diretor-criativo da Apartamento 03, participasse da exposição com um modelo moldado na alfaiataria precisa pela qual sua marca é conhecida. “Convidei também a Criola, grafiteira e estilista mineira com reconhecimento internacional, responsável pelo design dos uniformes da equipe olímpica brasileira de skate em Paris, além de ter várias cocriações com a Adidas e com a Nike”. Representando a mulher jovem e negra, ela criou o Manto Ukunatã inspirado na matéria-prima.


Aislan Batista, que desponta como uma grande promessa da moda, fez sua estreia no circuito da arte. A partir de um mix de estampas da chita, criou buquês aplicados sobre uma base de linho. “Tudo foi tingido com beterraba para dar uma uniformizada. Fui colocando os buquês, rebordando com linha de algodão e contas de madeira rústicas. Tiras enroladas, como se fossem vidrilhos. formam as franjas do look”, ele explica.


Rendas

Enquanto a chita remete ao popular, a renda, com origem europeia, flerta com a delicadeza e refinamento. A exposição revela as possibilidades dessa intersecção. Parte dos looks exibidos na capital mineira são fruto da exposição Renda-se, projeto do Museu A Casa do Objeto Brasileiro em parceria com o estilista Dudu Bertolini.


“Ele visitou vários clusters de rendeiras do Nordeste e, junto com outros estilistas, usando vários tipos de rendas fabricadas pelas comunidades de cada região, criaram looks únicos”, explica Carolina. Na sua curadoria, ela foi buscar Zuzu Angel, costureira curvelana, pioneira em destacar a brasilidade em seus desfiles-manifesto nos anos 1970. O vestido de noiva assinado por ela, emprestado pela Fundação Zuzu Angel, é uma preciosidade.


Em uma homenagem à chita e à renda, unindo as duas pontas, a artista plástica Ana Vaz criou uma instalação especialmente para a mostra. Ela utilizou a técnica do tricô, com cerca de 4.500 pontos, em grande escala, para construção da trama. Foram usados 200 metros de tecido provenientes da Fabril Mascarenhas, cortados em tiras de 20 centímetros.


Entre outros objetos e vídeos, o público também poderá conferir ensaios realizados, entre 2005 e 2015, pelos premiados fotógrafos de moda Jacques Dequeker e Guilherme Licurgo. A cenografia da exposição é assinada pelos arquitetos Paulo Waisberg e Clarissa Neves. O evento é uma realização conjunta da Casa Fiat de Cultura e do Museu A CASA do Objeto Brasileiro em parceria com a Escola de Design da UEMG.