Nivia Machado
Especial para o EM
Crescimento urbano desordenado ameaça manancial da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), aponta estudo realizado pela Universidade Federal de Minas Gerais. Amostras retiradas da Lagoa de Santo Antônio, em Pedro Leopoldo, ao longo de quatro períodos diferentes no decorrer de um ano, detectaram a presença da bactéria Escherichia coli – encontrada em fezes humanas e de animais – proveniente de esgoto, fossas e águas pluviais, embora o manancial esteja localizado dentro da Área de Proteção Ambiental (APA) Carste de Lagoa Santa. Em quantidades elevadas, esse micro-organismo, assim como os coliformes fecais, também detectados nas amostras, podem pôr a saúde da população em risco. Também foi registrada a presença de fósforo, que, em grandes quantidades nas águas, pode levar à proliferação desenfreada de algas responsáveis por limitar e esgotar o oxigênio para os peixes e outros organismos.
Coordenado pelo Instituto de Geociências (IGC) e realizado por uma equipe multissetorial da UFMG, o diagnóstico é uma das etapas de pesquisa que deve culminar em projeto técnico de revitalização da bacia da lagoa. Segundo a coordenadora da pesquisa, a professora do Departamento de Geologia da UFMG Maria Giovana Parisi, coliformes fecais também foram encontrados em todas as fases da coleta na área onde fica a Estação Elevatória de Esgoto Lagoa de Santo Antônio II, da Copasa, estrutura destinada à transferência dos esgotos de uma cota mais baixa do bairro para outra mais alta.
O diagnóstico ainda detectou a necessidade de retirada de um sistema de esgoto que passa por dentro da Lagoa de Santo Antônio. “Colocamos um ponto de monitoramento perto da elevatória da Copasa e vimos que tubulação subterrânea drena o esgoto da bacia toda para ela. Essa tubulação deve ser retirada, mas para que isso ocorra, os níveis de água da lagoa têm que baixar para a realização das obras”, disse.
De acordo com o gerente regional da Copasa, José Cláudio, a rede de esgoto foi instalada quando a lagoa estava seca e a companhia de saneamento terá que reavaliar o seu sistema quando a água baixar. “O que temos visto é que a água não vai baixar tão cedo, estamos aguardando a finalização dos estudos que vão indicar a linha geográfica de cota da lagoa para, a partir daí, fazer a remoção da tubulação”.
Próximo a essa estação elevatória, ao menos 10 famílias vivem em constante medo de inundação. Moradora da Rua Luís Pires Guimarães há mais de 50 anos, Maria Madalena da Silva, de 82, já viu parte da rua ficar submersa. As águas avançaram sobre via que dava acesso entre as margens manancial. “Minha rua está virando um ribeirão a cada chuva. Quando chove, toda a água e lixo do bairro descem para cá. Asfaltaram o bairro, mas não se preocuparam com a drenagem da água da chuva. Vêm lixo, água de esgoto e sujeira para a minha casa.”
Maria Madalena suspeita que um sumidouro, ponto em que um curso d'água superficial penetra no solo, foi tampado, impedindo o escoamento da água pluvial para o subterrâneo da lagoa. “Tem uns 30 anos que ela está enchendo. Mesmo nos períodos de estiagem a água não baixa, parte da rua está debaixo d’agua e temo que daqui a uns anos será a minha casa.”
Morador próximo a outro trecho da margem da Lagoa de Santo Antônio, na Rua Nadécio Felipe Teixeira, o pedreiro Eldon da Silva diz que o adensamento populacional provocado por novos loteamentos próximos ao bairro tem causado muitos transtornos a quem vive perto do manancial. Ele deseja a revitalização da área e indenização justa caso o imóvel tenha que ser desapropriado. "Fizeram uma manilha de água de loteamento que sai na minha rua. Durante chuva no início do mês, a água estourou tudo. Estou cansado de ver esgoto jorrando no solo", conta.
SUMIDOURO
O diagnóstico da UFMG também indica a possível existência de barramento do sumidouro da lagoa por uma antiga empresa que atuava na mineração na região. Segundo a professora Maria Giovana Parisi, atualmente três mineradoras atuam em áreas próximas à Lagoa de Santo Antônio e fazem detonações diariamente. A coordenadora do diagnóstico explica que a lagoa não é alimentada apenas com a água pluviométrica e que aquífero subterrâneo contribui com seu volume. “Precisamos ainda entender qual o caminho feito pela água em seu subterrâneo. Quando há seca, a lagoa é alimentada pelo aquífero, que é extremamente frágil”, ressalta.
A coordenadora de sustentabilidade da CSN Cimentos, empresa situada próxima à Lagoa de Santo Antônio, Michaely Reis disse que aguarda os resultados finais do diagnóstico para que a empresa possa colaborar com a solução do problema.
Para o secretário municipal de Meio Ambiente, Mauro Lobato, é importante ainda o envolvimento do Legislativo municipal na reavaliação da legislação de uso e ocupação do solo. Segundo ele, o material do diagnóstico pode ainda nortear a elaboração do Plano Diretor, que será feita em breve. “Temos que ter um olhar diferente sobre o crescimento do vetor norte, para que possamos salvaguardar o patrimônio da Lagoa de Santo Antônio. O diagnóstico elaborado pela UFMG vai servir de instrumento de orientação para ações na administração pública”, diz.
O estudo que culminará na proposta de revitalização da Lagoa de Santo Antônio é fruto da demanda da população de Pedro Leopoldo, com apoio da ONG Lagoa Viva e envolve equipe multidisciplinar de pesquisadores e alunos da UFMG dos departamentos de Geografia, Engenharia Hidráulica, Botânica, Cartografia e os setores de Hidrogeologia, Paleontologia e Espeleologia.