O ano foi marcado em Minas Gerais ondas de calor extremo que provocaram temperaturas recordes e baixa umidade do ar. Ao se locomover pela cidade nesses dias mais quentes, os passageiros de transporte por aplicativo acabam optando pelo uso do ar-condicionado.
Alguns motoristas, porém, estão cobrando uma taxa extra para ligar o ar-condicionado no carro. No Rio de Janeiro e em São Paulo, essa cobrança extra foi relatada nas redes sociais por passageiros surpreendidos nos veículos com um aviso: se quiser o ar-condicionado ligado, teria que contribuir diretamente ao condutor com um valor que varia entre R$ 1 e R$ 3, via PIX.
A taxa extra cobrada por motoristas de aplicativo é tema de discussão da Comissão de Mobilidade Urbana, Indústria, Comércio e Serviços, nesta quinta-feira (30/11), às 13h30, em uma audiência pública na Câmara Municipal de Belo Horizonte.
A prática é considerada abusiva pelos órgãos de Defesa do Consumidor. É o que afirma o coordenador do Procon da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, Marcelo Barbosa. “Eles podem cobrar o ar desde que ele informe previamente no aplicativo. Entretanto, se a pessoa entra no carro e vê uma plaquinha lá informando, é uma prática abusiva”, diz.
Marcelo explica que, quando o consumidor entra no aplicativo, ele recebe uma oferta, que mostra o preço da corrida, que deve conter todas as informações. “No Código de Defesa do Consumidor, o artigo 31 fala que na oferta você tem que informar tudo a respeito do produto, do serviço, inclusive o preço dele. Então, tem que avisar lá na oferta que o preço não inclui o uso do ar-condicionado, que custa X. Então, isso é uma responsabilidade do aplicativo”, aponta.
Caso o passageiro presencie essa prática, Marcelo recomenda que se faça um registro, como uma foto. Pegue a placa do carro, o nome do motorista, agende o atendimento ao Procon e encaminhe a reclamação para que o aplicativo seja notificado. “Existe a possibilidade de o consumidor conversar com o aplicativo, mas tem que fazer a denúncia ali: 'não fui informado por vocês sobre cobrança de ar-condicionado, quando entrei no carro tinha um aviso lá'”, explica.
Marcelo avalia que a prática só prejudica todas as partes. “Quem sai perdendo é o aplicativo e o motorista, porque o consumidor vai procurar uma concorrência que informe a ele com antecedência ou que, de preferência, não cobre dele.”
Motoristas da capital não concordam com a prática
Os motoristas de aplicativo da capital mineira relatam que não estão cobrando pelo uso do ar-condicionado e que não conhecem a prática com amigos que trabalham no meio. “Eu acho antiético. Quando está calor eu volto com ar-condicionado para meu próprio bem-estar. Agora, tirar isso de mim para uma economia insignificante não dá. Eu ganho até gorjeta, o pessoal elogia quando entra no carro fresquinho”, aponta Leandro Ribeiro, que trabalha, desde 2015, como motorista de aplicativo.
Cléfesson Augusto Barros, seis anos de aplicativo, diz que não cobra e não conhece quem cobra. “Acho errado quem faz isso, mas é um problema para os motoristas de duas formas, primeiro o ar-condicionado ligado vai diminuir a rentabilidade do motorista, ou seja, vai gastar mais combustível e o aplicativo não vai ressarcir esse valor. O outro é que um entra e pede para ligar, o outro entra pede para desligar e fica nesse esquenta e fria, o organismo da pessoa uma hora não vai aguentar”, destaca.
Assim como o coordenador do Procon, Cléfesson acredita que a melhor maneira seja uma opção dada pelo aplicativo, em que a pessoa escolhe se vai pagar uma taxa pela utilização do ar, mas diretamente para o aplicativo, que repasse o valor para o motorista.
O ex-condutor de app Vinícius Hipólito e que atualmente trabalha na área de construção civil, não concorda com a cobrança. “O valor repassado para o motorista é injusto. Se o app melhorar no pagamento pelos serviços prestados, não teria essa prática desnecessária”, lembra.
Posicionamentos dos sindicatos e aplicativos
A presidente do Sindicato dos Condutores de Veículos, Simone Almeida, disse que não vai se posicionar antes da audiência desta quinta, que somente lá vai apresentar os argumentos.
A InDrive diz que o preço da viagem ocorre exclusivamente entre motorista e passageiro, portanto eles recomendam que o passageiro quanto os motoristas tenham liberdade de acertar os detalhes da próxima viagem, com todas as alternativas, de forma clara, aberta e transparente. “Vale ressaltar que, em Manaus, capital amazonense, estamos testando a categoria 'ar-condicionado ligado'. Uma modalidade que permite ao passageiro selecionar diretamente corridas com ar ligado”, informa.
O Uber reforça que o Código da Comunidade Uber estabelece que o motorista parceiro deve realizar manutenção para garantir as condições de funcionamento de todos os itens do veículo, incluindo aqueles exigidos pela legislação, e que usuários não devem aceitar cobranças fora da plataforma da Uber, que representam violação ao Código e podem levar à desativação da conta responsável.
“A temperatura do veículo, assim como outros aspectos como rádio/música, faz parte das preferências de viagem que podem ser combinadas mutuamente entre o motorista parceiro e o usuário para uma viagem confortável para todos. Tanto o parceiro quanto o usuário podem cancelar uma viagem e reportar ao suporte caso não se sintam confortáveis com alguma situação, e também contamos com o sistema de avaliação mútua em que a experiência em cada viagem pode ser avaliada por ambas as partes, com o objetivo de tornar as viagens cada vez melhores para toda a comunidade”, aponta a Uber.
A 99 informa que a utilização ou não do ar-condicionado deve ser combinada entre motorista parceiro e passageiro para que a viagem ocorra de forma confortável para ambos. “O bom senso, respeito, empatia e gentileza são fundamentais para que a experiência do passageiro e do motorista parceiro seja a melhor possível. Após a viagem, tanto os condutores quanto passageiros são incentivados a avaliar suas corridas, podendo registrar eventuais ocorrências”, relatam.
*Estagiário com supervisão do subeditor Diogo Finelli.