O tradicional grupo Zé Pereira da Chácara, famoso pelos bonecões que desfilam nos dias de carnaval pelas ruas da cidade histórica de Mariana, na Região Central de Minas Gerais, desde o século XIX, está ameaçado de extinção. Uma dívida ativa no município e um processo no Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE-MG) ultrapassa R$ 170 mil.
“Podemos dizer que essa é a pior fase que o Zé Pereira enfrentou desde a sua criação e olha que segundo memória oral dos moradores mais antigos, o bloco foi fundado em 1846 e de lá para cá já enfrentou diversos desafios” afirma o presidente da Organização Folclórica Zé Pereira da Chácara, Darlan Ferreira.
O presidente do grupo conta que descobriu o valor exato da dívida depois de assumir o cargo em outubro de 2023. Ele conta que após o grupo Zé Pereira da Chácara ser tombado como patrimônio imaterial da cidade de Mariana, no ano de 2013, a agremiação conseguiu, em 2017, por meio do Conselho Municipal do Patrimônio Cultural de Mariana (Compat) um valor de aproximadamente R$ 90 mil para a reforma dos bonecos e da sede da organização.
De acordo com o relatório do TCE-MG, o processo foi instaurado porque houve omissão no dever de prestação de contas sobre o apoio financeiro dado pela prefeitura ao grupo cultural.
Darlan relata que páginas de livro da ATA das reuniões foram arrancadas e assim ficou difícil de rastrear o caminho do dinheiro recebido em 2017 para a reformados bonecos e do Complexo Desportivo Toca do Zé Pereira, a sede do grupo, que segundo o atual presidente ainda está precisando de reformas.
“Por falta de prestações de contas pela gestão anterior e com o acréscimo de juros, o valor atual da dívida é de R$177 mil, estou avaliando a possibilidade de entrar na justiça para obter respostas sobre os recursos recebidos em 2017”.
O presidente afirma que com a atual dívida, a Organização Folclórica Zé Pereira da Chácara está impedida de receber recursos do município e com a aproximação do carnaval de 2024, a preocupação dos membros tem aumentado com a possibilidade de não ter recursos e tempo para as reformas do bonecos gigantes. “Tivemos o apoio financeiro no valor de R$ 5 mil de uma empresa, esse valor ajuda, mas não possibilita a continuidade das nossas atividades”.
A reportagem procurou a ex-presidente da Organização Folclórica Zé Pereira da Chácara, Maria José Batista, mas até o final desta matéria não obteve resposta.
De acordo com vereador, Juliano Gonçalves (Cidadania), a dívida impede o zé pereira de receber os repasse e subvenções da prefeitura e que o Legislativo vai realizar um reunião na Câmara Municipal com a presença da prefeitura e Procuradoria Geral do Município para encontrar uma solução.
Sobre o Zé Pereira da Chácara
A presença dos cortejos dos catitões “Zé Pereiras” remonta às antigas festas do Rei Momo no Brasil do século XIX. A tradição de desfilar no dias de carnaval com bonecos cabeçudos veio de Portugal e a brincadeira foi incorporada em diversas cidades brasileiras.
De acordo com o dossiê de registro do grupo Zé Pereira da Chácara, o primeiro documento da tradição surgiu na primeira cidade de Minas Gerais em 1899 por um jornal católico. O documento relata que a festa começou com batuques feitos por pessoas escravizadas que pertenciam à Chácara do Barão. A festa era conhecida como “Momento da Alegria” momento em que os escravizados pintavam burros e se pintavam e saíam pelas ruas de Mariana.
Segundo o dossiê essa tradição antecede os registros do jornal católico e relata que um sapateiro português, em 1846, confeccionou os primeiros catitões e ensinou aos moradores da chácara, a tradição que dura até os atuais dias.
"A despretensiosa brincadeira se tornou uma das mais antigas manifestações culturais do estado. Atualmente são mais de 100 bonecos, nos dias de carnaval costumamos homenagear os importantes escritores e historiadores que fazem parte de Mariana, como Fernando Moraes, Hebe Rôla e Alphonsus de Guimaraens”.