Depois de anos de temporais arrastando carros e invadindo imóveis, Belo Horizonte entra na temporada chuvosa com a esperança de alívio diante do avanço de obras para conter a força das águas. Pelo menos cinco estruturas, em construção na cidade há quase dois anos, já têm potencial de impacto em seu principal objetivo, que é a contenção das cheias de ribeirões e córregos, avalia a prefeitura da capital. Desafio histórico que se agravou com o crescimento e o avanço da impermeabilização da cidade, o período chuvoso ainda é uma incógnita este ano, especialmente devido à atuação do fenômeno El Niño, que marca presença tanto com intensas ondas de calor quanto com chuvas torrenciais. Mas as intervenções em andamento prometem reforçar a capacidade de lidar com seus efeitos.




A Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap) contabiliza 11 grandes obras de prevenção a enchentes em andamento na cidade, que somam R$ 612 milhões investidos, e projeta novas intervenções. Um dos principais pontos de atenção é a Avenida Teresa Cristina, devido aos transbordamentos frequentes do Ribeirão Arrudas, considerado um risco constante para tragédias e prejuízos. Na bacia, a prefeitura está perto de concluir as obras da Bacia B5, na Vila Esporte Clube, entre a Avenida Amazonas e a linha férrea, na Região Oeste de BH, com objetivo de conter o volume das águas no ponto de encontro do Córrego do Ferrugem com o Arrudas.


A prefeitura avalia que o projeto teve sucesso nos primeiros temporais da capital, armazenando água e evitando transbordamentos na Teresa Cristina. “Na medida em que as obras avançarem, a capacidade será aumentada. Depois de concluídas, temos chances bem menores de alagamento da avenida. Mas, claro, com uma chuva de 800 milímetros, como a que aconteceu recentemente em São Paulo, por exemplo, não tem como cidade nenhuma estar preparada. Aí entram outros protocolos de prevenção”, destaca o secretário municipal de Obras e Infraestrutura, Leandro Pereira. No caso da B5, até o fim do ano, a estrutura já deve atingir 80% de sua capacidade de armazenamento (total de 274 milhões de litros). O término da intervenção está previsto para o segundo semestre de 2024.


No período chuvoso deste ano, comunidades vizinhas já devem perceber também o funcionamento das bacias de detenção dos córregos Olaria e Jatobá, também parte da Bacia do Arrudas, mas no Barreiro. Com previsão de término no próximo mês, a estrutura já será capaz de reter 70 milhões de litros de água, ao custo de R$ 73 milhões. “Já temos essas duas obras funcionais na Bacia do Arrudas, que afetam diretamente a Avenida Teresa Cristina, o que melhora muito para quem vive nos arredores e mitiga significativamente os riscos que a gente tinha nessas regiões”, reforça o secretário Leandro Pereira. No local, será feito também o remanejamento de esgoto que hoje agrava a poluição do Arrudas. 

Impactos percebidos na Cristiano Machado

Moradores e comerciantes que sofrem ano a ano com inundações na Avenida Cristiano Machado já percebem melhora desde a conclusão das primeiras etapas das obras na região. Por lá, a Prefeitura de BH prevê entregar, até o fim do ano, o canal paralelo à canalização do Ribeirão do Onça, por baixo da estação de metrô São Gabriel, em uma extensão de 286 metros, com investimento de R$ 45 milhões.
Outra aposta para ampliar a vazão da água da chuva na região está sendo executada no encontro do Ribeirão Pampulha com o Córrego Cachoeirinha, na altura da estação São Gabriel, no Bairro Vila Suzana. A estrutura de captação, que recebeu o nome de Praça das Águas, está funcionando parcialmente na contenção do excesso de volume dos dois cursos d'água, que formam o Ribeirão do Onça. Quando concluído, em meados de 2024, o reservatório terá capacidade para armazenar 30 milhões de litros de água.


Ainda que em menor proporção, a intervenção é semelhante à que está sendo realizada na Avenida Vilarinho, na Região de Venda Nova. Lá, os dois reservatórios (Vilarinho 2 e Nado 1) terão capacidade para armazenar cerca de 230 milhões de litros de água. O primeiro deve ser entregue até o fim de 2024 e o outro, no segundo semestre de 2025. “Acredito que seja uma das mais complexas obras de macrodrenagem já executadas no Brasil. São dois reservatórios profundos, com aproximadamente 33 metros de profundidade, ou seja, o equivalente a um prédio de 11 andares, com 140 metros de comprimento e 40 de largura”, detalha o secretário de Obras, Leandro Pereira. “Essas obras vão ser capazes de reter uma quantidade muito grande de água e impedir que ela transborde para as avenidas. Toda aquela água que certamente estaria desaguando na pista fica reservada nessas bacias”, completa.


Novos projetos para problemas crônicos

A prefeitura trabalha com previsão de término nos próximos meses de outras intervenções para minimizar o problema das enchentes. Uma delas é um novo esgotamento sanitário no Bairro Santa Mônica, na Região da Pampulha, que deve estar concluído até o próximo mês. Também na Bacia do Arrudas, estão sendo implantadas duas estruturas para conter o volume que desce pelo Córrego Túnel Camarões, na Região do Barreiro, capazes de reter 400 milhões de litros de água. Já na Regional Leste, a instalação do sistema de macrodrenagem do Córrego Santa Inês, local de frequentes alagamentos no bairro homônimo, deve ser entregue em 2024.


Para o futuro, a Sudecap estuda intervenções em outros pontos críticos de alagamentos na cidade, como as avenidas Barão Homem de Melo e Francisco Sá, ambas na Região Oeste, e Prudente de Morais, na Região Centro-Sul. Atualmente, as ações para enfrentar enchentes nessas vias são concentradas no monitoramento, limpeza dos bueiros e desobstrução de galerias. Além disso, outro canal, paralelo ao Ribeirão Pampulha, está sendo construído sob a Avenida Cristiano Machado, porém esse só deve ficar pronto daqui três anos.


Capital planejada ignorou suas águas

A rede hidrográfica de Belo Horizonte é composta por três bacias principais: a dos ribeirões Arrudas, Pampulha e do Onça, segundo a Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap). No entanto, desde a construção, o projeto da capital mineira ignorou a riqueza hídrica de seus 700 quilômetros de cursos d'água. Os reflexos chegaram rápido e já nos anos 1920 começaram as inundações. A primeira grande enchente em BH ocorreu em 1923, provocada pelo transbordamento do Ribeirão Arrudas, o primeiro a ser canalizado.


Com o crescimento da população, ações como a impermeabilização do solo e a canalização de cursos d’água foram aumentando e gerando impactos. Hoje, BH tenta reverter esse cenário por meio de alternativas para retenção de água, como as bacias construídas ao longo dos córregos. “Nosso principal desafio é ter que repensar uma cidade que, por algum motivo, no seu planejamento, não levou em consideração os cursos de água”, afirma o secretário Leandro Pereira. Ao todo, a prefeitura estima investimento de R$1 bilhão em ações de prevenção.


As obras avançam, mas seu impacto definitivo, em alguns casos, só será visto na próxima temporada chuvosa. Até lá, a alternativa para amenizar os riscos para moradores e lojistas é a interrupção do tráfego de veículos nas vias com risco de alagamentos durante chuvas mais intensas. Protocolos bem definidos podem fazer a diferença no enfrentamento dos efeitos negativos de temporais, ressalta Leandro Pereira. A iniciativa se soma ao trabalho do Grupo de Gestão de Risco e Desastres, lançado no mês passado, equipe multifuncional com todas as secretarias da prefeitura, Corpo de Bombeiros, Copasa, Cemig, que fazem o monitoramento da cidade 24 horas por dia e tem autonomia para tomar decisões e definir medidas em caso de desastres. 

Vigilância 24 horas

Por meio do Centro Integrado de Operações (COP-BH), a prefeitura mantém um acompanhamento em tempo integral, 24 horas por dia, das áreas de risco e do volume de chuva nos medidores de nível dos córregos, sendo capaz de avaliar se a quantidade de precipitação nas cabeceiras pode causar inundação.

Redução de impacto

Confira algumas das principais intervenções em andamento em BH para lidar com efeitos das chuvas


Teresa Cristina (Bacia B5 - Córrego Ferrugem)

Capacidade: 274 milhões de litros de água
Status: atinge 80% de sua capacidade de armazenamento até o fim do ano
Investimento: R$ 66 milhões
Conclusão: 2º semestre de 2024


Barreiro (Bacias dos córregos Olaria e Jatobá)

Capacidade: 70 milhões de litros de água
Investimento: R$ 73 milhões
Conclusão: dezembro deste ano

Praça das Águas (Ribeirão Pampulha)

Capacidade: 70 milhões de litros de água
Status: 1ª etapa
Investimento: R$ 68 milhões
Conclusão: 2º semestre de 2024

Grandes reservatórios da Vilarinho

Capacidade: 230 milhões de litros de água
Status: 3ª etapa
Investimento: R$ 150 milhões
Conclusão: 2º semestre de 2024 (Vilarinho 1) e 2º semestre de 2025 (Nado 1)

Canal paralelo DO ONÇA

Canalização subterrânea de 286 metros
Investimento: R$ 45 milhões
Conclusão: dezembro deste ano

Canal paralelo do Ribeirão Pampulha

Investimento: R$ 139,7 milhões
Conclusão: 1º semestre de 2026

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