Vinicius Lemos e Amanda Quintiliano
Especial para o EM
O ano de 2024 entra em seu 16º dia e, em Belo Horizonte, mais da metade deles foi de chuva. De acordo com a Defesa Civil municipal, cinco regionais da capital estão em alerta de risco geológico em decorrência do grande volume de precipitações, sendo Nordeste, Leste, Centro-Sul e Barreiro com grau forte, e Oeste com moderado. O alerta é válido até a manhã de hoje. O aviso é emitido sempre que o volume de precipitações indica a necessidade de atenção ao grau de saturação do solo, que fica encharcado. Com a previsão de estiagem a partir de hoje e até sexta-feira (19/1), é possível que os índices de urgência diminuam no decorrer da semana, se não houver surpresas meteorológicas. O vaivém exige atenção até o fim da temporada chuvosa, em março. Até agora, choveu mais de 91% do esperado para todo o mês na Região Centro-Sul, com acumulado de 302,7mm. A porção da cidade é seguida do Barreiro, Pampulha e Leste – com 74,5%, 66,7% e 60,3% respectivamente – em relação à média climatológica para janeiro de 330,9mm.
Apesar das seguidas ondas de calor e secura que tanto Minas Gerais quanto o restante do país enfrentaram em meados de 2023 na esteira do El Niño, o fenômeno não tem freado o volume de chuva previsto para o início do ano. Pelo contrário, de acordo com o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), a previsão é que as precipitações fiquem acima da média, sendo organizadas em forma de pancadas, com pouca duração. “Até o momento, a chuva em BH está em 53% da média climatológica. A onda de calor influenciou mais na ausência de precipitações ao longo da primavera. Quanto mais quente, mais forte será a chuva”, explica o meteorologista, Claudemir de Azevedo.
A capital já tem uma predisposição para riscos geológicos, que se intensificam com os constantes aguaceiros. Isso acontece em decorrência da formação do solo e relevo íngreme, não só do estado, mas de toda a Região Sudeste. A professora e pesquisadora da Universidade Federal de Minas Gerais, Cristiane Valéria de Oliveira, ainda aponta que, além da fragilidade natural, a ocupação humana nessas áreas multiplica os riscos.
“A ocupação da capital, principalmente a partir das décadas de 1960, 1970, potencializou muito esses riscos de escorregamento. A gente está colocando mais peso em cima de uma área que já está tendendo ao escorregamento. Então, na época de chuva, essa fragilidade toda fica mais intensa em função do peso que o solo ganha ao ficar cada vez mais encharcado”, afirma.
Para evitar que a cada ano os riscos geológicos piorem, o recomendado é que o poder público invista em obras a médio e longo prazos. Para a especialista, o que dá para fazer são obras de desvio de drenagem da água da chuva em áreas onde a ameaça já é conhecida. Outra ação, dessa vez mais complicada de ser executada, é a remoção de pessoas que moram nesses locais
“O desejável, caso a gente vivesse em um mundo perfeito, seria tirar toda essa população da área de risco. Deslocar essas pessoas e impedir que novas ocupem esses espaços. Mas isso é uma coisa muito difícil, muito cara, e a gente não vê muita vontade política em relação a essa solução”, analisa a professora.
Trégua até sexta-feira
Em decorrência da dissipação da atual frente fria que permanece em Minas Gerais, as chuvas poderão dar uma trégua a partir de hoje até sexta-feira. O meteorologista do Climatempo, Ruibran dos Reis, explica que a previsão é que, ao longo do período, as temperaturas voltem a subir e não haja precipitações significativas. A estiagem pode causar um alívio nas urgências dos riscos geológicos da capital, mas ao longo dos dias não será possível fazer muita coisa para evitar deslizamentos, queda de barreira, erosão do solo, e outras ocorrências do tipo.
A pesquisadora da UFMG explica que, em pouco tempo, o que pode ser feito tem que partir da população, com a velha e conhecida atitude de não jogar lixo e entulho em barrancos e áreas de escoamento de água. Quanto mais peso no solo, maior o risco de deslocamento.
“A quantidade de água parada vai saturando o solo e aumentando o peso dele. Então, o ideal seria a existência de campanhas de educação para a própria população que vive nessa área. O resto é seguir a orientação da Defesa Civil, como observar se muro e postes começam a tombar ou se aparece rachaduras nas paredes. Ficar sempre de olho e acionar o órgão para fazer a vistoria. Porque é muito triste perder os bens, mas o mais importante é se manter vivo”, afirma Cristiane Valéria.
O tempo seco no estado vai durar até o fim da semana. A partir de sábado (20/1), uma nova frente fria volta a pairar sobre Minas, trazendo de volta as chuvas. Dessa vez, a previsão é que ela fique estacionada por um tempo, provocando uma sequência de precipitações e ligeira queda nos termômetros nas regiões Metropolitana, Sul, Triângulo, Zona da Mata, Norte, Leste e Nordeste.
ALAGAMENTOS NO INTERIOR
Minas Gerais tem 32 municípios em situação de anormalidade causada pelas chuvas desde o início da temporada das águas, em outubro de 2023. Os decretos de situação de emergência ou calamidade de todas elas foram reconhecidos pela Defesa Civil Estadual. Nove registros foram feitos somente na primeira quinzena de janeiro. Precipitações em grande volume atingem quase todo o estado desde a última sexta-feira (12/1). Inclusive, há um alerta para chuva forte válido em 524 municípios até a manhã de hoje.
O aviso foi publicado ontem pelo Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) e adverte sobre chuva de até 100mm/dia, com ventos intensos entre 60 a 100km/h. O risco abrange as regiões do Triângulo Mineiro, Central, Zona da Mata, Oeste, Sul, Campo das Vertentes, Metropolitana de Belo Horizonte, Noroeste e Norte.
A chuva causou alagamentos ontem em Itapecerica, no Centro-Oeste de Minas. Alguns córregos e o Rio Vermelho transbordaram em vários pontos, como na Região Central e também no Bairro Boa Viagem. Conforme a Defesa Civil do município, choveu muito na cabeceira do rio, que corta toda a cidade, causando o aumento do volume de água.
Na tarde de ontem, a tempestade provocou fechamento de uma pista da rodovia MGC-497, em Uberlândia, no Triângulo. Ruas foram cobertas por enxurradas e lama, árvores caíram, além de casas que ficaram sem energia elétrica. Uma lateral da avenida K, que dá acesso direto dos setores sul e oeste à estrada, desabou depois que manilhas que direcionam um curso d’água por baixo da via não suportou o volume de precipitação passando pelo trecho.
No Bairro Chácaras Tubalina, um pesque-pague ficou inundado após outro curso d’água extrapolar as próprias margens e invadir a Rua Orixás com lama e lixo trazidos da parte alta do bairro. Carros ficaram inundados, e pessoas estavam com água até a cintura.
Na Avenida Rondon Pacheco, na altura do Bairro Custódio Pereira, uma pessoa precisou de socorro depois que seu carro ficou preso em uma grande poça formada abaixo da rodovia BR-050. O Corpo de Bombeiros teve que fazer a retirada do condutor.
SOS VIA PIX
O cartão humanitário volta à cena na ajuda emergencial em Minas Gerais, em campanha que reúne diversas órgãos e instituições para apoiar pessoas atingidas pelas chuvas, especialmente dos municípios com decreto de situação de emergência ou calamidade reconhecidos pelo governo do estado. A campanha SOS Chuvas busca doações via Pix, que serão convertidas em créditos para cartões distribuídos de acordo com critérios da rede de assistência social, considerando o índice de pobreza, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do município e registro no CadÚnico. Itens físicos essenciais, como alimentos não perecíveis, produtos de higiene pessoal e limpeza também continuam sendo aceitos. As doações de itens físicos podem ser entregues na sede do SSA-Servas, que fica na Avenida Cristóvão Colombo, número 683, Bairro Funcionários, em Belo Horizonte, de segunda a sexta-feira, das 7h às 18h. Para a ajuda monetária via Pix, a chave é soschuvas@cvbmg.org.br.