Tremores em sete lagoas seguem imprevisíveis, e a semana é marcada por clima tenso entre os moradores da cidade -  (crédito: Túlio Santos/EM/D.A Press)

Tremores em sete lagoas seguem imprevisíveis, e a semana é marcada por clima tenso entre os moradores da cidade

crédito: Túlio Santos/EM/D.A Press

O assunto em Sete Lagoas, na Região Central de Minas Gerais, é um só: os tremores de terra que voltaram a assustar os moradores da cidade. Na terça-feira (16/1), foram três em menos de sete horas. No dia seguinte, a prefeitura anunciou uma nova parceria com o Centro de Sismologia da Universidade de Brasília (UnB), para a instalação de novos equipamentos que vão monitorar a cidade. Autoridades dizem que a onda da movimentação foi registrada por sismográfos que já existem no local e estão sob análise. A princípio, os fenômenos seriam naturais e não provocados por ação humana. Na cidade, porém, a quase totalidade dos moradores ouvidos pelo Estado de Minas acreditam que a dinamitação nas pedreiras seria a causa dos abalos.


A reportagem percorreu quatro bairros que seriam os mais afetados pelos tremores: Mata Grande, Iporanga, Padre Teodoro e Vale das Palmeiras. Todos relatam terem sentido a terra tremer. O pedreiro Glaisson Gaspar, de 31 anos, trabalha em uma construção no Bairro Mata Grande e diz que não é o primeiro abalo que sentiu. “Nas ondas anteriores, eu trabalhava em outras obras. É sempre a mesma coisa – dá um barulho como um estrondo ou uma explosão. Você sente o tremor vindo debaixo dos pés”.


Ele diz que nos anos de 2022 e 2023 a sensação foi a mesma. “É passageiro, coisa de três ou quatro segundos, mas você sente bem. A gente fica o dia todo apreensivo, esperando a próxima”. Todos os funcionários do local dizem estar com medo da situação provocar algum impacto. “Estávamos até conversando com o engenheiro responsável. O cálculo que ele faz, talvez, não leve em consideração esse tipo de coisa”.


Gaspar lista os bairros onde as situações são mais perceptíveis. “Aqui em Mata Grande e Vale das Palmeiras I e II sentem muito. Tenho amigos que moram em casas de dois andares nesses bairros e também percebem. Eles falam que a vontade que dá é de abandonar a casa. Você não sabe, pode vir a qualquer hora, de madrugada”.


Além da apreensão, a falta de respostas das autoridades também aflige os moradores. “Ouvimos vários boatos dizendo que pode ser causa natural, pois tem muita gruta em Sete Lagoas, ou por causa da captação de água, já que tem muito poço artesiano. Mas é muito estranho, porque é uma região que tem pedreiras. Se fosse uma coisa natural, creio que tinha que acontecer nos outros bairros também”, afirma Gaspar.


Os outros funcionários da construção também acreditam que os fatos estão relacionados com a extração mineral. Eles comentam que, após o episódio da manhã de terça-feira, começou a circular em grupos de WhatsApp um vídeo que seria de uma moradora vizinha a uma das pedreiras. Nele, uma fumaça aparece saindo do local pouco depois do abalo. A fonte fica no bairro vizinho – o Padre Teodoro. É lá que a comerciante Santa Gertrudes, de 57 anos, tem um bar. Gertrudes também afirma que os abalos acontecem sempre no período chuvoso. “Parece que aproveitam os trovões para embolar com o barulho (das explosões)”.


A causa do fenômeno é tema de discussão entre os clientes do estabelecimento. A mulher conta que os tremores da madrugada de terça-feira foram os mais fortes que já sentiu. “A janela chegou a balançar e os cachorros que estavam dormindo levantaram assustados”. Ela diz que antes dos abalos, o tempo na cidade fechou e foram ouvidos raios e trovões. Depois que a chuva passou, os tremores não aconteceram mais.


Apesar de estar acostumada a conviver com os fenômenos, a comerciante relata que eles assustam. “Parece uma carreta passando (na rua) ou uma turbulência. Dá medo. Ontem mesmo estava com medo de entrar em casa”. Ela mora com os dois cachorros no fundo do estabelecimento e explica que, durante o dia, está cercada de pessoas, mas quando o bar fecha, está sozinha com os animais e a insegurança logo vem. O receio da moradora não está relacionado aos possíveis danos estruturais que os abalos podem causar ao imóvel. “Tenho medo de não parar; ficar tremendo um tempão mesmo".


No bairro vizinho, o Vale das Palmeiras, os moradores exibem marcas que acreditam estar relacionadas com os tremores. É o caso do autônomo Wellington Vieira, de 42 anos. Ele relata que as rachaduras em sua casa se agravaram com os últimos acontecimentos. As trincas começam em uma parede e se alastram para o teto da sala do imóvel. Segundo Vieira, tudo isso surgiu junto com as primeiras anomalias, ainda em 2022. “Mas não fizemos uma avaliação detalhada se o problema é realmente por causa do tremor. Mas tudo leva a crer que pode ser isso”. O morador diz que a Defesa Civil já esteve no bairro, mas não na casa dele. Também informou que nunca procurou o órgão.


 
O coordenador da Defesa Civil, Sérgio Andrade

O coordenador da Defesa Civil, Sérgio Andrade, tranquiliza moradores e diz que há equipes prontas para qualquer chamado

Túlio Santos/EM/D.A Press


Monitoramento

No final da tarde de quinta-feira (18/1), uma equipe do Centro de Sismologia da Universidade de Brasília (UnB) chegou ao município com três estações sismográficas e dez aparelhos de infrassom. O objetivo desses equipamentos, segundo o professor Lucas Vieira, é diferenciar os sismos (tremores) naturais dos que podem ser provocados por ação humana. “Faremos um estudo mais preciso dessas ocorrências, com sensores na região, da localização e da profundidade dos tremores, e de quais são as forças que estão atuando. Além disso, de como as falhas estão distribuídas na superfície. Se é só uma, se são várias e quais os tamanhos delas”, diz. A estação sismográfica é um sensor colocado no terreno que vai registrar as vibrações. Já os sensores infrassônicos vão captar as variações de pressão que possam ser produzidas por explosões químicas de mineradoras, por exemplo.


Desde o início desta semana, o município registrou quatro abalos sísmicos. Na terça-feira (16/01), foram três tremores de terra em menos de sete horas. De acordo com informações do Observatório Sismológico da UnB, o primeiro tremor aconteceu por volta das 2h30, com magnitude de 2.8mR (intensidade medida na escala Richter). O segundo, às 4h40, mas com menor intensidade, de 2.5mR, e o último, já pela manhã, às 8h40, com 2mR. Outro abalo já tinha sido sentido na noite de domingo passado (14/01). Segundo dados do Centro de Sismologia da Universidade de São Paulo (USP), o mesmo ocorreu por volta das 23h20 e teve magnitude de 2.3mR.

 


O secretário municipal de Meio Ambiente e presidente do comitê de estudos dos abalos sismológicos, Edmundo Diniz Alves, afirma que esses elementos continuam em análise. Ele explica que os aparelhos já instalados na cidade detectaram a onda da movimentação e que se tratam de tremores naturais. “É a mesma falha geológica que em 2022 e 2023 gerou os outros movimentos. Acompanhamos e monitoramos de perto e temos um relatório indicando isso. Podemos afirmar que se tratam de fatos naturais e em processo de acomodação”.

 

Atividade sísmica

A atividade sísmica em Sete Lagoas não é recente. Desde, pelo menos, 1930, há registros de abalos, de acordo com o professor. Em geral, os sismos são inferiores à magnitude de 3mR na Escala Richter. Abaixo desse valor, segundo Vieira, os sismos só causam susto na população, por ocorrerem próximos à superfície. Entretanto, o estudo vai determinar se é possível que a falha geológica possa causar efeitos de magnitudes maiores. Ele alerta que acima de 4mR, já seriam situações capazes de causarem danos estruturais.


Sobre os questionamentos de moradores a respeito da causa dos tremores não serem naturais, o secretário de Meio Ambiente rebate, mas diz que nada está descartado. “Esse Centro de Monitoramento é exatamente para estudarmos a fundo possíveis novos tremores. Infelizmente, são imprevisíveis e inevitáveis. Temos que aprender a conviver com eles”.


O secretário diz que os sismógrafos já instalados na cidade detectaram mais de 600 detonações e que o relatório produzido pelos pesquisadores da UnB distinguem esses abalos dos naturais. “Foram todos descartados. Os que aconteceram agora, não conseguimos concluir as análises ainda, mas serão objeto de investigação junto de eventuais outros que possam ocorrer a partir da instalação da rede sismológica”.


Ele ressalta ainda que, na quarta-feira (17/1), foi feita uma fiscalização envolvendo a secretaria, Ministério Público, Defesa Civil e Polícia Ambiental em todas as mineradoras e lavras de exploração mineral. “Houve uma denúncia que foi apurada. Se trata de uma exploração legal, autorizada pelo Estado, que é quem tem competência para dar autorização. Vamos montar a rede sismológica exatamente para apurar o que de fato está acontecendo”.


O coordenador da Defesa Civil Municipal, Sérgio Andrade, diz que há equipes preparadas para atender a qualquer chamado. “Ainda é cedo para dizer que algum problema é ocasionado em função do tremor. Precisamos analisar cada situação e evento que acontecem. É cedo afirmar que o aparecimento de trincas em imóveis é proveniente desses abalos. Requer um estudo mais aprofundado”. Segundo ele, foram registrados cinco acionamentos depois dos últimos tremores. “Comparecemos a todos os imóveis e não foi possível constatar que as trincas e fissuras que apareceram são provenientes dos tremores”, destaca.


Andrade orienta que o cidadão entre em contato com o órgão sempre que acontecer uma adversidade, para que a equipe possa analisar se há eventual risco que demande, por exemplo, evacuação de imóvel.

 

Depoimento

Helvécio Carlos
Colunista do Estado de Minas

O relato mais recente sobre o tremor em Sete Lagoas veio de um amigo, por meio de mensagem, exatamente às 2h38 da madrugada de terça-feira (16/1). “Foi muito forte o de hoje, acordei com o barulho e senti a cama tremer”. Aos poucos, vieram mais relatos de conhecidos que moram na mesma região onde foram registrados os três movimentos atípicos e mais recentes. Mesmo com as informações técnicas de centros especializados de Brasília ou de São Paulo, é difícil manter a calma ou certamente tranquilidade. As variáveis que elevam as tensões emocionais são muitas. Quem não se lembra da cratera que, “do nada”, engoliu trecho das ruas Nestor Foscolo com Tupiniquins, há 30 anos? E, em 2023, como reflexo ou não dos tremores, o mesmo trecho desabou. Lembro, na adolescência, da lenda urbana que corria de boca em boca, dizendo que os subterrâneos da cidade eram túneis calcários e a qualquer momento poderiam ruir. Lenda urbana, eu disse, mas não há estudos científicos ou pesquisas mostrando como realmente o solo da cidade é e como ele está sendo tratado.

Ainda no campo das lendas urbanas – essas mais recentes – há suspeitas de que os tremores são resultado de explosões com dinamite ou extração de água. Ou seja, quem mora em Sete Lagoas, não tem um minuto mais de tranquilidade. A situação fica mais tensa lembrando os fatos recentes em Maceió, com o colapso da mina da Brastemp. Certo é que não dá mais para acordar na madrugada com camas tremendo ou as mensagens assustadoras dos amigos. Mas ainda fica uma pergunta: se os tremores são de causas naturais, o que pode acontecer se for registrado um tremor de grande magnitude? Essa e muitas indagações ainda estão a procura de respostas.