A Polícia Federal (PF) prendeu, nessa terça-feira (23/11), quatro pessoas suspeitas de ameaça e extorsão contra o assessor especial da Prefeitura de Divinópolis, no Centro-Oeste de Minas, Fernando Henrique. O grupo estaria cobrando propina por captação de recursos federais da Lei Paulo Gustavo.
Entre os presos estão duas pessoas do próprio município. Conforme apurado pela reportagem, um deles é Douglas Montenegro e o outro, Aldo Vila Franca. A polícia também prendeu um servidor de carreira do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), identificado, inicialmente, apenas pelo primeiro nome, Sandro.
O quarto integrante do grupo se apresentou como membro do Primeiro Comando da Capital (PCC). Ele estava sem documento, dificultando a identificação. O homem também foi o único a não ter o rosto captado pelas imagens de segurança do prédio da prefeitura.
O esquema
A ação da quadrilha começou em março do ano passado. Inicialmente, um dos membros entregou à Secretaria Municipal de Cultura um documento, alegando que precisava da assinatura do prefeito Gleidson Azevedo, irmão do senador Cleitinho Azevedo (Republicanos), para destinar recursos do Ministério da Cultura.
“Como eu confiro todos os documentos que o prefeito assina, o secretário de Cultura passou para mim e eu fiquei sem entender. Quem é esse rapaz? Ele é do Ministério da Cultura? Pedi para fazer contato comigo”, explicou o assessor especial da Prefeitura de Divinópolis, Fernando Henrique, em coletiva realizada nesta quarta (24/1).
No primeiro contato, por telefone, em 28 de março, Douglas Montenegro teria dito que não era do Ministério da Cultura, contudo que conseguiria a destinação da verba, cerca de R$ 2 milhões. Afirmou, segundo o assessor especial, que tinha contato interno na pasta.
O segundo contato, no dia seguinte, foi presencial. “A gente achou estranha a situação, e eu fui assuntando, até que ele falou: eu vou arrumar a verba, tenho um lobista lá e a gente cobra 30%. 25% é meu e 5% é para você, eu fico com 5%, e 20% preciso dar para o pessoal de Brasília”, afirmou Fernando.
A partir da proposta, Fernando Henrique afirmou ter procurado a Polícia Federal, com conhecimento do prefeito, para denunciar o esquema. A instituição, então, o teria orientado a “dar corda” para a quadrilha.
Publicações
O Ministério da Cultura divulgou a primeira relação com valores aproximados por município no dia 11 de maio. No dia 9 de agosto, a prefeitura confirmou o recebimento da verba, sendo R$ 1.404.851,39 para a produção audiovisual e R$ 569.086,21 para as demais áreas culturais.
Os suspeitos pressionavam o assessor a publicar o edital para contratação de consultoria, montagem de plano e desenvolvimento da lei com base nas orientações deles para que uma determinada empresa vencesse o certame. A licitação ocorreu no dia 11 de agosto, vencendo o Instituto de Gestão Pública e Projetos.
Diante das pressões, o assessor especial disse que uma das saídas encontradas pela administração foi exonerá-lo. A exoneração ocorreu no dia 17 de outubro, cerca de dois meses após a destinação da verba. Dois dias depois, ele voltou a ser nomeado.
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“Aí fiquei alguns dias exonerados e mandei para eles: fui exonerado e não consigo publicar o edital”, contou, na coletiva.
Como edital já havia sido publicado, Fernando afirmou à reportagem que a exoneração “aconteceu só para enviar para eles (quadrilha) e ter um alívio de cobrança”. Salientou que os suspeitos pareciam não estar acompanhando as publicações dos editais.
Com isso, uma segunda pessoa, desta vez Aldo Vila Franca, o procurou para conversar também sobre o repasse do percentual. Após o encontro, eles não voltaram a se falar e houve uma trégua. Até que, nessa terça, ele chegou acompanhado de Douglas e dos outros dois integrantes do grupo na prefeitura.
“Uma falava que era do PCC, que vieram para me matar. Fizeram descrição da minha rotina”, denunciou o assessor.
A prisão
A quadrilha esteve com Fernando por duas vezes nessa terça-feira (23/1). A primeira, por volta das 11h30. Eles o ameaçaram pedindo parte do dinheiro destinado à Cultura.
“Eles entenderam que eu fiz o processo sem eles e peguei a propina toda para mim, sem querer dividir. Eles tinham certeza que tinha R$ 400 mil na minha casa, para passar para eles. Fizeram pressão, falando que não queriam mais 25%, que queriam 50%”, afirmou.
Os quatro, então, decidiram ir embora, dizendo que voltariam no final do dia para receber o dinheiro. Quando eles foram embora, ele ligou para a Polícia Federal que, segundo Fernando, disse que já estava monitorando o grupo e que havia uma equipe a caminho da prefeitura.
Já no final do dia, antes das 17h, a quadrilha retornou e foi até a sala em que o assessor estava. Lá, os membros voltaram a ameaçar Fernando Henrique de morte. Os quatro foram presos ao sair da sala.
Investigação
Em nota, a Polícia Federal limitou-se a dizer que efetuou a prisão de quatro pessoas pelo crime de extorsão contra funcionário público. Segundo apurado, os indivíduos exigiram percentual referente a verba federal que foi destinada ao município.
"A PF iniciou diligências imediatamente após receber a denúncia por parte do servidor municipal e efetuou a prisão em flagrante em razão dos criminosos terem ameaçado o servidor de morte, caso não fosse paga a quantia exigida", afirmou a PF, no comunicado.
"Os presos foram conduzidos até a Delegacia da Polícia Federal em Divinópolis, onde está sendo lavrado o auto de prisão em flagrante pelo crime de extorsão", finalizou a instituição.
CPI
O senador Cleitinho Azevedo, que é irmão do prefeito de Divinópolis, disse que aguardará a conclusão das investigações para propor a instauração de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar esquema de propina no Ministério da Cultura.
“Esses elementos que estiveram aqui, eles têm informações privilegiadas (...) Assim que o dinheiro caiu, eles vieram ameaçar”, enfatizou.
O senador participou da entrevista coletiva. O irmão dele, esteve representado pela vice-prefeita e secretária de Governo Janete Aparecida (Avante).
A vice-prefeita assegurou que todo o processo da Lei Paulo Gustavo seguiu os trâmites legais. Afirmou que disponibilizará a documentação para o Ministério Público. O Instituto de Gestão Pública e Projetos venceu a licitação com o valor de R$ 71.999,00, ou seja, 3,6% do total destinado, que foi R$ 1.985.766,36. O dinheiro foi dividido entre 135 agentes culturais.
A reportagem questionou o TJSP e o Ministério da Cultura sobre o caso, mas não havia recebido resposta até a publicação desta matéria. O espaço segue aberto para manifestações.