O sistema judiciário brasileiro permite que os presos possam sair do sistema prisional por alguns dias em datas comemorativas. Depois do tempo regulamentado, eles são obrigados a retornar às celas. Porém, uma parcela acaba descumprindo as normas e aproveitam as saídas temporárias ou “saidinhas”, como são mais conhecidas, para fugir da prisão. 

Caso como o que ocorreu na última sexta-feira (5), quando um sargento da Polícia Militar morreu ao ser baleado na cabeça tentando capturar um desses fugitivos da "saidinha" em Belo Horizonte.




Depois desse caso, as “saidinhas” voltaram ao debate. Entretanto, será que as saídas temporárias são uma realidade apenas no Brasil ou estão previstas em outros países? 

O advogado Fábio Curvelano Batista, que atua na área de direito penal, tribunal do júri e execução penal, destaca que alguns países na Europa preveem o sistema de saídas temporárias, como o Reino Unido e Irlanda, mas que não acontecem em datas comemorativas como no Brasil.

O advogado lista outros países, como Portugal, onde as saídas acontecem de cinco a sete dias para aqueles presos que cumpriram um sexto da pena não superior a cinco anos ou o cumprimento de um quarto da pena, tratando-se de pena superior a cinco anos. Esse preso tem que estar em regime comum ou aberto.

Na Itália, o advogado explica que os presos, que podem gozar desse direito, são os condenados que tenham comportamento regular e que não sejam socialmente perigosos. As saídas não podem ter duração superior a 15 dias de cada vez.

As saídas temporárias na Espanha só acontecem em caso de morte ou doença grave dos pais, cônjuge, filhos, irmãos e outras pessoas estreitamente ligadas aos detentos, nascimento dos filhos, bem como por motivos importantes e comprovados, com as devidas medidas de segurança. As saídas são de até sete dias.

Na França, o advogado diz que a lei permite a saída temporária, mas o prazo não é estipulado nem os critérios. Caso seja recusada a autorização de saída por parte do responsável do estabelecimento penitenciário, o pedido pode ser novamente requerido ao juiz de execução da pena.

Já o advogado criminalista Alex Xavier afirma que as saídas temporárias não são uma prática comum em muitos outros países. Cita o exemplo dos Estados Unidos, onde cada estado cria a sua própria lei e de maneira geral não é um direito dos prisioneiros.

“O que notei em outros países, principalmente na América Latina ou Europa, é que o instituto mais aplicado é o da liberdade condicional, onde o indivíduo já cumpriu grande parte da pena e costuma ter ali uma comissão, algum órgão, que verifica se ele está apto a ser colocado em liberdade”, destaca.

Como funcionam as “saidinhas” no Brasil


“A lei de execuções penais prevê cinco saídas temporárias de sete dias durante o ano, para presos do regime semiaberto. É um direito apenas desses presos. Portanto, presos do regime fechado, não têm esse benefício”, aponta o advogado criminalista Daniel Lage.

Daniel explica que os presos do regime aberto não têm saídas temporárias, porque em regra eles saem diariamente para trabalhar e retornam à noite para o sistema prisional. “Não há uma regra específica sobre quais períodos devem acontecer. Isso geralmente fica a cargo da direção prisional. O que acontece, por conveniência, para não ter que a direção prisional ficar enviando para o juiz o calendário de saídas daqueles presos, eles estabelecem essas saídas nessas datas comemorativas”, diz.

O advogado criminalista Nilton Aarão reitera que a Lei de Execuções Penais veda a concessão de saídas temporárias aos indivíduos que foram condenados por crimes hediondos com resultado de morte, aqueles tidos como mais graves pelo ordenamento jurídico brasileiro.

De acordo com o advogado, a medida é um instrumento de ressocialização importante. E a maioria não pode pagar pelo erro de uma minoria, já que, segundo ele, o último levantamento, da saidinha de fim de ano, mostra que dos mais de 4 mil presos que saíram, apenas 118 não retornaram.

“É um assunto complexo e delicado, que envolve a necessidade de balancear a ressocialização com a segurança da sociedade. Muitos presos utilizam estas datas para conseguir um trabalho, informar um estudo, tirar algum documento, visitar as famílias”, aponta.

Opinião compartilhada por Fábio Curvelano, que também defende as “saidinhas”. “O problema não são os benefícios da execução, mas como a execução é tocada no Brasil. Aqui, você aprisiona um pitbull, bate nele a vida inteira e quer que ele saia de lá doce, manso e pacífico”, destaca.

Alex Xavier pede cautela nas análises e reitera a importância das saídas temporárias. “É um direito extremamente importante na execução de pena brasileira, uma vez que dá possibilidade de aquele indivíduo ser inserido aos poucos na sociedade”, afirma.

Daniel Lage relembra o caso do policial mineiro que morreu indo atrás de um desses fugitivos e diz que é importante encontrar maneiras de evitar que esse tipo de incidente ocorra no futuro.

compartilhe