O homem de 53 anos que foi detido, na tarde de sexta-feira (26/1), por injúria racial cometida contra uma mulher no município de Boa Esperança, no Sul de Minas Gerais, está foragido da polícia. De acordo com o delegado Alexandre Boaventura, responsável pelo caso, o suspeito foi detido, mas liberado após depoimento em que afirmou ter provas de também ser vítima.
Ele chamou a vizinha de “preta fedida”, foi gravado durante a conduta, mas não se intimidou. Nas filmagens feitas pela mulher, de 44 anos, ela pede para o vizinho recolocar uma placa que estaria no corredor. Ele, então, joga plantas em direção à mulher, repete as ofensas e diz: "Está me filmando? Chame a polícia".
Segundo o Boletim de Ocorrência, a situação começou devido ao som alto e a latidos de cães na casa do agressor. O dono do imóvel, um homem de 32 anos, entrou em contato com o inquilino e pediu para que ele acalmasse os animais e abaixasse o volume, para não atrapalhar a vizinhança.
O ofensor também fez injúrias ao dono da casa, por meio de mensagens, e a Polícia Militar (PM) foi acionada. No local, os oficiais conversaram com a mulher, que informou ter gravado a ação. O homem também foi procurado e alegou estar se defendendo da vizinha.
Suspeito alegou ter sido vítima de homofobia
Segundo o delegado Boaventura, o homem disse que o vídeo gravado pela vítima era apenas um pedaço da briga e que ele teria provas de que estava se defendendo. A advogada da vítima, Thamires Firmino de Souza, afirmou que a história contada pelo ofensor foi inventada e tratava sobre um suposto crime de homofobia cometido contra ele.
“Isso nunca ocorreu. No vídeo, em momento algum existe este tipo de situação. Ele não apresentou nenhuma prova de suas alegações e, mesmo assim, um policial civil – que não foi o delegado Alexandre Boaventura – deu voz de prisão para a vítima”, atestou ela.
“Eu estava impossibilitada de estar na delegacia, mas havia um outro advogado criminalista, Dr. Wisley, que ao observar a situação, interveio falando com o delegado e desfez o ocorrido”, complementou a advogada.
Em decorrência dos acontecimentos, Boaventura disse que seria necessária uma análise mais ampla e um inquérito foi aberto para a apresentação das provas, mas o ofensor nunca apareceu.
“Ele pode ter ficado com medo de ser agredido ou de ser preso e não apareceu mais. No momento, seguimos com a investigação, já buscamos por ele e estamos aguardando, mas já há um mandado de prisão no nome do ofensor”, explicou o oficial.
Vítima saiu de casa
A advogada Thamires também afirmou que a vítima e sua filha, de quatro anos, saíram do imóvel onde moravam porque estavam – e estão – com medo de o acusado ir atrás delas. Até a manhã desta segunda-feira (29/1), elas estavam em um hotel e a vítima disse estar frustrada, esgotada, decepcionada e traumatizada.
Também de acordo com a advogada, o acusado fugiu e chegou até ela a informação de que ele foi para o estado de São Paulo.
“O correto seria que o ofensor tivesse ficado preso, porque se tratou de uma prisão em flagrante, de um crime de injúria racial contra três pessoas pretas, das quais duas, naquele momento, fizeram a representação criminal. É um crime que gera comoção social e é inafiançável. A liberação deste homem foi um erro”, disse ela à reportagem do Estado de Minas.
“Esperamos que a polícia o encontre para que possa ser responsabilizado criminalmente e na esfera cível. Não vamos tolerar impunidade nesse caso”, completou.
Crime
Desde janeiro de 2023, a injúria racial é equiparada ao crime de racismo. A alteração retirou a menção à raça e etnia do item específico do Código Penal (art. 140), que passa a se limitar a contextos de “religião, idade ou deficiência”, e inseriu novo artigo na Lei de Crimes Raciais (Nº 7.716/89), citando “raça, cor ou procedência nacional” como modalidades do racismo, e definindo pena de multa e prisão de dois a cinco anos.
Na prática, por ser um crime enquadrado na Lei de Racismo, o autor será investigado. Não é mais necessário que a vítima decida se quer ou não prosseguir com a apuração.