Pacientes em unidade de atendimento  exclusiva para casos de dengue em BH -  (crédito: Amir Raissa/PBH)

Pacientes em unidade de atendimento exclusiva para casos de dengue em BH

crédito: Amir Raissa/PBH

A epidemia de dengue que avança em Minas Gerais coloca o estado na incômoda posição de registrar a terceira maior incidência da doença no Brasil, atrás apenas do Distrito Federal e do Acre. Em números absolutos, no entanto, o estado lidera o ranking nacional. A cada semana de janeiro, até o dia 27, o número de casos confirmados manteve uma alta alarmante de, em média, 5,7 mil registros, bem mais do que a escalada vista semana a semana de dezembro, conforme levantamento feito pelo Estado de Minas. Agora, os casos confirmados pela Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG) ultrapassam os 39 mil, sendo mais de 15 mil só no intervalo entre o dia 28 e ontem, e 111.007 registros prováveis (notificados exceto os descartados). O novo dado eleva a média de diagnósticos atestados por exames laboratoriais do estado para 7,8 mil por semana neste ano.


Os dados da dengue, divulgados no Painel de Monitoramento de Casos de Arboviroses do Ministério da Saúde —atualizados ontem (5/2)— consideram o coeficiente de incidência, que calcula o número de ocorrências da doença por um grupo de 100 mil habitantes. Por esse levantamento, Minas Gerais, por exemplo, tem 88.587 casos prováveis de dengue (número já superado no novo boletim da SES), ou seja, incidência de 431,3/100 mil. No entanto, a situação é mais grave no Acre, que registrou 3.808 notificações, mas tem população muito menor (458,8/100 mil). O Distrito Federal lidera o ranking de coeficiente de incidência, com 1.147,8 por 100 mil habitantes. Neste período, o Brasil teve 24 mortes confirmadas e 163 estão em investigação.


O cenário, considerado alarmante, pode levar Minas Gerais à liderança nacional de casos de dengue em relação à população. Desde 27 de janeiro, Minas se encontra em estado de emergência de saúde pública causado pela escalada de casos de dengue e chikungunya registrada nas primeiras semanas de janeiro. O decreto foi publicado no "Diário Oficial do Estado" e é válido pelos próximos seis meses. "Quando comparado com o mesmo período de 2023, observa-se um aumento de 273% no número de casos prováveis. As regiões geográficas onde se apresentam os maiores coeficientes de incidência são Centro-Oeste, Sudeste e Sul", informa o Ministério da Saúde. Questionado pela reportagem, o órgão não informou se há previsão de reforço na assistência ao estado diante da alta incidência de casos.


Um levantamento feito pelo Estado de Minas, utilizando dados dos boletins epidemiológicos e do painel de monitoramento da Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG), retrata a escalada da doença desde 1º de janeiro. Na semana epidemiológica 1, encerrada em 8 de janeiro, eram 415 casos confirmados. Na seguinte, o número saltou para 3.983. Na terceira, já eram 11.490. O número de doentes passou de 23.389 na quarta semana epidemiológica para 39.282 —alta de 67,9% registrada só no intervalo de uma semana. Foram 15,8 mil novos casos só nos últimos sete dias. Escalada semelhante, mas menos intensa, foi vista em dezembro, quando semana a semana eram quase 4 mil novos registros de pessoas com dengue no estado.


Os números da Secretaria de Estado de Saúde, entretanto, estão defasados, já que não consideram ao menos quatro mortes recentemente confirmadas pelas prefeituras de Belo Horizonte, Betim, na Grande BH, e Barbacena, na Região Central de Minas. Os dois últimos decretaram situação de emergência pela doença. A partir da notificação dos municípios, a SES-MG leva até 60 dias para investigar e encerrar o caso, podendo a conclusão ser alterada nesse período. Os óbitos confirmados, sem levar em consideração os citados acima, são sete, enquanto as mortes em investigação somam 62. As mortes por dengue confirmadas pelo Executivo estadual, que apontam uma letalidade de 1,23%, ocorreram em Arceburgo, Belo Horizonte, Lagoa Santa, Monte Belo, Sarzedo, Sete Lagoas e Ribeirão das Neves. Entre as vítimas está uma criança, de 8 anos.


CICLO E COMBATE

Por trás desses números, segundo especialistas em infectologia ouvidos pelo Estado de Minas, há dois fatores combinados: a própria natureza cíclica da doença, que aparece em picos a cada três ou cinco anos, e também uma falha das ações de combate ao vírus. “A dengue vai e volta, sempre. A esperança de melhora no quadro da doença vai ser vacinal, porque, durante estes anos, a gente falhou como sociedade em combater o vetor da dengue. A prova disso é 2024”, aponta o médico infectologista Leandro Curi. A entrega de doses da vacina em Minas Gerais, no entanto, segue indefinida. Com ou sem vacina, a imunização não deve afetar o atual cenário epidemiológico do estado.

 

Até lá, a solução é tentar “encurralar” o mosquito Aedes aegypti: matar as larvas, exterminar o inseto adulto e usar repelente para evitar picadas. Essas medidas, no entanto, são paliativas e demandam um conjunto de ações também em períodos de estiagem, avaliam infectologistas. “A gente não tem que esperar a estação chuvosa, falhamos muito nesse ponto. Quando começa a chover já é tarde, o mosquito já eclodiu. A gente já está no momento epidêmico. Temos que fazer isso antes da época de seca. É nesse momento que nós temos que limpar os depósitos de ovos de mosquitos, que podem ficar lá viáveis durante um ano até a próxima estação”, alerta Curi.

 

De acordo com o último Levantamento Rápido de Índices para Aedes aegypti (LIRAa), de outubro de 2023, 86,9% dos focos estão nas residências. Os criadouros predominantes em cada área são: 33,1% em pratinhos de plantas, 21% em inservíveis (embalagens de algum produto) e 8,9% em recipientes domésticos. A combinação entre altas temperaturas e chuvas isoladas aumenta os pontos de água parada e cria ambiente ideal para a proliferação do pernilongo.

 

NOVOS PONTOS DE ATENDIMENTO


Em números absolutos, a escalada da dengue no estado é puxada por Belo Horizonte. Em janeiro, as confirmações na capital mineira chegaram a 1,4 mil, com outras 7,6 mil notificações ainda aguardando o resultado de exames. A Regional do Barreiro é a que mais registra casos em Belo Horizonte, com 322 contaminações pela doença e outras 1.436 em investigação. A prefeitura confirmou duas mortes em decorrência da virose. Conforme o Painel de Monitoramento de Casos de Dengue da Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG), o acumulado até ontem na capital era de 10.651 casos prováveis de dengue, sendo 1.771 confirmados e uma morte confirmada. No fim de semana, unidades abertas pela PBH atenderam 1.206 pessoas com sintomas de arboviroses.


Ontem, a prefeitura abriu mais duas unidades de reposição volêmica (URVs ), no Centro de Atendimento às Arboviroses (CAA), no Bairro Santa Efigênia, Região Centro-Sul, e no Bairro São Tomaz, em Venda Nova.


Esses equipamentos são dedicados à hidratação venosa dos pacientes encaminhados pelos centros de saúde e UPAs, por exemplo. O objetivo de manter o funcionamento desses locais na mesma estrutura dos CAAs é garantir assistência ágil, segura e de qualidade à população. Os dois CAAS funcionam agora das 7h às 22h, enquanto as unidades de hidratação ficarão abertas 24 horas.


Prioridade para o sus na vacina

A farmacêutica Takeda, que produz a vacina contra a dengue (Qdenga), emitiu um comunicado ontem para informar a decisão de priorizar o atendimento aos pedidos do Ministério da Saúde no fornecimento dos imunizantes. De acordo com o comunicado, a Takeda suspendeu a assinatura de contratos diretos com estados e municípios e vai limitar o fornecimento da vacina na rede privada apenas para suprir o quantitativo necessário para as pessoas que tomaram a primeira dose do imunizante completem o esquema vacinal com a segunda dose, após um intervalo de três meses. A medida foi tomada “em linha com o princípio da equidade na saúde”, diante do cenário de inclusão da Qdenga no Sistema Único de Saúde (SUS) e o agravamento da epidemia de dengue.