Uma associação ilegal, que fatura cerca de 500 milhões por ano, causando prejuízo aos segurados, foi alvo, na manhã desta terça-feira (27/2), da Polícia Federal, que deflagrou a terceira fase da Operação Seguro Fake.

O objetivo da operação é desarticular empresas que exploram ilegalmente o mercado de seguros sob a indevida denominação de associações de proteção veicular. O modelo associativo não permite a venda de seguros, segundo a lei brasileira.

No total, foram cumpridos cinco mandados de busca e apreensão, sendo três na região da Pampulha, zona norte de Belo Horizonte, e também num condomínio de luxo de Lagoa Santa (MG) e outro na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro (RJ).

Todos os mandados, expedidos pela 3ª Vara Federal Criminal da Justiça Federal, em Belo Horizonte, são contra a mesma empresa, que seria bastante conhecida no mercado ilegal de seguros.

No cumprimento de um dos mandados, na sede da empresa, no Bairro São Luiz, em BH, os policiais apreenderam computadores, planilhas e outros documentos.

A associação alvo da operação é uma das maiores do Brasil, vendendo ilegalmente seguros em todos os estados. Estima-se que essa Associação, comandada por um casal de Belo Horizonte, tenha mais de cem mil clientes e cerca de quinhentos funcionários.

Segundo as investigações, vários clientes, chamados indevidamente de “associados”, não receberam indenizações em ocorrências de sinistros com seus veículos.

No relatório da Polícia Federal, diversas queixas contra a associação estão registradas no Procon e em sites de reclamações de consumidores. As principais queixas são o não pagamento de indenização por perda total; a péssima qualidade das oficinas credenciadas; a não permissão de uso do serviço de reboque; a não cobertura em veículos de terceiros.

Lavagem de dinheiro

Os donos dessa associação de seguro ilegal, segundo a Polícia Federal, montaram um esquema de lavagem de dinheiro com o objetivo de direcionar parte dos valores do rateio pago pelos “associados” para si próprios.

As investigações mostraram que este tipo de crime tem sido copiado e replicado por todas essas associações que comercializam seguro falso, fazendo com que parte do dinheiro pago pelos clientes vá para os bolsos dos donos da associação.

Os primeiros levantamentos apontam que o faturamento é de mais de R$ 500 milhões por ano.

Pela lei, as associações seguradoras não podem distribuir lucro a seus diretores. Os donos dessa associação de proteção veicular constituíram várias outras empresas satélites que gravitam no entorno dela.

Dessa forma, o dinheiro era repassado para essas empresas como forma de pagamento de serviços tais como assistência 24hs, reboque, rastreadores, oficinas, entre outros.

A forma de dissimular distribuição de lucros é, na visão da Polícia Federal, um indício de lavagem de dinheiro.

Os donos dessa empresa tinham uma vida de luxo, com imóveis e carros de alto valor e registros de diversas viagens internacionais. Eles ostentam alto padrão de vida, inclusive em redes sociais.

Atualmente, o casal que fundou e preside a associação vive na Flórida. A Polícia Federal já está em contato com autoridades norte-americanas para identificar o paradeiro do casal.

Os diretores e seus “laranjas” nas empresas satélites foram indiciados pelos crimes de lavagem de dinheiro, falsidade ideológica, crime contra as relações de consumo e por operar instituição financeira sem autorização estatal. As penas cumuladas podem ultrapassar vinte anos de prisão.

No cumprimento dos mandados foram apreendidos carros, motos, documentos e aparelhos celulares. Quando o inquérito policial for finalizado, seguirá para o Ministério Público Federal, que poderá oferecer denúncia junto à Justiça Federal em Belo Horizonte.

Ilegalidade

Tais empresas, associações, não têm autorização do Estado para comercializarem seguro automotivo. A comercialização de seguro no Brasil deve ser autorizada pela Superintendência de Seguros Privados – SUSEP. que tem entrado com dezenas de ações civis públicas buscando barrar essa prática ilegal, frequente em Minas Gerais.

O esquema de lavagem de capitais desarticulado hoje é muito comum neste tipo de associação. Segundo a legislação civil brasileira, as associações não podem repartir lucros. Por isso, os donos criam empresas com a finalidade de prestação de serviços para a associação, um meio de burlar a lei, fazendo a repartição dos lucros por mecanismos ilegais. 

Essas associações,  independentemente do objeto de sua atuação, são isentas do recolhimento de Imposto de Renda e da CSLL (Contribuição sobre o Lucro Líquido), desde que cumpram as regras legais. Porém essa dispensa de pagamento de tributos conferida às associações pelo poder público é para aquelas que operam sem fins lucrativos, tais como associações de bairro, de categorias profissionais, clubes recreativos, entre outras.

Segundo a PF, os esquemas fraudulentos iludem os cidadãos com promessas de cobertura inexistentes, inclusive por meio de veiculação de publicidade, estratégia de marketing agressiva e time de vendas por todo o Brasil.

O Procon da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) tem feito diversos alertas nesse sentido. O grande perigo é que ao assinar um contrato de responsabilidade mútua o cliente torna-se um associado e passa a dividir o risco com os demais membros da associação. É um seguro sem qualquer respaldo jurídico, de empresas que não são fiscalizadas pela Susep e não têm reserva técnica.

Não se sabe como está a higidez financeira destas associações, nem se há dinheiro para pagar a cobertura prometida, não há qualquer fiscalização estatal. É muito comum que a associação simplesmente desapareça na hora que o cidadão necessite usar a cobertura.

Em maio de 2023, o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou inconstitucionais leis estaduais que permitiam as Associações de Proteção Veicular (APV).

No voto do Ministro Gilmar Mendes foi destacado que já há uma jurisprudência pacífica sobre a atuação irregular das associações, tendo em vista as inúmeras ações propostas pelas Promotorias nos estados e pelo MP Federal para impedir o desenvolvimento ilegal da atividade seguradora por tais entidades. A competência para legislar sobre seguro é exclusiva da União.

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