Secretário de Estado de Saúde de Minas Gerais, Fábio Baccheretti, em entrevista ao EM Minas -  (crédito: Gladyston Rodrigues/EM/D.A. Press)

Secretário de Estado de Saúde de Minas Gerais, Fábio Baccheretti, em entrevista ao EM Minas

crédito: Gladyston Rodrigues/EM/D.A. Press

“Temos que estar acostumados com essa nova rotina”, sentencia o secretário de Estado de Saúde de Minas Gerais, Fábio Baccheretti, sobre epidemias, para o “EM Minas”, programa de entrevistas da TV Alterosa. Baccheretti também falou sobre a epidemia de dengue que atinge o estado, a preocupação com outras arboviroses, como zica e chikungunya, vacinação, COVID, baixa cobertura vacinal e estratégias para conter essas doenças. Confira a seguir os principais trechos da entrevista. O conteúdo também está disponível no canal do Portal Uai no YouTube.

 

As epidemias vieram para ficar ou nós estamos passando por um longo e tenebroso período que vai passar?

 

É importante separar. A dengue, historicamente, de quatro décadas para cá, vem a cada três anos. Depois da pandemia de COVID-19 ela cortou essa frequência. Tivemos em 2010, 2013, 2016 e 2019. Em 2022, não tivemos. Em 2023, muito pela chikungunya, que adiou então para este ano essa maior epidemia, que é uma tendência das arboviroses no mundo inteiro. A América Central teve as piores epidemias da sua história, Estados Unidos e Europa crescendo casos sem ser epidemia. Mas essa epidemia no mundo globalizado, certamente novos vírus virão, bactérias também. Então temos que estar acostumados com essa nova rotina.

 

 

Por que isso aconteceu?

 

Em relação à dengue não se sabe se tem a ver também com a mudança climática. O ciclo do mosquito Aedes aegypti tem muito a ver com chuva e calor. Ano passado, tivemos as maiores temperaturas históricas. Em Minas Gerais, Araçuaí é a cidade com maior temperatura da história. Mas o que nós temos também, de fato novo, é a pandemia que quebrou esse ciclo a cada três anos. E, certamente, o que tem este ano, em especial, é o sorotipo 2 que voltou a circular. Não circulava há muito tempo, ou seja, pegou uma população aqui em Minas Gerais quase toda suscetível à doença. E a chikungunya que tem dois anos que entrou no nosso estado com muita força. Isso fez com que este ano seja relativamente o maior da nossa história. Mas a gente, pelo menos, comemora um ponto: temos a menor letalidade da doença, mortes por doenças. Isso significa que a ação de capacitação surtiu efeito positivo.

 

Como isso afetou a organização do sistema de saúde? Como foi a reorganização e como a secretaria se preparou para isso?

 

A COVID, pensando na nossa geração, é sem precedentes. O que nós vivenciamos com a COVID, uma única doença matando tantas pessoas, o que converte muita internação. A dengue é diferente, nós sabemos como a dengue se comporta e ela tem um papel grande na organização do primeiro atendimento. Vemos pronto atendimentos lotados, muitos cheios, mas a taxa de internação é menor. Não precisou, igual na COVID, abrir muitos leitos de CTI. Nós tivemos que garantir um ponto importante que é o papel do gestor. No 5° dia esse paciente faz um retorno com o hemograma. Porque sabemos que no 5° dia, quando o paciente está melhor, a febre foi embora, é quando tem essa conversão para dengue grave. Na dengue grave é o seguinte: é a inflamação da dengue, ela faz com que os vasos percam líquido, como se fossem poros, e vai pra dentro do corpo. A pessoa não vê que está perdendo líquido, mas o vaso fica com menos líquido e dá o choque hemorrágico da dengue. Antigamente era utilizado esse nome.

 

Não usamos mais essa terminologia porque não há um extravasamento de sangue, mas há um choque hipovolêmico, porque o líquido sai para o lado de fora dos vasos e quando chega nesse ponto muitas vezes é irreversível. Por isso, o 5º dia, quando a gente consegue reconhecer isso com mais clareza, o retorno é fundamental. É a maior armadilha da dengue, porque o paciente busca o atendimento com febre alta e dor no corpo. Quando ele melhora, fica em casa e até passa a não hidratar tão bem. Quando eu falo de hidratar, falo de quatro a seis litros por dia. Em termos gerais, aqueles pronto atendimentos ficarem cheios nos preocupam, mas menos do que garantir esse retorno no 5° dia.

 

Zica e chikungunya preocupam tanto quanto dengue e COVID?

 

Certamente. Chikungunya, por estar circulando muito hoje em Minas. E tem uma letalidade muito próxima à dengue, isso nos preocupa da mesma maneira. Zica está circulando menos, mas nossa principal preocupação são as gestantes, que é um grupo de risco. Nós temos que sempre garantir a elas os cuidados pessoais importantes, principalmente o uso de repelente. Temos que ser mais proativos no pré-natal, pelo risco de doenças vinculadas a zica ser maior, como a hidrocefalia. Então, a zica nos preocupa em um grupo específico.

 

Essa semana, o secretário municipal de saúde de Belo Horizonte disse, que de certa maneira, a população não deve se preocupar tanto com dengue na próxima epidemia porque a vacina estará disseminada e não haverá tantos casos. O senhor concorda com essa posição?

 

A vacina ainda está incipiente. Vamos falar que, em Minas Gerais, iremos vacinar poucas pessoas, 100.000 pessoas talvez, até o final do ano. Ou seja, muito pouco perto dos 21 milhões de pessoas. Mas um fato importante para o ano que vem não ser um ano difícil, porque este ano tá sendo difícil não é à toa. Além das mudanças do El Niño, nós temos uma população que não tinha pegado esse sorotipo 2, que vai continuar circulando ano que vem. Mas, boa parte da população já teve a doença este ano, então o risco de transmitirmos essa doença, o mosquito pegar alguém doente e passar para outro, diminui. E a chikungunya da mesma maneira. Dois anos consecutivos epidêmicos com o mesmo sorotipo, não acredito que aconteça. Como ano passado o que mais circulou foi o sorotipo 1 e este ano é o sorotipo 2, nós pegamos uma população inteira podendo ter essa doença. Ano que vem, por termos tido um ano muito difícil, certamente, não teremos esse mesmo nível.

 

Mesmo depois de termos passado pela terrível pandemia da COVID e ainda termos muitos casos, temos visto postos de saúde lotados, hospitais particulares cheios, pessoas horas esperando por atendimento. Não ficou uma lição da pandemia? Por que isso está se repetindo agora?

 

A gente percebe que, na busca da vacina, quando a população está com mais medo, ela faz tudo aquilo para se proteger, vai atrás da vacina. Quando estava em um momento pior, todo mundo lutando pela vacina. Hoje, as vacinas sobram no posto de saúde porque a população nem fala muito mais de COVID. Apesar de COVID ter matado este ano quase o dobro da dengue. Esse ano, em Minas Gerais, tivemos pouco mais de 200 óbitos de COVID e pouco mais de 100 óbitos de dengue, ou seja, COVID ainda mata muito mais. Fala-se da vacina de dengue, mas a vacina de COVID está parada no posto de saúde e a população tem um comportamento muito vinculado a medo, receio. E a dengue, por estar todo mundo acostumado, o pessoal pega dengue e não evolui mal, acabam esquecendo dos cuidados dentro de casa. O cuidado principal está dentro da casa de cada um de nós. Em BH, 87% dos focos são dentro de casa.



O mosquito Aedes aegypti tem um papel de adaptação muito grande. Por isso, nossa aposta é em outras formas, não só de sensibilização. Uso de drone. Ele fotografa e reconhece. Em tal endereço, na rua tal existe água parada no alto do telhado, onde o agente de endemia não chega. Ele pode soltar e acertar um copo com uma pastilha de larvicida, ou seja, fazer o papel do agente de endemias. E o segundo é a biofábrica de mosquito Wolbachia, que está para ficar pronta em maio. Esse mosquito tem uma bactéria que não permite a proliferação da dengue, e os mosquitos de outras gerações já vem com a bactéria que é intracelular. Ou seja, teremos um ecossistema de mosquitos que não transmitem a doença. Nós estamos fazendo várias ações diferentes para vencer isso.

 

Voltando a essa questão dos postos de saúde e hospitais particulares lotados, muita gente esperando horas por atendimento. Por que isso ainda acontece, sendo que nós tivemos o exemplo da COVID que foi terrível?

 

Em relação a dengue, este ano, estamos falando do maior da nossa história, acumulado em um curto espaço de tempo. É uma demanda difícil de um sistema de saúde normal absorver. Houve uma expansão, em alguns em locais, mas essa fila vai acontecer, em UPAs e postos de saúde.

 

Nos incomoda muito essa cena, mas nossa preocupação principal é garantir, dentro desse bolo de pacientes, que os graves serão reconhecidos e tratados de maneira diferente. Isso certamente. Mas temos que nos planejar para sazonalidades. Não é à toa que alguns hospitais do estado já tem uma equipe pronta de pediatras, como João Paulo II, esperando esse aumento, que vai chegar. Temos que dar uma resposta, cada vez mais precoce, para quando esses pacientes estiverem ali, a gente já conseguir tratá-los da melhor maneira. Mas esse ano foi muito atípico em relação à dengue.

 

Essa semana também um infectologista muito importante aqui de Belo Horizonte, Carlos Starling, deu uma entrevista muito boa para o Estado de Minas, em que ele comentou duas coisas: disse que há uma subnotificação grande de casos e as mulheres grávidas, com sintomas de uma das três arboviroses (dengue, zika e chikungunya) deveriam estar sendo testadas para zika, pelo risco de transmissão vertical do vírus. Esse protocolo está sendo seguido?

 

Sem dúvida, na gestante é um fator de risco. Temos aqui em Belo Horizonte a maternidade Júlia Kubitschek, como uma maternidade de referência para grávidas com sintomas de arboviroses. Precisamos sim diferenciar, num painel viral, se é zika, chikungunya ou dengue, porque o acompanhamento da zica é diferenciado pela microcefalia. Sabemos que esse vírus passa para a criança e não permite o desenvolvimento do sistema nervoso central, especialmente no início do desenvolvimento do primeiro trimestre. Eu concordo com o Carlos Starling, nós temos que ser mais rigorosos e com protocolos bem estabelecidos. Estamos tentando treinar todos os municípios mineiros, são 853, para que siga dessa maneira.

 

Foi preciso convocar mais pessoas para poder atuar?

 

Teve o decreto de emergência, não foi à toa. Em 27 de janeiro, a Fhemig contratou pessoal para o Júlia Kubitschek, Eduardo de Menezes, em especial, e para o próprio João Paulo II, para poder ser a referência. E também permitir aos municípios a contratação. O decreto de emergência foi precoce, fizemos antes dos outros estados. Não adianta fazer na hora que o 'bicho está pegando', não dá tempo de fazer a contratação. Deu certo e a Fhemig conseguiu contratar a tempo.

 

Essa semana, o Ministério da Saúde admitiu que há o risco de 600 mil doses da vacina de dengue serem perdidas por prazo de validade. Por que já não se expande a faixa de idade para outros segmentos da sociedade serem vacinados?

 

Esse foi o posicionamento que nós, do Conselho Nacional de Secretários de Saúde, colocamos. É complexa a logística proposta de trazer as vacinas que estão paradas em municípios e transferir para outro. Por isso, nós colocamos que a ampliação da idade é o que consideramos a melhor estratégia. Minas Gerais, já passou 60% de todas as vacinas que nós recebemos e, somente esse primeiro lote, tem vencimento curto porque foi de doação. Nosso vencimento não é de 30 de abril, é de junho, ou seja, temos um prazo maior. O que foi estabelecido é exatamente isso, os municípios que não estão vacinando de 10 a 14 anos irão trazer para o estado que vai mandar para novos municípios para essa idade, de 10 a 14 anos. Já está estabelecido, essa semana foi colocado quais são os municípios mineiros que poderão pegar as vacinas paradas e a gente poder vacinar mais pessoas, porque não podemos deixar a vacina parada e muito menos vacina vencer, diante de tantas pessoas precisando dela.

 

A que o senhor atribui o baixo índice de vacinação?

 

Sem dúvidas, o primeiro sempre fake news, a desinformação. É impressionante como insistem em dizer que são vacinas experimentais. Pelo contrário, uma vacina super segura, conhecemos casos que tomaram a primeira dose e tiveram doença mais leve, com uma dose. Ela é eficaz, especialmente com o sorotipo 2, que está circulando aqui em Minas Gerais. E já é utilizada em outros países, não é o primeiro país que utiliza a vacina de dengue e já tem estudos claros da eficácia dela.

 

O segundo ponto: essa vacina não pode ser dada nos seis meses iniciais de alguém que teve a doença. Temos muita gente que pegou dengue. Então, elas têm que esperar seis meses para poder tomar a vacina. Talvez esse somatório de desinformação e também de pessoas que contraíram a dengue, neste ano epidêmico, pode ter deixado vacinas paradas. Mas, é por isso. Nossa ação junto ao ministério é ampliar a idade e os municípios, para não correr o risco de perdermos as doses.

 

As pessoas se esqueceram da COVID?



Por mais que estejamos tendo muita dengue, proporcionalmente os números de óbitos são pequenos. A COVID mata mais e, o principal, temos a melhor prevenção no posto de saúde. O grupo de influenza, que está sendo vacinado, a partir dessa semana, é o mesmo grupo para COVID. Estamos vendo gestantes que não estão se vacinando para COVID. Estão pensando na zica, mas a COVID, a chance de matar uma gestante não vacinada é muito maior. Crianças que nunca tiveram a doença ou não estão vacinadas, são pessoas suscetíveis completamente a esse vírus que ataca o pulmão e pode matar. É uma cepa menos letal, mas para quem nunca teve COVID, igual uma criança que acabou de fazer seis meses de idade, que poderia tomar essa vacina, olha o risco que ela está se colocando. Idosos com comorbidades, muitos tomaram duas, três doses e não tomaram a bivalente para essa variante da ômicron. Temos que insistir com a vacinação, as doses estão paradas nos postos de saúde e a população só se lembra da COVID quando o 'bicho tá pegando'. Temos que estar protegidos.

 

O senhor, em todas as entrevistas, fala da importância da vacinação. Mas, nosso governador, Romeu Zema, deu uma entrevista dizendo que não achava que a vacina tinha que ser obrigatória. Estava falando para os alunos, mas, de uma forma geral, considerando isso. Como vocês se ajeitam nessa história?

 

É muito importante esse esclarecimento. O governador estava muito focado na liberdade do aluno em garantir o direito fundamental à escola. O que ele colocou não teve nenhuma mudança de regramento, nem em Minas e nem no país. Não é obrigatório estar com cartão de vacina em dia para poder estudar. Não podemos punir uma criança duas vezes, em que o pai não levou para vacinar e que ela não possa estudar. Isso seria uma punição dupla. Eu vejo com uma punição um pai não levar seu filho para vacinar, uma punição para a vida dele. Nós sabemos o que é uma pessoa com poliomielite, com uma doença infecto-contagiosa. Em Minas, no ato da matrícula, eles entregam o cartão de vacina, não estando com o cartão de vacina em dia a escola faz a sensibilização dos pais. Muitos pais nem sabem que o cartão de vacina não estava atualizado. Outro ponto, nós fizemos a resolução em 2023. Estamos premiando os municípios em até R$ 150 milhões, se eles estreitarem a distância da meta de onde estão hoje.

 

Tem um município, Araguari, que pegou este valor e criou o 14º dos professores. A meta seria vacinar 95% e qual é o resultado? 98,9% das crianças foram vacinadas. Temos ações efetivas para buscar a criança e vacinar. O governador quis focar no direito à educação, mas certamente, no dia a dia, ele nos exige ações para chegar nos 95%.

 

Secretário recentemente estava conversando com uma pessoa que me contou que a esposa tinha sofrido um AVC e atribuiu o AVC a vacina de COVID. Essa coisa em torno da vacina, toda essa propaganda contra a vacinação. Vamos conseguir reverter isso?

 

As redes sociais e a internet têm um grande benefício para nós no dia a dia, mas existem também efeitos colaterais. Anti vacina é um movimento que existe no mundo inteiro há muito tempo, mas hoje ele é mais robusto pela facilidade de enxergar no telefone das pessoas. Eu seria capaz aqui, se quisesse provar para você, que essa água você beber três vezes pode curar um câncer, criando um estudo um estudo randomizado no mundo. O médico tem esse papel de criar muitas vezes, ou qualquer profissional, fatos que não são fatos, são fake. É muito complexo. Tem pessoas, com a certeza, de que tomaram a vacina
e tiveram AVC. Nossa vacina chegou em janeiro de 2021. O pior momento da pandemia foi em fevereiro, março e abril. Muita gente tomou a vacina sem saber e já estava com a doença, estava no período de incubação. E a doença causa muito AVC, infarto e trombose. E qual é o fato dele: tomei a vacina e tive sintomas e AVC. Isso não é estudo que consideramos de fato. Isso aí é um achismo e esse achismo, numa rede social robusta, vira a verdade. É por isso que os estudos randomizados, que são feitos no mundo inteiro, em grandes centros respeitados, tem que ser o que vai nos guiar. E todos eles comprovam: a vacina é segura. Mas é uma luta enorme fazermos com que nossos colegas, que sejam médicos, pelo menos, falam de estudos de verdade e não de achismo, como estamos vendo por aí.

 

O senhor acha que o governo Lula falhou, como o governo Bolsonaro, na aquisição de vacinas? A vacina da dengue demorou?

 

A vacina da dengue, participei como presidente do Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde), da discussão. Primeiro era uma produção muito pequena, que estava sendo ofertada ao governo brasileiro. A capacidade na época era de 7 milhões de doses, ou seja, 3 milhões e meio de pessoas. Pensando num país de mais de 220 milhões de pessoas isso não é nada, pouco mais de 1% de toda a população, a um valor muito caro, sabendo que o Butantan está para ter a própria vacina, de dose única, muito mais barata. É uma negociação de compra e pareceu, em algum momento, que foi atrasada. A doação veio após o contrato de compra, além da compra, eles deram uma doação aumentando a capacidade, mas a doação só veio porque foi firmado um processo de compra.

 

É complexo porque essa vacina não está sendo feita para este ano epidêmico e quando estamos tendo um ano muito grave de casos, parece que essa vacina poderia ter mudado (o cenário). Não poderia ter mudado porque nós estamos falando em um ano inteiro vacinarmos 4 milhões de pessoas no país inteiro. Pensando em médio e longo prazo, nós temos que ver o valor da vacina, a produção da vacina e foi o que foi considerado. Poderia ser mais rápido? Poderia ser mais rápido, mas não é dessa maneira como se acha.

 

Não seria adequado pegar essas vacinas que estão ameaçadas de serem desperdiçadas, por prazo de validade, e já abrir para a vacinação de outras faixas de idade?

 

É isso que nós colocamos no Conass e a Ethel (Maciel), secretária de vigilância, se comprometeu levar para Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS), que é a comissão que avalia a aplicação de medicamentos e de vacinas, para já deixar isso estabelecido.

 

O primeiro ponto que o ministério quer é redistribuir a vacina parada para outros municípios não contemplados. Mas eu falei já deixe pronto o plano B que é: não conseguiu redistribuir, a vacina está parada, amplie, para não termos perda de vacina. E ela aceitou essa sugestão. Isso vai acontecer em breve porque o prazo é 30 de abril, da maior parte da vacina. Depois, ampliar a faixa etária, foi o que eu coloquei para Ethel.

 

E a vacina de COVID?

 

Não faltam vacinas de COVID e devem vir novas vacinas atualizadas daqui a pouco, isso faz parte do contrato com a Pfizer, da bivalente, mas temos vacinas paradas nos postos.
Pergunta: Teremos que conviver com vacinações anuais, como existe com a gripe?

 

Do mesmo grupo de influenza já se sabe que sim. A dengue não se sabe ainda, ao certo se vai precisar de um reforço, em quanto tempo. No primeiro momento, é vacinar com as duas doses dessa vacina e depois com a do Butantã, com uma dose, a maior parte da população, especialmente à população de maior risco.

 

Secretário, como se não bastassem as epidemias, agora está chegando o inverno. E aí vem as doenças respiratórias, especialmente nas crianças. Como estamos nos preparando para isso?

 

Estamos adiantados no preparo. Estou até levando essa nossa experiência, pelo segundo ano consecutivo, para o Ministério da Saúde, porque doenças sazonais não dá para esperar acontecer, ela vai acontecer. O outono começou dia 21 de março, vem as doenças respiratórias e na criança, em especial, até 2 anos tem uma doença chamada bronquiolite.


Bronquiolite porque pega os pequenos brônquios, por onde passa o ar que as crianças respiram. Ela inflama por um vírus chamado vírus sincicial respiratório (RSV). Por enquanto, não tem vacina disponível para ele, mas é uma questão de tempo para ter. E essas crianças têm uma taxa de internação alta, proporcionalmente. Por isso que no João Paulo II, em Belo Horizonte, já ampliamos dez leitos de CTI nesta semana, mesmo sem ter o paciente para internar. Mas já sabendo que é questão de tempo. Além disso, o reforço do pronto atendimento de pediatria, o João Paulo II, já tem seis a sete pediatras atendendo diariamente. Nós estamos agora com recursos de cerca de 30 milhões, que seriam para arboviroses, estamos ampliando para doença respiratória. Então esse recurso é para que os municípios se preparem e já estamos ampliando a capacitação. E já esperando um recurso emergencial vinculado ao ministério que também já está acordado.

 

Que recomendações o senhor dá aos pais e mães sobre os cuidados que devem ser tomados agora?

 

Primeiro ponto, cartão de vacinação em dia. Temos doenças respiratórias que podem ser prevenidas com a vacinação, como a influenza e a COVID. O outro ponto é que crianças muito pequenas, até dois anos, não vamos levá-las para grandes locais aglomerados, fechados porque o vírus sincicial respiratório, muitas crianças nunca pegaram uma doença e, se elas pegarem esse vírus são vulneráveis. É o momento de preservarmos as crianças que ainda não se expuseram a estes vírus, especialmente com menos de dois anos.

O senhor conviveu com a gestão do general Pazuello no Ministério da Saúde e agora está convivendo com a ministra Nísia Trindade. Que comparações o senhor faz entre as duas gestões?

Eu convivi mais até com Queiroga. Um ponto que vejo de muita mudança importante é que eu, até como presidente do Conselho Nacional dos secretários de saúde, é que nós temos a Comissão Interjeições Tripartite. A governança do SUS é muito boa, a gente pactua políticas e somos protagonistas da pactuação. Quando tem recurso federal é uma política, não sai da cabeça apenas do ministério. Tem os estados e municípios discutindo e pactuando aquele recurso federal. E isso ficou mais forte agora. Acho que é um benefício que estamos vendo e estamos sendo melhor escutados agora com o ministério. Mas temos que entender que o nosso papel em estados e do Conass é um papel federativo de muito respeito. Temos que ser respeitados porque quanto mais para baixo, estados e municípios você está, mais sente a saúde acontecendo. Não adianta o ministério achar que vai resolver os problemas de estados e municípios pensando lá em Brasília. E não adianta eu achar, como secretário, que vou resolver os municípios, pensando aqui do meu gabinete. É muito importante darmos mais autonomia e ouvir mais quem está mais perto do paciente. Vejo uma mudança importante em relação a isso, mas temos momentos positivos e negativos de todas as gestões, mas este ponto me chama a atenção.

Secretário, se hoje caísse do céu uma enorme verba para o senhor investir na área de saúde. Que áreas atacaria?

Sem dúvida, estamos na hora de fazer uma grande virada para a promoção e prevenção à saúde. A nossa visão da secretaria de saúde é tornar real o SUS ideal, temos que parar de tratar a doença, temos que falar em mudança de hábito de vida, falar mais ainda de prevenção e não só de vacina.

Se continuarmos neste modelo de sempre corremos atrás do prejuízo, vamos ter cada vez mais pessoas na fila de hemodiálise, mais pessoas precisando por um stent no coração, ao invés de termos pessoas com pressão alta controlada, diabetes controlada. Se tivesse um recurso, eu ia falar: vamos fortalecer a promoção, a prevenção da saúde lá na atenção primária, no posto de saúde para a gente mudar de vez para onde estamos indo.