Com Laura Scardua*
Dois diretores do Presídio Inspetor José Martinho Drumond, em Ribeirão das Neves, na Grande BH foram exonerados. A informação foi confirmada pela Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp). O desligamento acontece depois da morte de sete detentos do presídio no início do mês. A principal suspeita é de que as mortes sejam por overdose de substância entorpecente denominada de 'droga K'. A Sejusp está investigando o motivo dos óbitos dos detentos na unidade prisional, no entanto, nega que a exoneração tenha relação com o caso.
“A troca dos gestores já estava prevista pelo Departamento Penitenciário de Minas Gerais (Depen-MG), como parte das inúmeras atividades de gestão administrativa prisional. A saída dos gestores não está relacionada a qualquer fato ocorrido no presídio, como o óbito de detentos”, afirmam.
Já na penitenciária Antônio Dutra Ladeira, também em Ribeirão das Neves, seis detentos morreram entre dezembro de 2023 e março de 2024, também supostamente pela mesma causa, 'a droga K'. Para o advogado criminalista Greg Andrade, a saída dos diretores não resolve em nada os problemas estruturais.
“Isso é em virtude da falta de investimento que teve durante anos no sistema prisional. Um abandono. E então, acontece uma situação grave de um extermínio dentro do sistema prisional, onde sete pessoas morreram em 10 dias. E aí, simplesmente a secretaria tira da cabeça dois diretores, como se isso fosse resolver o problema, e vão colocar na conta da droga”, afirma.
Segundo o advogado criminalista Greg Andrade, que está em contato com os familiares dos presos mortos, faltou transparência da Sejusp em falar sobre o caso e apoiar as famílias dos detentos. “São mortes muito suspeitas. Tudo indica que seja por overdose. Ainda não saiu o laudo da necropsia, mas a família especula que seja por overdose porque a secretaria não fala nada. Tem notícias de familiares que ficaram sabendo que o ente querido morreu apenas na hora da visita. Ninguém entrou em contato para falar que o detento morreu”.
Saiba mais sobre a droga
Pablo Marinho, professor de toxicologia no Centro Universitário Una, na capital mineira, explica que os termos K2, K4, K9 se referem ao grupo das moléculas sintéticas e, atualmente, são registradas mais de 130 moléculas diferentes que compõem a classe dos canabinoides sintéticos. Entre os efeitos das drogas K, os canabinoides sintéticos apontados pelo professor, estão: agitação, ansiedade, alucinações, convulsões, comportamento autodestrutivo, vômitos, paranoias, problemas respiratórios e cardiovasculares e, em casos extremos, a morte.
Fatores que podem elevar os riscos de overdose são a falta de controle de qualidade da substância, uma vez que é ilícita, e o desconhecimento dos usuários dos efeitos toxicológicos, concentração e composição química dessas drogas, que podem estar também contaminadas com outras substâncias. As drogas K são consumidas principalmente pelas vias respiratórias, segundo Pablo Marinho. É comum que os usuários impregnem essas moléculas sintéticas em um determinado suporte [como papel], alguma erva para fumar, e, em alguns casos, até mesmo em cigarros eletrônicos.
Canabinoide não é cannabis
Popularmente, as drogas K também são conhecidas como “maconha sintética”, mas o professor de toxicologia chama atenção para esse termo que pode estabelecer uma correlação errônea. Apesar do grupo de moléculas sintéticas agirem no organismo humano nos mesmos receptores do THC, principal ativo responsável pelos efeitos psicoativos da maconha, os canabinoides sintéticos têm uma afinidade maior com esses receptores, assim, os efeitos deles têm uma intensidade maior que os da cannabis. “Não é maconha sintética, isso acaba passando uma ideia errada de que [a droga K] pode ser de efeito mais ameno, de baixo potencial letal, mas são moléculas extremamente danosas para a saúde humana e que a gente desconhece ainda os efeitos, principalmente a longo prazo”, reforça.
Pablo Marinho acredita que o consumo das drogas K deve ser encarado como uma preocupação do ponto de vista da saúde pública, uma vez que “a gente observa que há um aumento nas apreensões no Brasil desse tipo de droga” e por terem alto potencial toxicológico.
Como o conhecimento dos efeitos a curto e a longo prazo dos canabinoides sintéticos ainda não é aprofundado, como “isso pode dificultar o tratamento em um possível processo de reabilitação ou na identificação de pessoas que foram intoxicadas por essas drogas”, conclui o professor.
* Estagiárias sob supervisão do subeditor Rafael Oliveira