A Justiça Federal negou nesta quarta-feira (8/5) o pedido da Advocacia-Geral da União (AGU) para obrigar as mineradoras Samarco, Vale e BHP a depositar em juízo, no prazo de 15 dias, R$ 79,6 bilhões como forma de reparação em decorrência do rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, na Região Central de Minas Gerais, em novembro de 2015.
A tragédia despejou uma onda de lama no distrito de Bento Rodrigues, deixando 19 mortos e centenas de desabrigados, além de atingir comunidades, mata e toda a extensão do rio Doce até o mar do Espírito Santo.
O valor pleiteado pela AGU corresponde à atualização monetária dos R$ 47,6 bilhões definidos em sentença proferida em janeiro deste ano pela 4ª Vara Federal Cível e Agrária de Belo Horizonte, após ação civil pública aberta pelo Ministério Público Federal (MPF). As mineradoras foram condenadas a realizar o pagamento a título de danos morais coletivos.
A União teve como objetivo o cumprimento imediato da sentença, mesmo havendo recursos das empresas que ainda não foram julgados. No entanto, caso o depósito não fosse feito no prazo, a AGU pediu que a Justiça determinasse o bloqueio de ativos financeiros das mineradoras. Não sendo essa medida suficiente, a Advocacia-Geral da União apontou para a possibilidade de penhora de parte das ações e de 5% do faturamento, além dos bloqueios dos bens imóveis e da distribuição de lucros.
Na sentença que a reportagem teve acesso, o juiz substituto Vinicius Cobucci argumentou que "o cumprimento provisório de sentença não trará soluções definitivas e apenas ampliará a judicialização, com a criação de incidentes desnecessários, porque a lei processual civil brasileira assim permite". "Ademais, BHP e Vale têm condições econômicas de arcar com a condenação e não é preciso qualquer medida de constrição no momento", frisou.
Ao recorrer à Justiça Federal, a AGU havia ponderado que "já é hora do Estado e da sociedade brasileira receberem uma resposta concreta". "Não podemos esperar mais uma década. É premente a execução provisória do título, pois o meio ambiente e as pessoas afetadas têm urgência na reparação e as causadoras do dano não podem permanecer em situação de conforto, atuando de forma a procrastinar os processos e a responsabilização pelos efeitos de seus atos”, completou.
O juiz, no entanto, lembrou que, em 2016, a própria União foi arquiteta de um "sistema extrajudicial de reparação do desastre por meio de obrigações de fazer", quando ocorreu a criação da Fundação Renova, mantida pela Samarco, Vale e BHP. Nesse sentido, as três mineradoras, o governo federal e os governos de Minas Gerais e do Espírito Santo firmaram à época um termo de transação e ajustamento de conduta (TTAC).
"O Ministério Público Federal se opôs ao modelo e ingressou com nova ação civil pública que resultou na condenação que se pretende executar. O atraso de nove anos, em parte, também é imputável ao poder público que tem sua responsabilidade no atual cenário. Os fundamentos da demora não podem isentar a União da sua própria participação enquanto autora e idealizadora de um modelo de reparação por meio de obrigações de fazer. Dito isso, não se pode adotar uma decisão utilitarista baseada apenas na demora, porque o cenário real é muito mais complexo", avaliou o magistrado.
Logo, Cobucci indeferiu o pedido de cumprimento provisório de sentença, tendo em vista que "a questão já foi resolvida na decisão original, a qual expressamente afirmou que sua execução seria feita após o trânsito em julgado".