A paciente teve a cavidade tratada em um hospital do SUS. Ela diz não ter recebido o devido atendimento do cirurgião
 -  (crédito: Arquivo pessoal)

A paciente teve a cavidade tratada em um hospital do SUS. Ela diz não ter recebido o devido atendimento do cirurgião

crédito: Arquivo pessoal

Três mulheres ouvidas pelo Estado de Minas denunciam atendimento e negligência do cirurgião plástico sócio da Clínica HD Bellagio, na Região da Pampulha, em BH, onde Thaynara Braz, de 28 anos, morreu nessa quarta-feira (29/5), depois de passar por duas cirurgias estéticas. O profissional responde a oito processos por suposto erro médico, de acordo com a advogada das vítimas.



Hoje aos 41 anos, Michelle Fonseca decidiu, aos 38, fazer pela primeira vez um procedimento estético. A ex-paciente diz que optou pelo cirurgião sócio da Clínica HD Bellagio ao ver a repercussão e as boas avaliações que o profissional tinha no Instagram. “Fiz os exames todos e três procedimentos combinados. Em um dia só eu fiz abdominoplastia, mastopexia com prótese e lipoaspiração. Paguei tudo adiantado”, ela conta. 


No entanto, os problemas começaram já no dia da cirurgia, alega Michelle. Ela afirma que, apesar de ter feito os exames, na hora do corte, o médico teria constatado que ela estava produzindo leite devido a hormônios e, segundo ele, não poderia colocar as próteses mamárias. “Ele falou com o meu esposo que me devolveria os R$ 2.500 da prótese, mas não aconteceu. Ele me devolveu só R$ 1.000”, alega. Mais tarde, Michelle consultou uma mastologista, que afirmou que não havia problema em colocar as próteses.

 

Cinco dias após a operação, segundo Michelle, ela retornou para consulta, quando o médico teria afirmado que estava tudo certo. No entanto, alguns dias depois, alega ela, a cicatriz da abdominoplastia abriu cerca de seis centímetros, além de vazar líquido. Segundo a denunciante, o corte ficou aberto por 40 dias. Michelle afirma ter tentado uma consulta de retorno com o médico, mas os funcionários da clínica teriam dito que ele estava ocupado. “As assistentes falaram que era normal e me mandaram de volta para casa”, diz. 


Quanto ao procedimento no seios, a ex-paciente da clínica onde morreu Thaynara afirma que o mamilo direito foi “dilacerado”, com cicatrizes "grosseiras" e que também abriram mais tarde. Ela diz que os cortes só não necrosaram porque tomou muito cuidado. “São cicatrizes horríveis. O meu próprio esposo falou comigo que a cirurgia estava toda torta”, desabafa.


“A gente fica frustrada e chateada porque você espera uma coisa e recebe outra. Dá muita raiva, você gasta dinheiro, aí depois tem o pós-operatório, que você tem que gastar também com massagista. Não é fácil ouvir do seu marido que a cirurgia está torta. Eu não uso nem biquíni, meu seio caiu de novo ", denuncia ela, que afirma que vai entrar com um processo judicial contra o profissional.

 

Michelle é uma das mulheres que denuncia médico cirurgião

Michelle Fonseca afirma que cicatriz de abdominoplastia abriu cerca de seis centímetros, além de vazar líquido

Acervo pessoal

 

 

Risco de morte

 

Uma mulher de 30 anos, que preferiu não se identificar, é outra que denuncia o médico da clínica na Região da Pampulha. A ex-paciente, que é dona de casa, conta que, em janeiro de 2023, fez abdominoplastia com lipo, mas o procedimento necrosou. Segundo o relato, as complicações da operação a levaram a ficar internada por 21 dias. Após a divulgação da morte de Thaynara, a mulher se sentiu encorajada a denunciar o médico.


A ex-paciente conta que a cirurgia, que era o sonho dela, começou a necrosar quatro dias após a operação. De acordo com a denunciante, na época, o médico responsável teria considerado a complicação como "falta de sorte" e afirmado que poderia "acontecer com qualquer um" que se submetesse ao procedimento. “Ele disse que prestaria apoio e faria o reparo”, alega a mulher, que na época tinha 28 anos. 


Alguns dias depois, segundo a dona de casa, o estado de saúde dela piorou. “Eu usava uma fralda no abdômen de tanta água que saía, mas eu voltei ao médico e ele disse que era normal”, alega. A ex-paciente diz ter conhecido o profissional por meio da prima, que havia operado com o médico, e estava em grupos de WhatsApp com outras clientes.


“Voltei de novo pra ele, eu estava podre, estava com mau cheiro. Ele falou que era normal, tirou 1 cm de pele preta. Eu voltei para casa com um buraco. Ele falou para eu encher a ‘cratera’ de gaze e pomada”, diz a mulher. A ex-paciente conta que o mau cheiro provocado pela necrose era insuportável e que, mesmo cuidando, a situação não melhorava.


Desesperada, ela decidiu ir a um hospital público de Contagem, na Grande BH. “A médica que me atendeu me internou no mesmo momento e disse que, se eu tivesse ido um dia mais tarde, teria morrido por infecção generalizada”, alega. Ela teria ficado 21 dias internada, tomando antibiótico, tendo aproximadamente 1 palmo e meio de "carne podre" retirada. 

 

“Foram 3 a 4 meses para o buraco fechar, eu fiquei andando curvada e a cicatriz horrível. Meu sonho virou pesadelo”, denuncia ela, que relata ter passado por uma cirurgia para fechar o corte pelo SUS. A ex-paciente também afirma que pensou em processar o médico na época, mas que ele teria a convencido a fazer um acordo. “Ele me ofereceu um reparo grátis, falou que eu não ia ganhar nada com o processo. Ele fez minha cabeça”, conta. 


Após a morte recente da jovem, a denunciante decidiu não fazer mais o reparo, mas lamenta não ter dinheiro para consertar a cicatriz com outro médico ou para custear um advogado. 


 


Negligência


Uma terceira mulher, que também preferiu não se identificar por estar com processo aberto contra o médico, conta uma história parecida. Ela aponta ter realizado uma cirurgia de mastopexia com prótese em maio de 2021 com o mesmo profissional, mas em outro local de atendimento. No dia, segundo ela, também deveria ter sido feita uma lipoaspiração axilar, que ela diz ter pagado, mas que não teria sido realizada. “Após sair da cirurgia, questionei sobre a lipo, e o médico, com expressão de espanto, disse que não tinha conhecimento, mas que o valor seria devolvido ou faria o procedimento”, alega.


A denunciante, que na época estava prestes a fazer 26 anos, diz que também teve problemas com a cicatrização. Ela afirma de ter relatado a situação ao médico e às assistentes, mas que não recebeu o devido atendimento – apenas uma indicação de uso de pomada. “Minhas feridas começaram a desenvolver necrose, ficando escuras cada vez mais. Entrei em contato novamente, já desesperada, e, mais uma vez, não tive a assistência necessária e, mais uma vez, a indicação de usar Rifocina pela secretária”, conta ela. 


A ex-paciente optou por esperar um ano para ver o resultado final da cirurgia. De acordo com ela, uma nova consulta foi agendada em julho de 2022, na qual o profissional teria dito que o resultado não era satisfatório e que seria possível fazer um reparo pelo valor de R$ 2.400. Com medo, ela optou por não realizar.


“Fiquei completamente triste com o resultado dos meus seios, com alturas diferentes, bicos do peito fora de ângulo, cicatriz completamente torta e fora do lugar, prótese fora do lugar e a presença de uma pedra no seio direito que o médico não soube identificar e eu pedi que me desse um pedido de ultrassom. Além dos danos físicos, ficam os danos emocionais, a vergonha dos meus seios e até mesmo a dificuldade de me relacionar com meu parceiro por vergonha. Um sonho que virou pesadelo”, denuncia.

 

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Morte de jovem


Thaynara Braz, de 28 anos, morreu depois de passar por duas cirurgias na Clínica HD Bellagio, localizada na Avenida Portugal, no Bairro Jardim Atlântico. Os procedimentos estéticos – para substituição de prótese nas mamas e uma abdominoplastia – haviam sido feitos na terça-feira (28/5). 


À polícia, o proprietário do estabelecimento disse que a cirurgia tinha sido “um sucesso”, mas, na madrugada de quinta, a moça foi atendida às pressas no local após sofrer uma parada cardiorrespiratória. Ela foi reanimada por uma equipe do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), mas morreu depois de uma segunda parada cardíaca.


O que diz a clínica

Em nota, a Clínica HD Bellagio lamentou a morte da paciente e informou que os procedimentos pré e pós-operatórios foram conduzidos conforme os protocolos médicos. "Tanto o médico responsável pela cirurgia quanto o hospital permanecerão cooperando plenamente com as autoridades competentes para esclarecer todas as circunstâncias", diz o texto, que ressalta que o prontuário médico é sigiloso e que a perícia confirmará a causa da morte.

 

Leia a nota na íntegra:

 

"É com profunda tristeza que informamos o falecimento em 29/05/2024 da Sra. TBA, após cirurgia realizada em nosso Hospital na data 28/05/2024.

Queremos expressar nossas sinceras condolências à família e aos amigos, os quais continuarão acolhidos pela nossa equipe.

A cirurgia, pré e pós operatório foram conduzidos conforme os protocolos médicos, tendo sido o SAMU imediatamente acionado às 05:38 horas, após a paciente ter apresentado complicações. O SAMU chegou às 05:48 horas, continuando com os procedimentos com a paciente até o óbito declarado às 06:20 noras pelo médico do SAMU.

Tanto o médico responsável pela cirurgia quanto o Hospital permanecerão cooperando plenamente com o as autoridades competentes para esclarecer todas as circunstância:
Esclarecemos que estamos fornecendo todo o apoio, tanto técnico quanto emociona aos familiares e amigos.

A perícia será necessária para confirmação da causa mortis, observando que prontuário médico é documento SIGILOSO, nos termos dos arts. 2° e 3°, , da Lei Feder n° 8.069/90 e art. 89 da Resolução n° 1.638/02 do Conselho Federal de Medicina, cu conteúdo deve ser discutido privativamente entre a equipe médica, a família e autoridades competentes.

Mais uma vez, com pesar.”

 

*Estagiária sob supervisão do subeditor Fábio Corrêa