Foi publicado no Diário Oficial do Município (DOM) desta quarta-feira (22/5) a decisão pela desapropriação de dois lotes no Bairro Lagoinha, na Região Noroeste de Belo Horizonte. Eles se juntam a outros seis que já haviam sido desapropriados no início no mês para dar lugar a um empreendimento de moradias populares, integrante do plano de qualificação urbanística Centro-Lagoinha.


No local, a Prefeitura de Belo Horizonte prevê a construção de um prédio com cerca de 80 unidades habitacionais e um centro comercial no térreo, por meio de parceria público-privada. O executivo municipal projeta abrir o edital de licitação para escolher a empresa responsável pelas obras até o início do segundo semestre deste ano, com previsão de entrega até o segundo semestre de 2025.


 

A maioria dos imóveis do empreendimento (70%) será destinada, exclusivamente, à população de baixa renda, dividida em dois grupos de vulnerabilidade, conforme a Política Municipal de Habitação. “Esses imóveis (desapropriados) estão em uma área de grande importância histórica, uma referência cultural da cidade, mas ainda estão inseridos em um contexto de degradação muito grande, com usos indesejados que atrapalham o desenvolvimento da região. Nós entendemos que era necessário levar mais pessoas residindo nesse local, levar empreendimentos que viabilizem o uso residencial daquela área”, explica o subsecretário municipal de planejamento urbano, Pedro de Freitas Maciel Pinto.


Expectativas com a revitalização

Porta de entrada para muitas pessoas que chegam a Belo Horizonte, especialmente pela Avenida Antônio Carlos, a PBH tem planos para revitalizar o complexo da Lagoinha e pretende melhorar as condições urbanísticas, sociais e ambientais.

 



 

As transformações envolvem uma série de alterações, que vão desde a recuperação de três praças até uma passarela para ligar a Lagoinha ao Centro. “É um trabalho que está em curso. Este é um primeiro passo de um plano maior que vai, de fato, trazer uma grande melhoria para a região do Lagoinha. A gente precisa de habitação de qualidade, com uma ocupação diversa também do ponto de vista de renda, para que a gente traga uma dinâmica mais vibrante para aquela região”, destaca o subsecretário.


Nas ruas, o otimismo e a incerteza se entrelaçam nas palavras de moradores e comerciantes. O antiquário Mozart Ferreira, de 63 anos, vê a demolição dos imóveis desapropriados, a pouco menos de 50 metros da loja em que trabalha, na Rua Itapecerica, como um sinal promissor.

 

"Vamos esperar, a expectativa é boa. Nosso medo é só isso não passar do papel", afirma. Para ele, a desapropriação já trouxe mudanças tangíveis, como uma redução da sujeira nas calçadas ocasionada pela atividade dos ferros-velhos. “Esse da esquina era o principal, o maior de todos. Agora, está melhorando e vai melhorar”, afirma, ressaltando ainda o menor fluxo de pessoas em situação de rua no entorno.

 

A previsão de novos moradores no bairro também é vista como um estímulo ao comércio local. "Quanto mais gente tiver, melhor pro comércio. Não tem jeito de piorar mais do que já está. Tem só que melhorar", completa o comerciante João Ambrósio Siqueira, de 72, mais conhecido no bairro como João das Bananas.


 

Moradora do bairro há 50 anos, Maria Anunciação também destaca uma melhoria progressiva da região. "Construindo vai melhorar ainda mais", comenta, referindo-se ao empreendimento previsto para ocupar os terrenos desapropriados. Com otimismo cauteloso, André Luis dos Santos, de 46, morador do Lagoinha há quatro anos, reconhece os sinais de melhoria, como a abertura de novos estabelecimentos comerciais na Rua Itapecerica. "Só o tempo dirá, mas, pelo que eu estou vendo, está melhorando demais", comenta, destacando a redução no fluxo de criminosos e usuários de drogas desde então.

 

No entanto, ele também relata os desafios persistentes que afetam sua vida cotidiana, como furtos frequentes de cabos da rede elétrica e a necessidade constante de lidar com a sujeira e o mau cheiro nas ruas. Ele mantém a esperança de que, com o tempo, as condições vão melhorar gradualmente.


Para a presidente do Movimento Lagoinha Viva, Teresa Vergueiro, moradora do bairro há mais de 13 anos, ainda há muito a ser feito na região. “A Lagoinha sofre há décadas com os mesmos problemas. “Fui eu que sugeri incluir no projeto (das moradias populares) a possibilidade de uma área de lojas embaixo para que tivesse um movimento, não ficasse aquele vazio, que tivesse mais movimentação naquela região”, aponta.

 

Ela lista, ainda, outras reivindicações dos moradores, que passam por problemas como sujeira das calçadas no uso do espaço para triagem de materiais recicláveis, aumento da criminalidade pelo grande número de usuários de drogas —especialmente de crack— na região, receptação e vendas de produtos roubados, degradação do patrimônio histórico, e habitação para as pessoas em situação de rua.


Paralelo à construção das moradias populares, a prefeitura pretende tocar o projeto para transformar a Praça Coronel Guilherme Vaz de Mello, conhecida como Praça da Lagoinha, em um parque de integração, que inclui ainda a reforma das praças do Peixe e do Peixe, Vaz de Melo e parte da Praça Leste, bem como a elaboração de anteprojeto da passarela.

 

 

Quase dois anos depois de publicado o edital do projeto —revisto depois de reclamações de moradores—, a previsão é de que a licitação seja aberta até o segundo semestre deste ano. A iniciativa, além de  áreas de lazer e outros equipamentos públicos disponíveis para a população do entorno, prevê a construção de uma passarela para integrar as regiões do entorno. O projeto faz parte do plano de qualificação urbanística centro-lagoinha, desenhado, segundo o subsecretário municipal de planejamento urbano, em conjunto com a comunidade.


As intervenções, no entanto, têm visões dissonantes e esbarram na problemática da ocupação dos espaços públicos pela população em situação de rua, uma reclamação recorrente dos moradores do bairro. “Então, o Parque da Lagoinha vem criar uma situação que pode até ser um pouco interessante para os moradores em situação de rua. Porque a prefeitura não tem hoje um projeto para tirar as pessoas da rua. Então, eles vão ter um parque para morar. E nós, moradores, não vamos poder usufruir”, afirma Vergueiro.


Questionado pela reportagem, o subsecretário municipal de planejamento urbano reconhece o desafio e diz que a Lagoinha é parte de uma realidade urbana vivenciada e agravada nos últimos anos em várias cidades do país.

 

Em resposta, a Prefeitura de BH afirma ter ampliado os serviços de atendimento e proteção à população em situação de rua em todo município, com reforço na região da Lagoinha. Em 2020, em resposta aos agravos da pandemia de COVID-19, foi instalado em caráter emergencial e provisório o Centro Pop Lagoinha, equipamento incorporado, posteriormente, de forma permanente à rede de atenção à população de rua.

 

O executivo municipal também destaca as ações dos consultórios de rua e equipamentos de atenção psicossocial, como Centros de Referência em Saúde Mental (Cersam) e Centros de Referência em Saúde Mental Álcool e outras Drogas (Cersam-AD), para cuidado da integral da saúde das pessoas em situação de rua no município.

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