e Vinicius Lemos

Especial para o EM

 

Minas Gerais registrou uma média diária de 1,44 crime de LGBTQIA+fobia entre janeiro e abril deste ano, número maior que o verificado no mesmo período de 2023. O dado, segundo especialistas, reflete a violência contra essa parcela da população, mas também uma disposição maior das vítimas para denunciar. Foi o que fez uma mulher homossexual ameaçada e chamada de “sapatona nojenta” pelo padastro, gerando investigação concluída na terça-feira (21/5), pela Polícia Civil, que culminou no indiciamento do agressor por injúria por homofobia, em Patos de Minas, no Alto Paranaíba.

 

A denúncia foi feita em dezembro de 2023, ano em que foram registrados 562 casos de LGBTQIA+fobia em Minas Gerais – numa média diária de 1,5 crime. Esse foi o maior número computado no estado desde 2016, quando a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) divulgou dados sobre esse crime pela primeira vez. O caso foi remetido ao Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e, se for denunciado, julgado e condenado pela injúria, o homem pode pegar até três anos de prisão, além de multa.

 

A ocorrência reflete a escalada dos crimes de LGBTQIA+fobia registrados no estado nos últimos anos. Entre janeiro e abril de 2024, foram 173 – cinco a mais que as 168 denúncias levadas à polícia no mesmo período de 2023. Belo Horizonte destoa do cenário estadual, apesar de ser o município com maior número de registros: foram 41 no primeiro quadrimestre de 2024 contra 52 em igual período de 2023 – uma redução de 21%. Tanto os dados de Minas quanto os da capital são do Painel LGBTQIA+fobia, uma ferramenta dinâmica que permite acesso a estatísticas de crimes contra essa parcela da população, fornecida pela Sejusp em junho de 2023 e atualizada mensalmente. Os registros mostram que houve ocorrências, principalmente, de injúria, ameaça e lesão corporal.


PERIGOS

Ainda que mostre que mais pessoas estão denunciando crimes de LGBTQIA+fobia, o aumento de registros preocupa especialistas. Para a antropóloga Érica Renata de Souza, professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), esse crescimento está também associado a um retrocesso e a uma falha na democracia. “Sempre temos subnotificação. O preconceito e a violência contra pessoas LGBTQIA+ muitas vezes fazem com que essas pessoas não acessem os canais e serviços de proteção, seja políticas públicas ou iniciativas de ONGs, por exemplo”, explica Érica.



Presidente do Centro de Luta pela Livre Orientação Sexual de Minas Gerais (Cellos-MG), Maicon Chaves afirma que a falta de políticas públicas que contemplem além da saúde da população LGBTQIA+ é um dos fatores que levam ao aumento da violência.

 

“Não aconteceu só em Minas Gerais, mas no Brasil inteiro, e isso é alarmante porque percebemos que existe um clima de violência no país, e não só numa cidade ou um estado. Uma das principais causas disso é a ausência de políticas públicas estruturais para a população LGBTQIA+ que dialoguem com a vida das pessoas e prezem por uma cidadania plena, como cultura, esporte, lazer e, principalmente, educação”, afirma. “Se não temos uma população que esteja sendo educada para a cidadania, para a diversidade e para o acolhimento, temos uma população mais violenta. E hoje em dia vemos que a violência contra essa população está sendo banalizada e espalhada”, complementa.

 

 

Já para Érica, uma parcela dessa violência é reflexo de discursos políticos que “legitimaram a discriminação como direito de expressão” nos últimos anos. E o perigo se mantém, diz. “Ainda que estejamos num outro momento político, o preconceito contra pessoas LGBTQIA+ ainda mata, diariamente, de forma direta ou indireta, seja pela exclusão social que leva uma pessoa LGBTQIA+ ao suicídio, seja por assassinatos com requintes de crueldade que caracterizam crimes de ódio”, afirma. 

 

O QUE DIZ A LEI

Apesar de ainda não haver uma lei específica para o crime de LGBTQIA+fobia, a homofobia foi criminalizada em 2019, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu incluir atos preconceituosos contra homossexuais e transgênero ao crime de racismo, baseando-se no artigo 20 da Lei 7.716, de 5 de janeiro de 1989. No ano passado, a homotransfobia foi enquadrada como injúria racial. Também é possível enquadrar ações LGBTQIA+fóbicas aos crimes de injúria, difamação, lesão corporal, entre outros, dependendo das circunstâncias do caso. A pena para quem “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito” em razão da orientação sexual é de um a três anos de prisão e multa. Com agravantes, como praticar o crime por intermédio de meios de comunicação, a pena pode chegar a até cinco anos de reclusão.

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