Os suspeitos de matarem duas crianças e um adulto em uma festa infantil em Ribeirão das Neves, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, na última quinta-feira (23/5), gravaram um vídeo apontando onde aconteceria o ataque. Conforme a Polícia Militar, o crime foi motivado por desavenças do tráfico de drogas. O alvo seria o pai do aniversariante, Felipe Moreira de Oliveira, de 26 anos - uma das vítimas. 


 

Nas imagens, gravadas dentro de um carro, quatro homens passam pela rua onde acontecia a comemoração e debatem se ali seria o local onde o alvo estaria. Ao se aproximar do sítio, o motorista do veículo aponta para a decoração do local: “Cheio de serpentina lá”. Em seguida, o carona, que está fazendo as imagens, afirma que aquele era o lugar da festa. “Fechou, cheio de menino”. 


A chacina aconteceu no fim da festa de aniversário de Heitor Felipe Moreira de Oliveira, de 9 anos, e sua irmã, em um sítio. Izaltina Luciana Moreira, mãe e avó de duas vítimas, conta que dois homens aproveitaram que o portão do sítio estava aberto e entraram no local, já disparando as armas, “sem olhar em quem estava atirando”. De acordo com o boletim de ocorrência, o alvo do ataque, pai dos aniversariantes, tinha envolvimento com o tráfico de drogas na região do Bairro Morro Alto, em Vespasiano, também na Grande BH. 




 

Felipe foi atingido, ao menos, doze vezes por disparos e morreu no local. Ainda conforme o registro, ele estava em guerra com traficantes do Bairro Bela Vista, em Santa Luzia, uma vez que queriam que a vítima passasse a comercializar os entorpecentes fornecidos por eles. Ele e a família já estavam recebendo ameaças de morte há alguns meses. 


Além do homem e Heitor, Laysa Emanuele, de 11 anos, prima da criança também morreu. Outras três pessoas foram baleadas e encaminhadas a uma unidade de saúde, entre elas uma adolescente, de 13 anos, atingida na canela, uma jovem, de 19,  ferida na nádega e uma mulher, de 41, baleada nas costas e na cintura. 


Leia: Chacina na Grande BH: suspeitos de matar crianças eram próximos da família

 

Durante o crime, Izaldina e a vítima de 41 anos entraram em luta corporal com um dos atiradores, posteriormente identificado como um homem de 23 anos,  para tentar impedir que mais vítimas fossem feitas. A mulher narrou para a Polícia Militar que durante o embate o segundo homem passou a disparar contra elas.


Nesta segunda-feira (27/4), amigos e familiares de Jéssica Paola Bolina, a vítima mais velha, começaram uma campanha de doação de sangue. De acordo com o anúncio, é necessário os sorotipos sanguíneos O+ e O-. A doação pode ser feita no Posto de Coleta, Estação BH, localizado no Shopping Estação, em Venda Nova, e no Hemocentro, no Santa Efigênia, na Região Leste de Belo Horizonte. 


Prisão 

Horas depois do ataque, o homem de 23 anos, reconhecido pelas testemunhas, deu entrada em uma Unidade de Pronto Atendimento, em Contagem, com ferimentos de disparos de arma de fogo no joelho, tórax e quadril. A polícia acredita que o suspeito foi atingido pelo próprio comparsa durante a luta corporal com as mulheres que tentaram impedir o ataque.


O suspeito foi transferido para o Hospital Municipal de Contagem, onde segue internado sob escolta policial. O segundo homem, de 26 anos, apontado como autor dos disparos, até o fechamento desta edição, ainda não havia sido localizado. 


Por meio de nota, nesta segunda-feira, a Polícia Civil informou que o suspeito detido foi autuado em flagrante por triplo homicídio qualificado, e recolhido no sistema prisional onde encontra-se à disposição da justiça. Além disso, a corporação pediu a decretação da prisão temporária do homem, pelo prazo de 30 dias, podendo ser prorrogada. “A investigação encontra-se em andamento a fim de identificar e localizar demais suspeitos”. 


Sonhos interrompidos

Em suas redes sociais, Heitor Felipe compartilhava sua trajetória no esporte e afirmava que não iria desistir do sonho de ser atleta. Ao Estado de Minas, Tamyres Moreira, tia do menino, contou que, como a maioria da família, ele era Cruzeirense mas vestia a camisa alvinegra para jogar “com amor e orgulho”. “Nós sempre brincávamos com ele com essa diferença dos times, de torcer para o rival do que estava jogando, mas ele sempre respondia que era ‘trabalho”. 


Além de apaixonado por futebol, Heitor também amava a família. A tia lembra com carinho que se fosse por ele, levantava às 5 horas da manhã para ir treinar e quando pedia a benção dos familiares sempre dava um beijo na mão da pessoa. 


“Ele não tinha preguiça, o negócio dele era a bola desde que se entendia por gente. Ele nunca brincou de outra coisa. Não é porque é meu sobrinho, mas ele é uma criança iluminada. Um menino educado”, recorda. 


Assim como o primo mais novo, Laysa Emanuele também tinha um sonho de carreira e queria ser advogada. Segundo a tia, Luna Milla, a menina era estudiosa e “nunca dava trabalho”. O irmão de Laysa também estava na festa, no momento do atentado ele teria corrido para um banheiro para se proteger. “Ela era uma menina boa, alegre e extrovertida. Perdeu a vida muito cedo, ninguém esperava uma tragédia dessa acontecer”.


Procura por justiça

Felipe e a família já estavam recebendo ameaças de morte há alguns meses. Conforme familiares, além do ataque na festa dos filhos em, ao menos, outras duas ocasiões tentaram atingir o homem. Em uma das vezes, a casa de uma tia da vítima foi alvo de disparos de arma de fogo, na ocasião um primo foi atingido. Na segunda tentativa, suspeitos teriam planejado uma emboscada, mas a ação foi interceptada pela Polícia Militar. 


“Ele já estava sofrendo ameaças, no entanto que a festa não teve pessoas de fora, foram só parentes e alguns amigos do Heitor. Justamente para evitar qualquer represália. Estamos sofrendo pelo meu irmão, mas estamos sofrendo mais ainda pelo meu sobrinho. Ele só tinha 9 anos. Uma pessoa que fez isso é um monstro, não tem justificativa”, lamenta Tamyres Moreira. 


A morte das crianças e o ataque à uma festa infantil comoveu não só a comunidade em que viviam mas também outras regiões. A perda dos sonhos e futuro das vítimas aumenta a revolta das famílias e o sentimento pela procura de justiça. Em um vídeo que circula nas redes sociais, a mãe de Heitor Felipe aparece desolada ao lado do corpo do filho. Com alguém no celular, a mulher, de 27 anos, fala: “Acabaram com a minha vida. Mataram o meu filho, minha sobrinha”. 


“Meu irmão era uma pessoa que sempre se preocupou e cuidou da família, porque ele era o mais velho de quatro filhos. Os problemas todos ele pegava para resolver. Ontem eu fiquei o dia inteiro com ele, curtindo a festa. Independente de qualquer coisa errada, ele era meu irmão, ela era pai, um filho”, conta a irmã de Felipe. 


O crime também instigou um possível conflito entre facções criminosas.  De acordo com uma testemunha que mora no Bairro Morro Alto, que preferiu não se identificar, os conflitos na região ocorrem há meses. À reportagem, ela narrou o clima de tensão e falou sobre o policiamento constante da área. "Tá rolando uma guerra há meses. Eles estavam dando tiro ao menos três vezes por dia. Agora com essa morte, as facções querem fazer vingança pelo filho dele que morreu. Aqui está um clima tenso. A noite não tem ninguém na rua e a polícia passa toda hora", conta.


À reportagem, Tamyres Moreira, tia do Heitor, disse que a família não tem relação com os boatos de vingança. "Sobre essa questão de vingança, a família não tem nada a ver. São boatos de internet, nós não sabemos. O que nós queremos é justiça, a gente busca por justiça. Isso é um crime que revoltou tanto a população, a família está destruída, quanto os policiais. Eu perdi meu irmão, meu sobrinho, perdemos outra criança. Perdeu pai, perdeu filho. Foi uma destruição para gente, independente de qualquer coisa”.

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